Em mais de duas horas e meia de audição do ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva, sobre a associação Raríssimas, todos saíram como entraram: para PSD e CDS, o ministro explicou-se mal e permitiu que as coisas chegassem onde chegaram; o governante defendeu-se a vários tempos, mas o essencial deixou logo dito na sua primeira intervenção. "Não retirei qualquer benefício pessoal, direto ou indireto, e material" da participação na Raríssimas..Vieira da Silva quis sublinhar ainda que "não houve qualquer favorecimento a esta associação", apontando que "a Raríssimas não foi alvo de nenhum favorecimento especial, particular, discriminatório". E deixou outra certeza: "Não considero que tenha havido qualquer negligência da minha parte ou de qualquer membro do meu gabinete." O CDS levantou suspeições diretas sobre o comportamento do ministro em todo o processo e sobre "aparentes privilégios" dados por Vieira da Silva à associação de que fez parte no passado (foi seu vice-presidente da assembleia geral, antes de ir para o governo). Do outro lado, a equipa ministerial (e estava toda presente) respondeu com rispidez e teve no PS o seu escudo e a sua arma de ricochete. À esquerda, BE e PCP preferiram debater o estado da relação entre a Segurança Social e as instituições particulares de solidariedade social..O ministro Vieira da Silva insistiu que não foi recebida qualquer "denúncia de gestão danosa" da Raríssimas "na linha dos alegados factos noticiados" pela reportagem da TVI. Segundo explicou, o email enviado por Jorge Nunes, ex-tesoureiro da Raríssimas, apontava para "irregularidades nas contas". E a presidente da associação, Paula Brito Costa, pediu uma audiência para dar conta de suspeitas de desvio de donativos. A isto, o ministro sugeriu à dirigente da Raríssimas que remetesse a informação para o Ministério Público, que "está ainda em pleno desenvolvimento"..Na sequência da reportagem da TVI, o gabinete de Vieira da Silva foi confrontado com uma comunicação que teria sido enviada pela presidente da FEDRA - Federação de Associações de Doenças Raras", em janeiro, que se demitia por alegadas irregularidades na Raríssimas. Também aqui o ministro foi assertivo: "Essa comunicação não deu entrada em nenhum gabinete deste ministério nem no Instituto de Segurança Social." Deu entrada antes no Instituto Nacional para a Reabilitação, apurou o ministério, e perdeu-se na burocracia..Na parte final da audição, Vieira da Silva tinha dado a palavra à sua secretária de Estado da Segurança Social, Cláudia Joaquim, para que esta explicasse os números dos apoios dados à Raríssimas (com uma nota: foi o governo anterior que despachou - "e bem" - apoios a 100% às camas de cuidados continuados disponíveis na Casa dos Marcos) e para que respondesse também às dúvidas levantadas pelo CDS sobre as denúncias feitas pelo antigo tesoureiro da associação. Ofício a ofício, argumentou a governante, foi dada sequência a cada uma das denúncias. Cláudia Joaquim leu as diferentes cartas com denúncias que foram feitas e justificou o que foi feito com cada uma delas. De fora da cronologia ficou a denúncia de janeiro da FEDRA..Para o PSD, o ministro continuou sem assumir responsabilidades; e para o CDS, as suspeitas não foram esclarecidas. "De quantas denúncias precisa para que faça alguma coisa?", atacou António Carlos Monteiro..Para a fotografia, o deputado centrista mostrou uma imagem (sem qualquer contexto) em que se via o ministro a escrever algo, na presença de Paula Brito Costa e de Anders Olauson, ela presidente da Raríssimas, ele presidente da fundação sueca Agrenska. Os centristas carregaram nas palavras: "Relacionamento privilegiado", "pressão dos serviços" e "aparentes privilégios". E António Carlos Monteiro insistiu que o ministro também assinou o protocolo das duas entidades. Vieira da Silva negou. No final, a assessoria do ministério entregou uma cópia do protocolo onde não está qualquer assinatura do ministro. O que escrevia então Vieira da Silva naquela foto, quiseram saber os jornalistas. O ministro não se lembra. "Tenho centenas de reuniões, tenho a memória perfeita de que não me competia subscrever aquele protocolo.".Questionado também pelos jornalistas sobre se sente que mantém condições para continuar no Governo, respondeu: "Obviamente que sinto." Lá dentro já tinha deixado uma confissão. "Tenho a perfeita consciência de que o facto de ter, como muitos outros, apoiado como cidadão, depois de ter exercido funções governativas, aquela instituição, me coloca numa posição de particular sensibilidade. Tenho toda a consciência disso, não tenho nenhuma dúvida."