Mestre da guerra. Inspiradas em Sun Tzu, Forças Armadas criam fatos e máscaras de proteção

Uma equipa de médicos, enfermeiros e farmacêuticos do EMGFA estão na vanguarda da criação de novos materiais com a indústria de defesa. A reserva estratégica dos militares dá para 90 dias
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O Hospital das Forças Armadas (HFAR) está a servir de palco de inovação para testes e criação de novos materiais para proteção contra a covid-19. Já foi criado um fato completo para ambientes contaminados e máscaras recicláveis. As Forças Armadas (FAA) prepararam-se com antecedência para a pandemia e têm uma "reserva estratégica" de equipamentos de proteção suficiente para 90 dias.

A inspiração foi lançada pelo próprio Chefe de Estado-Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA) e foi beber os ensinamentos do mestre da guerra Sun Tzu: "Se conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas. Se você se conhece mas não conhece o inimigo, para cada vitória ganha sofrerá também uma derrota. Se não conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas...". O "inimigo", claro está, é a covid-19.

É o próprio CEMFA, almirante Silva Ribeiro, a revelar que esse foi o princípio que transmitiu ao grupo de jovens médicos, enfermeiros e farmacêuticos, que constituem a designada "equipa do conhecimento" criada no Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA) logo no início da pandemia provocada pelo novo coronavírus.

"Recordei àqueles jovens o saber de Sun Tzu, segundo o qual quando os miliares estão empenhados numa guerra têm de conhecer bem o seu inimigo - neste caso o novo coronavírus. Se conhecerem as suas capacidades e as do inimigo, podem ganhar batalhas", explicou ao DN, no dia em que foi ouvido na comissão parlamentar de Defesa e fez referência ao trabalho desta equipa especial.

Na vanguarda do conhecimento científico

"O trabalho desta equipa é ler e procurar tudo o que se vai sabendo e fazendo lá fora sobre a covid-19, os avanços científicos, as formas de proteção e propor soluções para Portugal", acrescenta o CEMGFA.

Este grupo do "conhecimento" é constituído por oito médicos, enfermeiros e um farmacêutico e está a trabalhar em permanência no EMGFA. Pesquisam, recolhem e analisam as ideias que estão na vanguarda científica das investigações noutros países em matéria de combate ao novo coronavírus e propõe o seu desenvolvimento e criação no nosso país.

O acompanhamento é feito através de plataformas online, revistas científicas e através da troca de informações com as Forças Armadas congéneres, centralizada através dos adidos militares nos vários países, como destaque para a Itália e Espanha.

"Estes países estão em modo de combate e este acompanhamento permite-nos ter um panorama global sobre o que se está a fazer e tomar decisões com base científica para o futuro", sublinha o vice-almirante Gouveia e Melo, adjunto para o Planeamento e Coordenação do EMGFA, que supervisiona a "equipa do conhecimento".

Revela que a execução das ideias é desenvolvida através "de uma parceria com as empresas da indústria de Defesa".

Inovação afirma-se

Esta colaboração que se consolidou entre as FAA, a Plataforma das Indústrias de Defesa (IdD) e o Centro Tecnológico Têxtil e Vestuário (CITEVE), está a desenvolver neste momento vários projetos: um fato integral, com sobre botas incluídas, impermeável e reutilizável para utilização em ambientes contaminados; máscaras não-hospitalares e não-filtrantes, que funcionam como barreira física, laváveis e reutilizáveis para emprego fora de ambientes contaminados; identificação de tecidos ou não tecidos com capacidade filtrante que possam ser utilizados para a produção de máscaras tipo FFP2, em conjunto também com alguns empresários e investigadores. Está também em fase de conclusão uma máscara facial ventilada e o desenvolvimento de ventiladores com várias empresas nacionais.

Gouveia e Melo assinala que "os fatos reutilizáveis foram testados no HFAR, resistiram a 40 lavagens e já estão a ser vendidos para fora, incluindo para o estrangeiro". O EMGFA comprou 400 para as equipas hospitalares e de desinfeção e o Exército, Marinha e Força Aérea também adquiriram algumas unidades.

As máscaras, sublinha este responsável, "foram desenhadas pelos militares e conseguiu-se uma barreira de ar em ambos os sentidos, através de um orifício protegido". Estas máscaras já estão a ser utilizadas pelos militares, como é o caso deste vice-almirante.

Ainda há poucos dias, recorda, foram certificadas pelo Infarmed umas "máscaras de pressão positiva", também desenvolvidas a partir do HFAR. "Foi uma ideia da nossa equipa, propusemos a uma empresa que está habituada a trabalhar connosco e em duas semanas estavam feitas", assinala. "Estas máscaras vão ser utilizadas só em ambiente hospitalar e descontaminação de áreas de elevado risco", acrescenta.

Reserva estratégica assegurada

Na audição no parlamento, o CEMGFA salientou que as Forças Armadas se prepararam com antecedência para a pandemia. "A nossa reserva estratégica estava no Laboratório Militar. Logo no início fizemos as encomendas e tratámos de assegurar que estava garantido todo o material necessário. Neste momento não temos qualquer limitação de equipamentos de proteção, nem de medicamentos. O Hospital das Forças Armadas tem uma reserva até ao final do ano, mesmo em esforço máximo", sublinhou Silva Ribeiro.

Gouveia e Melo acrescenta que, globalmente, as Forças Armadas "têm uma reserva de material de proteção - máscaras, luvas, fatos, sobre botas e até medicamentos - para 90 dias", que vai sendo mantida pela Direção de Logística e Recursos.

No HFAR, foi também criado um projeto designado "Hospital Seguro", que visa "visa avaliar e cimentar normas e procedimentos que permitam garantir que os profissionais de saúde possam desempenhar as suas ações minimizando o risco de contaminação".

Explica o EMGFA que "estes procedimentos incluem o estabelecimento de circuitos separados para pessoal, equipamento e material dedicado à área covid-19 Positivo, com o objetivo de fazer a contenção nesta área". No interior desta área covid-19 Positivo "são estabelecidos todos os procedimentos para que os profissionais de saúde trabalhem sob risco mínimo de contaminação". A eficácia destes procedimentos será monitorizada ao longo do surto de covid-19, com vista à validação de todo o processo.

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