Menos alunos por turma? "Medida mais fácil, mas pode não ser a melhor solução"
Nove meses depois de ter chumbado uma proposta para a diminuição do número de alunos por turma, o Parlamento retoma esta quarta-feira o mesmo tema, pela mão do BE, PCP e PEV. Em cima da mesa estão três propostas bastante semelhantes: a traços largos, bloquistas e comunistas propõem um máximo de 19 crianças por turma no pré-escolar, aumentando até aos 22 no 3.º ciclo e no secundário. Já o PEV defende que não deve haver mais que 20 alunos por turma, qualquer que seja o grau de ensino.
Uma medida que os três partidos defendem há muito, mas que dizem ser agora mais urgente, face à pandemia de covid-19. Uma alteração que de "necessária, passou a urgente", escreve o BE na proposta, defendendo que esta é uma mudança essencial para que os alunos tenham condições para recuperar de "dois anos letivos atípicos". "O caminho que foi iniciado na anterior legislatura de redução do número de alunos por turma foi claramente insuficiente e demorado por parte do Governo PS, havendo demasiadas respostas por dar", defende o PCP. Também o PEV evoca não só as condições de aprendizagem dos alunos, mas também a necessária garantia de "condições para promover a saúde pública".
As propostas surgem na sequência de uma petição subscrita por 35 843 pessoas, na qual se alega que "não faz sentido pedir-se à população que esta pratique o distanciamento social quando o nosso sistema educativo não se prepara para evitar que quase 30 alunos, multiplicados pelas turmas e escolas de norte a sul do país, permaneçam diariamente dentro da mesma sala de aula". Na sequência desta petição, o Parlamento consultou várias entidades. Para a Fenprof esta é uma medida que se impõe "também por razões de interesse pedagógico, num contexto em que a recuperação dos défices de aprendizagem acumulados durante os meses em que as escolas estiveram encerradas deve ser prioritária". Já a Confap (confederação das associações de pais) manifesta reservas, alegando que criaria "maiores dificuldades às famílias pela falta de vagas nas escolas de proximidade".
Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos de Escolas Públicas (ANDAEP) diz que esta será a medida "mais fácil", mas não necessariamente a melhor solução, dado que se trata de um "fato igual para necessidades diferentes". "Há turmas com muitos alunos que podem funcionar muito bem, cada caso é um caso", diz o também diretor do agrupamento de escolas Dr. Vítor Matos, em Vila Nova de Gaia, defendendo uma "maior autonomia das escolas na constituição e na formação das suas turmas". Ou seja, que o ministério atribua um número máximo de turmas por ano de escolaridade e deixe a decisão do número de alunos às escolas: "Não é o ministério da Educação que conhece cada escola, são as equipas diretivas".
Filinto Lima aponta outras soluções - "alocar mais recursos humanos às escolas, leia-se mais professores - para apoios mais personalizados, para coadjuvações em contexto de sala de aula". Medidas que ganham maior urgência face às conclusões do diagnóstico feito pelo Instituto de Avaliação Educativa (IAVE), reveladas segunda-feira, que apontam para um impacto significativo da pandemia na aprendizagem dos alunos. "A minha grande preocupação é ao nível do primeiro ciclo, dos primeiros anos de escolaridade, que estavam a aprender a ler, a escrever. Na minha opinião são estes meninos que irão pagar a maior fatura da pandemia", diz Filinto Lima. Um quadro face ao qual o Ministério da Educação "vai ter que aumentar o crédito horário das escolas, que é atribuído no início do ano, para que possam contratar mais professores".
O presidente do Conselho de Escolas é mais crítico da medida que vai ser debatida e votada hoje no Parlamento. José Eduardo Lemos admite que turmas com menos alunos "significam um trabalho de maior proximidade", mas diz também que os números avançados pelos três partidos "são irrealistas" - "teríamos que construir mais escolas". "Há dois entraves importantes a essa medida: um é o espaço físico, o outro é o aspeto financeiro", argumenta. José Eduardo Lemos defende também, que, a partir de uma determinada fasquia, que já está assegurada nos atuais números, "não há uma relação causal direta entre número de alunos e resultados escolares".