Em palco, sem rede ainda que a protagonista prefira "o ensaio que vai permitir a improvisação à aventura e ao acaso", não faltará o retrato da Viagem que Marta Pereira da Costa iniciou há anos e que esta noite ganha um novo passo fundamental, "o maior desde o lançamento do disco". Não é difícil prever um serão em Movimento, perpétuo, em função da coragem de uma instrumentista e compositora se mostrar em pleno - Minha Alma, afirmará, com a ajuda das cordas da guitarra, a entrega à música, tal como Terra dará conta do contexto geográfico e cultural da artista. Que, à semelhança do que aconteceu no disco que a apresentou mais formal e sistematicamente a quem a ouve, não precisará de se esforçar para ultrapassar as fronteiras do fado, nem vai necessitar de colheradas de purismo para nele - no fado - aparecer mergulhada..[youtube:W3Vj07YO_w4].Marta Pereira da Costa diz ao DN sentir-se "ansiosa", sem que este seja um sintoma de insegurança. Bem pelo contrário, depois de "muito trabalho, muitos ensaios, meses de ensaios", a ânsia vem precisamente da vontade de que chegue a hora de subir ao palco de "uma sala emblemática", rodeada de músicos e convidados para a ocasião, podendo "partilhar com os parceiros e com o público" aquilo que foi preparando à sua maneira, ou seja, metodicamente, mas sem jamais esquecer a importância do improviso. Incoerência? Contradição? Nada disso: é sobre o que está bem estudado e modelado que nascem os grandes repentismos, de alguma maneira "amparados" para nunca soarem como manifestações de exibicionismo, antes como prolongamentos da sedução que a música de Marta já carrega naturalmente, de raiz. Sempre com a certeza de que não é momento de poupanças, nem pensar: "Por um lado, quem conhecer o disco, vai perceber que nos esforçámos para não ir para este espetáculo reproduzir, simplesmente, os temas. Há mudanças, há evolução, há novidades..." E pelo outro? "Pelo outro, quis aproveitar este momento para estrear temas." Por outras palavras, para nos começar a fornecer os sinais de trânsito que vão balizar e orientar a próxima fase artística e profissional de Marta. "Talvez seja um fim de ciclo, sim... Mas sinto que é a ocasião certa para refletir, fazer o balanço do que se passou até agora e, com base nisso, planear, desenhar aquilo que será o meu caminho daqui em diante...".Engenho e arte.De repente, parecia estar de volta a sra. engenheira, com desenhos e planeamentos. Mas a arte - com que Marta conviveu desde criança e que a levariam ao (a)braço da guitarra portuguesa, em que assume inicialmente destaque pelo género e, desde há algum tempo, pela qualidade e pela intensidade "unissexo" - também vive deste tipo de "engenho", como sabe quem a escolheu como modo de vida e, com essa opção, se viu forçada a enfrentar dificuldades, preconceitos (desfeitos com trabalho e com talento) e longas temporadas de aprendizagem. Não custa perceber, contas feitas, que Marta Pereira da Costa esteja a atravessar o momento mais feliz do romance que vive com a música..[youtube:BzbJYrZgliA].O concerto desta noite assume um papel central na contribuição para esse "estado de graça". Basta pensarmos nos músicos que acompanham a primeira figura: António Pinto na guitarra clássica, Nelson Cascais no baixo e no contrabaixo, Alexandre Dinis nos teclados, André Sousa Machado na percussão, José Quaresma na voz e na viola de fado. Como se não bastasse, há os convidados, como os instrumentistas João Frade, acordeão, e Pedro Jóia, guitarra, ambos já presentes no disco de Marta. Há mais repetentes, como Dulce Pontes, que junta o piano à voz, e Rui Veloso, que soma a guitarra ao canto. Hélder Moutinho, voz, é uma novidade absoluta. Depois, há uma convidada que merece a saliência, por vir de longes terras e de "percurso próximo": Tara Tiba, cantora. Marta explica: "É muito importante a presença dela, que decidiu vir da Austrália de propósito. Quis estar presente e dar uma ajuda importante, sabendo que não sairá daqui materialmente recompensada, uma vez que este concerto já tem despesas elevadíssimas... Mas, para mim, é fundamental que tenha decidido vir, até porque há alguns pontos de coincidência nos nossos percursos, no que toca a dificuldades e a sofrimentos... Só posso ficar agradecida e corresponder - quando ela lançar o seu segundo disco, lá irei eu até à Austrália...".Tudo a postos para uma noite irrepetível. Para os ausentes, dois premiozinhos de consolação: o concerto será filmado e será gravado (pela Antena 1). Ainda assim, nada como tentar um lugar entre as testemunhas "oculares". Marta Pereira da Costa.31 de maio, 21.30.Teatro Tivoli BBVA, Lisboa.Bilhetes de euro 10 a euro 20