Marcelo quer Soares e Sá Carneiro no Panteão. E defende mexida na lei

Presidente diz que Soares e Sá Carneiro merecem essas honras. Há dois anos promulgou alargamento de prazo e ressuscitou agora objeções de então
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Dois anos depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter promulgado o novo regime que define que os cidadãos só podem merecer honras de Panteão Nacional 20 anos depois da sua morte, o Presidente da República veio defender esta quarta-feira que "o Parlamento tem de definir regras que não tenha de mudar todos os anos" para viabilizar as propostas de trasladar os restos mortais de Mário Soares e Francisco Sá Carneiro para a Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa.

No caso de Mário Soares, o regime em vigor desde 2016 não permite essa trasladação imediata: o antigo presidente da República morreu em 7 de janeiro de 2017, a lei estabelece o tal intervalo de 20 anos, pelo que, sem alterações à lei, Soares só poderá ser trasladado do Cemitério dos Prazeres para o Panteão em 2037.

Já no caso do antigo primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro, morto em 4 de dezembro de 1980, essa trasladação pode ser feita sem qualquer entrave temporal.

Comentando as notícias recentes que dão conta da iniciativa conjunta do PSD e do PS para dar essas honras a Soares e a proposta do PSD de Lisboa para se fazer o mesmo em relação a Sá Carneiro, Marcelo foi assertivo a defender a justeza das propostas. "Parecia-me justíssimo e parece-me justíssimo, num caso como noutro caso. São pais da democracia portuguesa. Isso parece incontestável." E depois devolveu a bola aos deputados. "Parece-me que o Parlamento tem de definir regras que não tenha de mudar todos os anos", afirmou Marcelo, citado pela agência Lusa, prometendo aceitar "o que for votado pela Assembleia da República".

Ora, o Parlamento alterou a lei por unanimidade há pouco mais de dois anos, em 6 de maio de 2016, depois das polémicas suscitadas pelas trasladações rápidas de Amália Rodrigues e Eusébio. A fadista foi sepultada no Panteão três anos depois da sua morte, o futebolista um ano depois.

De acordo com uma alteração introduzida na lei, a deposição no Panteão Nacional dos restos mortais dos cidadãos distinguidos só pode ocorrer 20 anos após a sua morte, enquanto a afixação de lápide alusiva à sua vida e à sua obra pode realizar-se cinco anos após a morte. O texto de 2000 definia que "as honras do Panteão não poderão ser concedidas antes do decurso do prazo de um ano sobre a morte dos cidadãos distinguidos", o que permitiu as trasladações de Amália em 2004 (morreu em 2001) e de Eusébio em 2015 (um ano depois de ter morrido).

O Presidente da República promulgou o diploma, em 25 de maio desse ano, "atendendo ao voto unânime da Assembleia da República". No entanto, deixou dois breves reparos a essa lei. O primeiro, relacionado com os locais passíveis de honras de Panteão. A Lei n.º 14/2016 aprovada define que é "reconhecido o estatuto de panteão nacional, sem prejuízo da prática do culto religioso", ao Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, ao Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha, e à Igreja de Santa Cruz, em Coimbra, que já tinha o estatuto de panteão nacional desde 2003. Marcelo notou que se podia ter alargado iguais honras ao Mosteiro de Alcobaça ou a S. Vicente de Fora, em Lisboa, "por paralelismo nomeadamente com Santa Maria da Vitória".

O outro reparo na sua nota de promulgação é à "modificação significativa do prazo para concessão de tal honra", sem adiantar mais.

No início deste mês, questionado no Porto sobre a proposta de levar Soares para o Panteão, o Chefe de Estado deu o seu acordo, explicando o seu reparo antigo. "Eu concordo plenamente. E isso dá razão a uma observação que fiz há uns tempos, de que se devia pensar a lei para não ter de ser mudada com esta periodicidade. Devia ser repensada para ter a latitude suficiente para poder abarcar situações como esta, justíssima, do Presidente Mário Soares."

É então latitude que falta à atual lei, com os tais prazos rígidos sem estabelecer eventuais exceções. A alteração de 2016 fixou os prazos de 20 anos e de 5 anos para "homenagear" e "perpetuar a memória dos cidadãos portugueses que se distinguiram por serviços prestados ao país, no exercício de altos cargos públicos, altos serviços militares, na expansão da cultura portuguesa, na criação literária, científica e artística ou na defesa dos valores da civilização, em prol da dignificação da pessoa humana e da causa da liberdade".

Para Marcelo, a Assembleia da República "tem de definir regras" que sejam estáveis, "para evitar melindres - que neste caso não surgem, mas que podem surgir noutros casos". E insistiu que o Parlamento tem duas opções: "Se sente que há homenagens que devem ser feitas, naturalmente que o quadro legislativo deve ser suficientemente flexível para permitir essas homenagens. Se sente, pelo contrário, que, uma vez feita a homenagem num determinado momento, há que deixar correr um período de tempo, e depois é discutível qual, legisla nesse sentido."

"Cabe à Assembleia da República - e o Presidente da República aceita o que for votado pela Assembleia da República, obviamente, definir critérios", apontou.

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