Mais rápidos do que a própria sombra

Nem a crise trava a indústria dos carros de alta velocidade. Lamborghini e Ferrari acabam de levar para a estrada os seus novos super-modelos. O Gallardo Superleggera e o 250 GTO levam 3.4 segundos dos 0 aos 100 e vão além dos 300 km/h. E mesmo assim
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A velocidade é um pecado. Um vício. Uma tentação humana. Há uns tantos engenheiros que pensam o mesmo e para quem o zero é o número mínimo de segundos um automóvel pode levar até chegar aos 100 km/h.  Felizmente, para nós pecadores, eles passam o tempo ao despique a ver qual é o primeiro a chegar lá... perto.

O resultado do trabalho deles está aí, para convencer os desconfiados de entre os cépticos. Este mês de Julho viu nascer mais dois prodígios nesta área. A Lamborghini acaba de lançar o seu novo super-modelo, o Gallardo LP570-4 Superleggera. Para não lhe ficar atrás, a Ferrari respondeu com o arrojado 590 GTO. Os dois levam 3.4 segundos dos zero aos cem km/h.  É o tempo de dizer “ai!” três vezes, mas só se já tiver ar nos pulmões.

Dan Neil, colunista de automóveis no Wall Street Journal, confessou à Newsweek que nunca pensou “ver um carro de estrada ir dos zero aos 100 em três segundos”. Em 1992, a Ferrari tinha o 255, que chegava aos 100 km/h em cinco segundos e, diz ele “parecia que a minha cabeça tinha saltado”. Cinco segundos é “o mínimo aceitável para qualquer carro que se queira chamar desportivo”.

Sem calorias

Em ano de crise económica e era de ambientalistas, a Lamborghini deixou-se de devaneios e foi pelo caminho seguro: pegou no seu menino bonito, o Gallardo, fechou-o na garagem e desatou a tirar-lhe gordurinhas. Trocadas umas impressões com a equipa de corridas, descobriu maneira de pôr mais uns 25 cavalos a puxar pela carroça. O produto final é um Gallardo de cara lavada.

É certo que o convenientemente chamado Superleggera foi uma pequena desilusão para os que no Salão de Genebra salivaram com os rumores de que iam levantar o pano sobre um novo SuperVeloce, com o emblema do touro bravo. Mas essas são dores da alma que passam depressa. Basta ouvir o novo Gallardo para esquecer. É como se a companhia tivesse fechado um monstro no corpo de um peso pluma.

O V10 de 5.2 litros tem 570 cavalos à solta e deixa o ponteiro viajar até às oito mil rotações – bem medidas – antes de tocar o red line e implorar pela mudança a seguir. Leva 3.4 segundos para chegar aos 100 km/h e quando o cronómetro a marca 10.2 segundos já vai a 200. É um foguete que se deixa levar até aos 345 km/h antes de se queixar das suas capacidades.

O CEO da Lamborghini, Stephan Winkelmann, explicou à revista americana Newsweek que a marca pediu alguma tecnologia emprestada aos mecânicos das equipas de corrida para dar um toque de génio na obra. O motor a gasolina de  Iniezione Diretta Stratificata está afinado para permitir uma redução de mais de 20.5% das emissões de carbono face ao anterior modelo, - e assim conseguiu responder às exigências da União Europeia.

Mas o maior segredo de todos foi pôr o Gallardo em dieta forçada. Os ingegneri de Sant'Agata Bolognese – comuna onde se localiza a fábrica da veloz marca italiana – usaram e abusaram da fibra de carbono na carroçaria e no interior e trocaram o pesado vidro de trás por policarbonato. Dessa forma, cortaram 70 quilos no peso do seu menino bonito.  Na balança, o LP570-4 fica-se pelos 1340 quilos, e leva a medalha do mais levezinho na família.  Tanto quanto foi possível apurar, ainda nenhum português encomendou o novo Gallardo. Mas a Lamborghini Portugal já lhe deu um preço: 262 mil euros, chave na mão.

Mais do que vermelho

Quando, há poucas semanas, perguntaram a Amedeo Felisa o que é que achava da nova berlinetta saída da fábrica de Maranello, o CEO da Ferrari deixou-se levar pelo sentimento: ”É o Ferrari definitivo”. Minutos depois, caiu na realidade e emendou a mão: “Conseguimos sempre fazer melhor. Porquê parar por aqui?,” perguntou, para sossego das hostes. Apesar de anedótica, a história é absolutamente verídica e dá uma amostra que vai na alma dos responsáveis da marca italiana. Após meses de rumores o 599 GTO aí está e vem com o rótulo pesado de ser o mais rápido carro de estrada que a Ferrari alguma vez construiu.

Visto de raspão este Gran Turismo Omologata com o símbolo do Cavallino Rampante pode fazer lembrar um Viper, só que em vermelho e sem as duas tiras brancas que embrulhavam o mais bem sucedido dos Dodges.  Na verdade, o 599 GTO saiu do molde do 599XX e depois seguiu pelo traço dos homens da Pinifarina, o velho compagnon de route da Ferrari e que é uma espécie de Gucci do design automóvel.

Nas mãos dos mecânicos perdeu também uns poucos de quilos, ao ponto de na forma final nem chegar à tonelada e meia. Porém, foi no motor que mais capricharam: deram-lhe um fora-de-moda V12 de seis litros e 670 cavalos. ÉE o resultado é um “saiam-me da frente” que tem o seu quê de americano.

Os jornalistas da revista Top Speed não poupam palavras para elogiar o desempenho do “rebelde” que leva 60 milissegundos a trocar a mudança e vai até aos 331 km/h. Isso ajudou-o a completar uma volta na circuito de testes de Fiorano em 1 minuto e 24 segundos, um dado que impressiona quem percebe do assunto. Para se ter uma ideia, são mais 30 segundos apenas do que a melhor marca de Michael Schumacher. E ele ia sempre ao volante de um Fórmula 1.

Para se deitar a mão ao novo mais-que-tudo da Ferrari já nem 400 mil euros chegam. A marca italiana seguiu a sua velha fórmula de sucesso e limitou a produção do 599 a… 599 unidades. Há alguns dias, a Ferrari veio anunciar que já tinha preenchido todas as encomendas: o GTO 599 já esgotou.

RADIOGRAFIA

Gallardo Superleggera
Peso: 1340 kg
Motor: V10 de 5.2 litros
Potência: 570 cavalos
0-100km/h: 3.4 segundos
Velocidade máxima: 345 km/h
Marca: Lamborghini
Preço: 262 mil euros (esgotado)

599 GTO
Peso: 1495 kg
Motor: V12 de seis litros
Potência: 670 cavalos
0-100km/h: 3.4 segundos
Velocidade máxima: 331 km/h
Marca: Ferrari
Preço: 400 mil euros (esgotado)


A guerra entre o cavalo e o touro

A guerra entre Ferrari e Lamborghini começou em 1962 quando Enzo Ferrari lançou o 250 GTO. O tempo fez do carro um mito, mas, na altura, o GTO deixou um cliente desiludido. Chamava-se Ferruccio Lamborghini e era um proprietário rural do norte de Itália. Lamborghini achava o carro barulhento e dizia mal do serviço de oficinas. Conta-se que depois de uma discussão com Enzo decidiu fundar a sua própria marca.

Contratou Giotto Bizzarrini, um dos engenheiros que produzira o GTO, e encarregou-o de construir o motor do seu primeiro carro, o 350GTV. O projecto até correu mal de início, mas deu o tiro de partida para a eterna corrida entre o Cavalo e o Touro. Que este mês conheceu mais uma etapa. 

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