A mãe de um dos cadetes do primeiro ano da Escola Naval relatou hoje à Lusa que o seu filho sofreu abusos físicos, "mas sobretudo psicológicos", enquanto frequentou esta instituição, num ambiente de "praxe constante" entre alunos..À agência Lusa, esta mãe de um aluno que tem agora 18 anos - que pediu para não ser identificada por recear repercussões para o filho - relatou um ambiente de "praxe constante" entre cadetes mais velhos e mais novos nos poucos meses em que o filho frequentou esta instituição..Na noite de terça-feira, já a Marinha tinha divulgado um comunicado em que admitia ter tido conhecimento de uma denúncia sobre "alegados comportamentos abusivos" praticados entre cadetes da Escola Naval, tendo iniciado diligências para averiguar a "veracidade dos factos relatados e eventuais responsabilidades", sem adiantar mais pormenores.."Eu não tinha a noção, não tinha conhecimento de um centésimo do que se passava lá dentro, senão nunca na vida teria ficado até este ponto, o meu filho saiu hoje", disse esta mãe à Lusa..Segundo o relato feito pelo seu filho, "pior do que a parte física é realmente a parte psicológica" e "as ameaças que recebem são muitas, inclusive de não contar em casa o que se passa lá"..Uma das situações indicadas por esta mãe à Lusa está relacionada com uma privação do sono, em que os cadetes alegadamente são forçados a praticar atividades físicas durante a noite..De acordo com este relato, os castigos entre cadetes eram "constantes", sendo tanto físicos como psicológicos, como por exemplo saber informações sobre determinados alunos e responder a perguntas. Às refeições, adiantou, eram "bombardeados" com questões de todo o tipo.."Ele diz, 'não sabemos se é pior sentarmo-nos para comer, se é pior mandarem-nos fazer trinta flexões, se é pior termos que nadar durante a noite e dormirmos com os fatos molhados porque não nos deixam trocar de roupa quando chegamos ao quarto. Se é pior fazerem-nos deitar na cama mas sem colchão, (...) as poucas horas que dormimos é em cima de um estrado ou molhados", relatou..Esta mãe adiantou ainda que o seu filho testemunhou alunos a levarem "pontapés" dos mais velhos por não estar "na posição correta" em certos exercícios e noutros casos a receberem "cuspidelas na cara".."Ele vai para um psicólogo, estou a tratar disso, porque ele diz que não é a mesma pessoa que lá entrou e não sabe se alguma vez o será", disse..De acordo com o relato deste filho à sua mãe, "toda a gente dentro da Escola Naval tem conhecimento do que se passa".."Em pleno século XXI isto não cabe na cabeça de ninguém. Eles estão a tentar transmitir valores e eu acredito muito nos valores das Forças Armadas, eu sou familiar de um militar, mas isto não são valores que estão a transmitir", considerou..A agência Lusa tentou entrar em contacto com a Marinha mas não conseguiu obter esclarecimentos sobre esta questão..Numa nota publicada esta terça-feira à noite no 'site' da Marinha lê-se que: "A Marinha informa que hoje, 19 de outubro, teve conhecimento de uma denúncia sobre alegados comportamentos abusivos praticados entre cadetes da Escola Naval"..Nessa nota, o ramo adiantou ainda que "não recebeu diretamente qualquer denúncia relativamente ao alegado comportamento entre cadetes", contudo, atendendo à situação, "iniciou as diligências internas para averiguar e apurar a veracidade dos factos relatados e eventuais responsabilidades".