Luís Montenegro é a alternativa ou um líder a breve prazo?

Duas eleições, Madeira e europeias, podem decidir o futuro do presidente do PSD. Nas sondagens, o melhor que consegue é empates técnicos. É a perceção da realidade, que muitas vezes é mais real do que a realidade, ou Montenegro é só um líder para "meio-caminho"? No DN, a análise dos especialistas.
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A "encruzilhada", seja nó górdio ou inquietação dos "mais apressados" sociais-democratas, está na dificuldade, manifesta - consideram os especialistas e políticos ouvidos pelo DN - em quebrar "a perceção da realidade, que muitas vezes é mais real do que a realidade".

Preso a uma "tirania do agora", Montenegro conseguiu reduzir a distância nas sondagens que o afastavam de Costa e do PS, "e até apresentar propostas", mas o cenário de "sucessivos empates técnicos" começa a criar a "sensação" de que já atingiu o "topo", de que é "líder para meio-caminho".

E nem a "estratégia" de "captar", no momento "oportuno", os desiludidos do Chega, assumindo o "não" a quaisquer acordos ou coligações com o partido de André Ventura, de forma clara, à semelhança do que a IL já fez, "deitando por terra" o "marketing" que Costa e a Esquerda usaram contra Rui Rio, parece funcionar.

Tão pouco, sequer, as ideias repetidas de que não vai "ter no Governo nem políticas, nem políticos racistas, nem xenófobos, nem oportunistas, nem populistas, ou apoio político" e de que "só" governará Portugal "se ganhar as eleições" afastaram a "sombra de acordos" com o Chega.

A principal separação de águas necessária, considera Jaime Nogueira Pinto, para que Luís Montenegro seja "alternativa" ao PS e Costa, é "mostrar que em valores, princípios e posições políticas o PSD não é o PS2". Ou seja: quebrar o histórico "Centrão".

"Quebrar isso com uma política clara de distinção em relação ao PS é o que o líder do PSD - este ou outro - têm de fazer", afirma.

"Os partidos portugueses nasceram num tempo e num clima de hegemonia de Esquerda, o que se traduziu na deslocação para os princípios da Esquerda de todo o leque eleitoral, a formação do Centrão, e a hegemonia do Centrão num rotativismo PS-PSD que dominou a 3.ª República." Mas esse tempo, na opinião do historiador e doutorado em Ciência Política, precisa de ser quebrado.

E Montenegro? "Não se pode dizer que foi uma desilusão, porque mesmo no momento da sua eleição não tinha despertado muitas expectativas nem junto da comunicação social, nem junto dos analistas políticos, nem de muitas figuras proeminentes do partido. Aliás, o seu primeiro período de liderança não cancelou aquele sentimento sebastianista em relação a Passos Coelho que ainda existe nas hostes sociais-democratas e que diz muito do perfil de liderança dos seus dois sucessores", diz Riccardo Marchi, investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL.

A questão da "perceção da realidade", a "perceção pública" que "muitas vezes é mais real do que a realidade" - como refere fonte social-democrata ao DN -, pode explicar, entende Paula do Espírito Santo, professora e investigadora no ISCSP/UL, o facto de "Montenegro, neste momento, ainda não parecer ser alternativa clara".

"Tal sucede, essencialmente, por motivos de ordem comunicacional (pouca ou tardia reatividade em assuntos politicamente prementes), de ordem estratégica (designadamente por Montenegro não desempenhar funções de deputado, estando, assim, votado a uma menor visibilidade política e pública), de ordem estratégica (fraca demarcação em relação à Oposição e em relação ao desempenho público do primeiro-ministro) e a dificuldades do ponto de vista das relações intrapartidárias (atendendo às diversas fações dentro do PSD, nomeadamente na AR, nem sempre apoiantes do atual líder)", resume.

E se "a liderança de Luís Montenegro não está a conseguir diferenciar-se da imagem morna, pouco apelativa, pouco mobilizadora e de escasso interesse mediático do seu predecessor Rui Rio", este PSD, diz Riccardo Marchi, "continua a ser, de longe, o partido mais consistente no Centro-Direita como alternativa ao PS".

A explicação da "consistência" não está nas virtudes políticas dos social-democratas, está antes, considera Riccardo Marchi, nos "problemas internos de IL e Chega" até porque já passaram "quase quatro anos do aparecimento" destes dois partidos.

"É tempo mais que suficiente para terem dado prova da capacidade de desafiar perigosamente o papel do PSD como maior partido da (atual) Oposição e nenhum dos dois parece ter feito mossa grave na capacidade de o PSD continuar a ser o pilar da alternativa ao socialismo. Os dois estão numa dinâmica de consolidação, mas não particularmente preocupante para a centralidade do PSD. Possivelmente, isso diz muito mais dos problemas internos de IL e Chega em conquistar cada vez mais espaço que da não-capacidade de Luís Montenegro de resolver a crise do PSD", afirma.

E depois há a tal "perspetiva de uma maioria aritmética de Centro-Direita" - na versão de Marcelo "há uma alternativa aritmética ao Governo, mas não uma alternativa política" à "maioria cansada e requentada" de Costa -, mas "o congelamento das relações de forças internas a este bloco e a permanência da indefinição da linha PSD quanto ao Chega e da impermeabilidade da IL a qualquer hipótese de acordo pós-eleitoral que inclua o Chega" irá, defende Riccardo Marchi, "dificultar (e muito) a capacidade de Luís Montenegro apresentar um projeto alternativo claro, consistente, realmente desafiador para o PS de António Costa".

Sem "uma proposta credível" que mobilize o "eleitorado fiel", de pouco servem "apelos ao voto útil antissocialista".

Em síntese: o PSD sofre de uma "imagem morna" de Montenegro, de um "sentimento sebastianista" sobre Passos Coelho, de uma permanente "indefinição" em relação ao Chega e da falta de "uma proposta alternativa sólida".

E é neste cenário que Luís Montenegro, considera o investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL, vai enfrentar as duas eleições já próximas.

"Se as eleições da Madeira de 24 de setembro de 2023 e as europeias de junho de 2024 correrem mal (quer em termos de resultado eleitoral quer em termos de clareza da mensagem das alianças no Centro-Direita), Luís Montenegro chegará bastante fragilizado ao momento das legislativas de 2026. E aí sim, falhar aquele momento eleitoral (que acredito protagonizará como líder do PSD) determinará o seu futuro político a prazo na liderança", afirma.

Onde estão as incertezas? A primeira reside no objetivo de uma "maioria absoluta" nas regionais madeirenses. As sondagens têm criado essa "imagem", mas o que farão os indecisos que oscilam entre os 13% e os 25%? E quantos serão os abstencionistas? A geometria partidária pode mudar com o possível regresso do BE ao Parlamento Regional e a entrada da IL - que pode eleger entre um a dois deputados - e o Chega eleger três e transformar-se na quarta ou terceira força política.

Dado adicional: a recente crise no JPP (Juntos Pelo Povo) com a demissão do seu líder, que foi colocado em quinto lugar nas listas de candidatos a deputados pela comissão política do partido, abriu uma nova "oportunidade" para os socialistas. Porém, há quem não afaste a ideia de um "golpe de teatro", nesta guerra política familiar, de modo a permitir que se crie uma "onda de apoio" ao líder demissionário.

A outra "oportunidade" está no facto de Miguel Albuquerque, presidente do Gverno Regional e líder do PSD-M, não recusar de forma "clara e inequívoca" a possibilidade de acordos com o partido de André Ventura para garantir a "sua maioria absoluta".

E há também uma esperança na Oposição: que a CNE seja "implacável" e não permita as "permanentes e históricas violações da lei eleitoral", como se a Madeira "fosse uma terra sem lei", como referem ao DN fontes locais.

A segunda incerteza decorre da primeira. Se PSD-M, que vai a estas eleições em coligação com o CDS - que vários setores locais sociais-democratas contestam -, estabelecer acordos, ainda que parlamentares, com o Chega, a liderança de Luís Montenegro vai ser "afetada".

"Vamos ter a Esquerda toda e até a IL a usar isso contra o PSD. Vai ser pior do que nos Açores. E ainda por cima estaremos a meses das eleições europeias", diz fonte social-democrata.

"E o pior é que o Luís [Montenegro] ainda não disse um não ao Chega que todos percebam", sublinha fonte parlamentar.

O recente estudo sobre sondagens de comportamento de voto realizado pelo Centro de Estudos e Sondagens de Opinião e pelo Centro de Investigação do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, que analisou mais de duas mil entrevistas, deixa indicações claras sobre, como nesta altura, os portugueses e, em particular, os eleitores do PSD olham a possibilidade de coligações com o Chega.

A diferença, residual, não deixa margem para dúvidas: 73% dos portugueses considera muito negativo ou negativo coligações com o partido de Ventura; 72% dos eleitores do PSD dizem o mesmo. O Chega é visto como extremista e um perigo real para a democracia.

Se a maior parte dos analistas, incluindo o próprio Marcelo Rebelo de Sousa, diz não ver "alternativa" no PSD, este estudo revela que o partido "tem neste momento maior potencial de captura de eleitorado do que PS", que "entre os votantes PS, há 30% que consideram provável ou muito provável votar PSD", que "entre os abstencionistas de 2022 a tendência também é mais favorável a PSD do que a PS" e que o PSD recuperou eleitores acima dos 65 anos. Numa frase: parece que o "PSD está a conquistar mais eleitores PS do que o contrário".

2019

Partido-Percentagem-Eurodeputados

PS 33,38% 9

PSD 21,94% 6

BE 9,82% 2

PCP 6,88% 2

CDS 6,19% 1

PAN 5,08% 1

2014

Partido-Percentagem-Eurodeputados

PS 31,46% 8

PSD/CDS 27,71% 7

PCP 12,68% 3

MPT 7,14% 2

BE 4,56% 1

2009

Partido-Percentagem-Eurodeputados

PSD 31,71% 8

PS 26,58% 7

BE 10,73% 3

PCP 10,66% 2

CDS 8,37% 2

2004

Partido-Percentagem-Eurodeputados

PS 44,53% 12

PSD/CDS 33,27% 9

PCP 9,08% 2

BE 4,91% 1

1999

Partido-Percentagem-Eurodeputados

PS 43,05% 12

PSD/CDS 39,26% 11

PCP 10,32% 2

1994

Partido-Percentagem-Eurodeputados

PS 35,54% 10

PSD 34,39% 9

CDS 12,45% 3

PCP 11,19% 3

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