Luís Freire, um jovem treinador especialista em subir de divisão
Luís Freire é um desconhecido no mundo do futebol. Está ainda longe dos palcos mediáticos aonde um dia sonha chegar, mas aos 32 anos contabiliza cinco épocas completas como treinador principal que fazem antever um futuro brilhante. É que já contabiliza quatro subidas de divisão ao serviço dos modestos Ericeirense e Pero Pinheiro. E já aponta à quinta promoção, pois o seu Mafra é líder da Série D do Campeonato de Portugal, com seis pontos de vantagem sobre o Vilafranquense. Estes feitos já fazem que seja apelidado de "Vítor Oliveira dos pobres" ou "Mourinho das subidas"...
"Tem sido tudo muito rápido", admitiu ao DN Luís Freire que, curiosamente, aos 18 anos ainda não tinha a noção daquilo que queria para o futuro. "Não tinha uma ideia clara daquilo que queria fazer. Tinha sido jogador nos escalões de formação do Mafra, mas só no segundo ano do curso de Desporto na Universidade de Évora é que comecei a ganhar o gosto pelo treino", assumiu. Agora, tem o seu sonho bem consolidado: "Comecei na I Divisão Distrital e tenho a ambição de chegar à I Liga a médio prazo, mas depois pretendo ir ainda mais longe."
Contudo, deixa bem claro que prefere "manter os pés assentes no chão" e mostra-se consciente de que apenas poderá chegar ao topo "pelo mérito", já que não tem o passado mediático de ter sido jogador de futebol. Neste percurso ainda curto faz questão de "agradecer" aos elementos da sua equipa técnica, mas também "aos jogadores" pelo que já alcançou. Afinal, como faz questão de dizer, "sozinhos não vamos a lado nenhum".
Luís Freire assume-se como "um ladrão de ideias", pois é isso que considera serem os treinadores na atualidade, na forma como "tentam perceber as melhores ideias dos outros para adaptarem à sua forma de jogar". E é nessa base que segue três treinadores com toda a atenção: "Procuro retirar coisas de Guardiola, Maurizio Sarri e Thomas Tuchel, treinadores que elevam o futebol a um espetáculo positivo", mas não esquece os portugueses: "Gosto particularmente do Paulo Fonseca, mas também do Marco Silva e aprecio Jorge Jesus. E além disso tenho um enorme respeito pelo currículo de José Mourinho." A sua máxima enquanto treinador é que "com uma boa ideia de jogo é possível ajudar os jogadores a desempenharem melhor o seu papel".
Crise acelera começo
Após tirar a licenciatura em Futebol e de ter realizado estágios curtos no Benfica e no Sporting, Luís Freire quis tentar logo o futebol sénior, tendo primeiro sido observador de Filipe Moreira, treinador com uma vasta experiência nos escalões secundários, que em 2009 o convidou para seu adjunto no Mafra, tendo-se assim mantido mais duas épocas, no Tondela e no Oriental.
Aos 26 anos, numa altura em que também treinava os escalões jovens do Ericeirense, surgiu a oportunidade de Luís Freire começar uma carreira a solo. "O clube estava numa grave crise financeira e diretiva e convidaram-me para pegar na equipa principal, que disputava a I Divisão da Associação de Futebol de Lisboa. E como eu sou da Ericeira, aceitei e convidei alguns dos meus colegas de universidade para serem meus adjuntos", recordou. E aqui começaram os problemas: sem dinheiro, Freire pediu ajuda aos capitães de equipa para sensibilizar alguns jogadores do concelho de Mafra.
"Procurámos criar um ambiente favorável aos jogadores e procurámos alguns que até já tinham desistido do futebol para continuarem. Atraímo-los pelas ideias semelhantes ao futebol profissional." E assim conseguiu formar uma equipa que só chegou à primeira vitória ao quinto jogo, mas que depois embalou para o primeiro lugar e para a subida à Divisão de Honra.
"Peditório" rendeu 23 mil euros
Apesar do sucesso, os problemas mantinham-se. "Sem dinheiro, eu e um colega fomos para o centro da Ericeira, com um computador, à procura de apoios essenciais para que o clube não acabasse", revela. A adesão das pessoas não podia ter sido melhor... "Conseguimos angariar 23 mil euros, que foi o nosso orçamento, o que nos permitiu dar 75 euros a cada jogador, que deixavam de jogar de graça." O início de época voltou a ser difícil e em dezembro Luís Freire viu o seu adjunto Vítor Gazimba ser convidado para ir para a Noruega treinar os sub-23 do Stromsgodset. No final, o Ericeirense ficou apenas a dois pontos da subida, que seria concretizada na época seguinte, a duas jornadas do final do campeonato.
Em 2015-16, Luís Freire entendeu que era a altura de um novo projeto e foi para o Pero Pinheiro, que tinha a ambição de voltar ao Pró-Nacional. "Foi a primeira vez que só me dediquei ao futebol e ao treino e começámos com uma série de 24 jogos sem perder", lembra o técnico, que rapidamente alcançou a sua terceira subida de divisão, que repetiu na temporada seguinte. "Estivemos sempre na frente e estivemos 15 jogos seguidos sem perder, que permitiram alcançar a promoção ao Campeonato de Portugal", sublinhou.
No início desta época apareceu a possibilidade de rumar ao Mafra, também do Campeonato de Portugal, e o primeiro lugar que ocupa agora alimenta o sonho de chegar à II Liga. "Será muito difícil conseguirmos, porque só sobem duas equipas. Para já, o nosso objetivo é ir ao playoff e depois tudo pode acontecer", frisou.
Este é o primeiro ano de Luís Freire como treinador profissional. "Fui professor de Educação Física em Massamá e Mafra", revela, numa altura em que aposta na carreira que é agora a dos seus sonhos. E não esconde: "Se conseguir a subida com o Mafra pode ser que outros clubes estejam atentos ao nosso trabalho." Pois, como faz questão de dizer: "Há sempre espaço para bons treinadores, pois a qualidade e a competência é que falam por eles."