Não é a primeira vez nem será a última que Sadiq Khan, o autarca da capital britânica, critica Donald Trump. Desta vez escreveu um artigo de opinião no Observer , no qual, além de lamentar a visita de Estado, sugere que a primeira-ministra Theresa May deve publicamente rejeitar o que o presidente norte-americano representa, "um dos exemplos mais notórios de uma crescente ameaça global".."Nos próximos anos, suspeito de que esta será uma visita de Estado que recordaremos com profundo pesar e reconheceremos que estivemos do lado errado da história. É demasiado tarde para acabar com o tratamento com honrarias, mas não é demasiado tarde para a primeira-ministra fazer o que está certo. Theresa May deveria pronunciar-se a favor de uma enérgica rejeição - não dos EUA como país ou do cargo da presidência - mas de Trump e da agenda de extrema-direita que encarna. Deveria dizer que os cidadãos do Reino Unido e dos EUA concordam em muitas coisas, mas que as opiniões de Trump são incompatíveis com os valores britânicos", escreveu Khan..Noutra passagem, o mayor coloca o chefe de Estado numa galeria que inclui o húngaro Viktor Orbán, o italiano Matteo Salvini, a francesa Marine Le Pen e o britânico Nigel Farage, que "usam as mesmas estratégias de divisão dos fascistas do século XX para ganhar apoio, mas estão a usar novos métodos sinistros para transmitir a mensagem"..Sadiq Khan autorizou no ano passado a utilização do Trump Baby, balão com uma imagem de um Donald mal-humorado, de fraldas e telemóvel na mão. E não será pelo presidente da câmara que a figura de seis metros estará no ar, na Praça do Parlamento, na terça-feira, no segundo dia da visita, enquanto Donald Trump vai reunir-se com empresários e com Theresa May no palácio de St. James..A presença do balão nas manifestações só esteve em dúvida porque os seus donos, os ativistas Leo Murray e Matt Bonner, condicionaram a presença do insuflável cor de laranja a uma iniciativa de angariação de fundos para seis organizações no Reino Unido e nos EUA. E em menos de 24 horas alcançaram as 30 mil libras, pelo que a figura de Trump vai voltar a voar junto ao Parlamento britânico. "Trump vem ao Reino Unido para comemorar a derrota do fascismo após o Dia D e ao mesmo tempo segue uma perigosa agenda de extrema-direita e alimenta as chamas do ódio", disse Matt Bonner, designer do balão..Trump, Melania, os quatro filhos do presidente e acompanhantes vão ser recebidos com pompa durante a visita de Estado que se prolonga até quarta-feira. O programa inclui um almoço com a rainha Isabel, um chá com o príncipe herdeiro Carlos, um banquete no Palácio de Buckingham - ao qual políticos como o presidente do Parlamento, John Bercow, ou o líder dos trabalhistas, Jeremy Corbyn, se recusaram a ir - e um passeio pela Abadia de Westminster, local da coroação dos monarcas..A tradição já não é o que era.É da praxe que o programa de uma visita de Estado inclua um discurso no Parlamento. Mas em 2017, John Bercow avisara que, caso Donald Trump visitasse o Reino Unido, não iria convidá-lo. "Um discurso de um líder estrangeiro às câmaras do Parlamento não é um direito automático, é uma distinção merecida (...) Acredito veementemente na nossa oposição ao racismo e ao sexismo e no nosso apoio à igualdade perante a lei e à independência do poder judicial", disse perante o aplauso geral das bancadas da oposição..Além de não visitar o Parlamento, Donald Trump também não fará o passeio de coche pelo percurso habitual nessas ocasiões, pela avenida The Mall até ao Horse Guards Parade, em Whitehall. Por razões de segurança, terá de contentar-se com um passeio mais curto, pelos jardins do Palácio de Buckingham..Além das manifestações contra a presença de Trump e a pompa que é sabido agradar ao presidente dos EUA, a visita pode ficar marcada quer por declarações do norte-americano quer por alguma falha no protocolo. Não seria a primeira vez: na visita de 2018, violou o protocolo real ao revelar publicamente pormenores de uma conversa com o monarca sobre as complexidades do Brexit; além disso, não fez uma vénia à rainha e na revista à guarda real atravessou-se à frente da nonagenária..Quanto às declarações do presidente, exemplos não faltam, quer nas declarações proferidas ao lado de Theresa May, na visita anterior, quer nas mais recentes. Donald Trump não se coibiu de dizer que seguiria outra estratégia em relação ao Brexit, aconselhou-a a processar Bruxelas e que a abordagem de May iria liquidar um futuro acordo de comércio entre os dois países. Agora voltou a falar sobre o tema. Em entrevista ao The Sunday Times, disse que se estivesse na liderança do Reino Unido sairia de forma unilateral e não pagaria os compromissos que o Reino Unido tem para com a UE, entre 40 e 45 mil milhões de euros..Prova de que o Brexit é um tema que interessa à Casa Branca, o embaixador dos EUA Woody Johnson revelou numa entrevista à BBC que há um interesse dos norte-americanos em aceder à privatização do Serviço Nacional de Saúde numa economia pós-Brexit..E questionado sobre a possibilidade de os britânicos abrirem as portas a uma flexibilização das normas aos produtos norte-americanos, como os controversos frangos com cloro, disse que isso caberia aos consumidores britânicos. "Terá de haver um acordo em que se dê ao povo britânico uma escolha (...) Se gostarem podem comprar, se não gostarem não compram.".Além das futuras relações bilaterais, Donald Trump deverá voltar a advertir o Reino Unido para não adotar a tecnologia 5G da chinesa Huawei. Segundo Washington, Pequim teria oportunidade de espiar comunicações e dados sensíveis, algo que a marca chinesa nega. O secretário de Estado Mike Pompeo disse no mês passado que o Reino Unido precisa de mudar a atitude em relação à China e à Huawei, tendo comparado a ameaça para o Ocidente semelhante à da União Soviética..Além da família, Donald Trump deverá ser acompanhado por uma equipa de mil pessoas (assim foi na visita anterior), entre agentes dos serviços secretos, staff e elementos da administração. Alguns funcionários já tinham seguido para Londres para tratar das questões de protocolo e de segurança. "Nós enviamos equipas com antecedência e, uma vez no terreno, elas coordenam-se com o pessoal e com a Sra. Trump em todos os aspetos da viagem - a logística do evento e da imprensa são provavelmente os maiores componentes", diz a vice-chefe do Estado-Maior, Stephanie Grisham, à CNN. "Trabalhamos em estreita colaboração com os nossos colegas da ala oeste [da Casa Branca] para que todos estejam cientes dos movimentos de cada protagonista, e também trabalhamos ao lado dos Serviços Secretos para garantir a segurança", disse Grisham..Meghan ausente, mas à mesa.À chegada a Londres, Trump é recebido numa cerimónia de boas-vindas pela rainha no Palácio de Buckingham. A passagem em revista à guarda real e uma salva de armas fazem parte da cerimónia que antecede um almoço privado com o duque de Sussex, o príncipe Harry, mas do qual a sua mulher, Meghan Markle, mãe há três semanas, estará ausente. Este almoço segue-se a uma polémica em torno das declarações pouco polidas sobre a mulher de Harry, a norte-americana Meghan Markle. A contribuir para a polémica, Trump desmentiu ter chamado à duquesa "malvada", apesar de a gravação da entrevista do The Sun mostrar o contrário..Da agenda faz ainda parte o depositar de uma coroa de flores na Abadia de Westminster e uma visita guiada aos primeiros artigos de importância histórica para os Estados Unidos que fazem parte da coleção real. O momento alto do primeiro dia é o banquete, a ter lugar no palácio..No segundo dia, Trump e Theresa May estarão juntos em Downing Street, mas também no já mencionado encontro com empresários. Irá também tomar chá com o príncipe Carlos e a duquesa Camila. A agenda termina com um jantar oferecido pelo presidente dos EUA em Winfield House, residência oficial do embaixador norte-americano. É nessa propriedade localizada em Regent's Park que a família Trump ficará hospedada - o convite não incluiu a estada em propriedades reais..Encontro no aeroporto.No terceiro dia da visita, os Trump participarão nas comemorações do Dia D em Portsmouth, onde a rainha se despedirá dos visitantes. Os norte-americanos seguem para a República da Irlanda. Aí, irá encontrar-se com o primeiro-ministro Leo Varadkar no aeroporto de Shannon. Segundo The Washington Post, Trump queria receber Varadkar no seu clube de golfe e hotel em Doonbeg, onde fica hospedado, mas o governante recusou e propôs o Castelo de Dromoland, mas também Trump recusou. A área VIP do aeroporto acabou por ser o local onde ambos concordaram encontrar-se.