Lobos solitários têm só problemas mentais ou são "soldados" islamitas?

Alguns autores de ataques nunca tiveram contacto com grupo terrorista. Mas este utiliza as suas ações como propaganda.
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O caso do jovem afegão que feriu cinco pessoas a golpes de machado e de faca num comboio na noite de segunda-feira na cidade de Wuerzburg, no Sul da Alemanha, deixando duas delas em estado grave, é o exemplo mais recente de uma vaga de ataques levados a cabo por indivíduos isolados que tem como denominador comum o facto de os seus autores reivindicarem ligações ao Estado Islâmico (EI) ou deste grupo assumir a responsabilidade por estas ações. Como sucedeu a seguir ao ataque de Wuerzburg e também no sucedido em Nice, que causou a morte de 84 pessoas e centenas de feridos, entre os quais quatro portugueses.

Horas depois, a agência Amaq, ligada ao EI, designava o afegão de 17 anos como "um soldado" do grupo islamita e divulgava um vídeo em que o jovem, identificado como Muhammad Riyad, expressando-se na principal língua do seu país, o pashtun, profere ameaças. O jovem afegão chegara à Alemanha há um ano, viajando sozinho, requerera asilo e vivia com uma família de acolhimento numa cidade próxima de onde sucedeu o ataque.

O ministro do Interior do estado da Baviera, onde se situa Wuerzburg, Joachim Herrmann, afirmou que tudo apontava para um caso, recente, de autorradicalização, tendo sido encontrada uma bandeira do EI feita pelo próprio no seu quarto e um texto evidenciando esse processo. Aqueles que conviviam com Riyad descreveram-no como alguém que frequentava a mesquita local, mas sem mostrar qualquer sinal de radicalismo.

Não é a primeira vez que a Alemanha e, em particular, os caminhos-de-ferro neste país são palco de um ataque deste tipo. Em maio, um alemão de 27 anos irrompeu pelo cais de uma estação nos arredores de Munique, aos gritos de "Alá é grande", esfaqueando mortalmente um homem e ferindo outras três pessoas. Colocado sob observação psiquiátrica, não foi encontrada qualquer ligação a grupos islamitas.

Caso semelhante sucedeu na cidade de Dijon, em dezembro de 2014, quando um homem ao volante de um veículo atropelou 11 pessoas ao mesmo tempo que gritava "Alá é grande". Capturado vivo pela polícia, foi estabelecido que se tratava de um indivíduo com problemas psiquiátricos, sem relação com o EI. Mas, neste caso, como no de Wuerzburg ou Nice, o método de ação escolhido reconduz-se a instruções divulgadas por um dirigente daquele grupo terrorista, Abu Muhammad al-Adnani, em setembro de 2014, apelando à realização de ataques por todos os meios possíveis, o que incluía o recurso a armas brancas, estrangulamentos, atropelamentos e, inclusive, bastões e pedras para esmagar os crânios das vítimas. Exemplo desta conjugação de meios macabros, ainda antes do seu anúncio, foi o assassínio do soldado britânico Lee Rigby, a 22 de maio de 2013, nos arredores de Londres, quando foi atropelado nas imediações da sua unidade por Michael Adebolajo e Michael Adebowale, sendo em seguida morto a golpes de armas brancas. O pretexto para o ataque a Rigby foi o de "soldados britânicos estão a matar muçulmanos", disseram os seus autores no julgamento em que foram condenados a pena perpétua.

Por outro lado, verificam-se situações em que não sendo o EI de facto responsável pelo planeamento ou por instruções diretamente transmitidas aos atacantes, a sua inspiração está presente ou é reivindicada para conferir a atos de desequilíbrio mental ou de ressentimento social uma outra dimensão. E o EI aproveita para propaganda.

O atentado na discoteca Pulse, a 12 de junho em Orlando, na Florida, levado a cabo por Omar Mateen, de 29 anos, que matou 49 pessoas e feriu 53 outras, terá sido apenas inspirado pela propaganda e imagem de violência associada ao grupo islamita. As investigações realizadas não estabeleceram qualquer relação direta de Mateen com o EI ou que o grupo soubesse sequer da existência daquele. Na segunda situação pode ser enquadrado o ataque de Nice realizado pelo tunisino Mohammed Bouhlel, de 31 anos. Até pouco antes do atentado, o tunisino apresentava um modo de vida errático e nenhuma associação a grupos islamitas. O que só terá sucedido pouco antes do ataque da passada semana. Que o EI elogiou como "nova tática", apresentando Bouhlel como seu "soldado".

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