Lítio. "A mina para nós representa um perigo, a população está extremamente assustada"
Um "atentado ambiental à região do Barroso". Foi assim que Armando Pinto, presidente da Associação Montalegre com Vida, qualificou esta manhã a anunciada intenção de avançar com a exploração de lítio naquela região do Alto Tâmega, no distrito de Vila Real. Depois de ter já avançado com uma ação judicial que visa anular o contrato de exploração firmado em março entre o Estado e a empresa Lusorecursos, a associação está esta manhã a ser ouvida no Parlamento, numa audição agendada pela deputada única do Livre, Joacine Katar Moreira.
Uma das principais queixas deixadas por Armando Pinto foi o total alheamento do processo em que foram deixados os residentes de Montalegre e Boticas (os dois concelhos da região do Barroso). "As populações nunca foram escutadas, em nenhum momento. Não é dessa forma que as populações devem ser tratadas", disse aos deputados da Comissão parlamentar de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, acrescentando que a "população está extremamente assustada" com a perspetiva de vir a ter uma mina nas proximidades.
Lembrando que a região do Barroso é património agrícola mundial, reserva da biosfera, e que a maior parte do concelho integra a Rede Natura 2000, Armando Pinto considerou "assustadora" a quantidade de pedidos de prospeção que há para aquela zona (sete, nesta altura), a que se somam já dois contratos de direitos de exploração, isto numa zona que vive da agricultura e do turismo de natureza".
A exploração que já está contratualizada, explicou, "será feita no meio de três aldeias". "Estão 800 hectares concessionados a essa mina", numa serra que é contornada pelos afluentes do rio Beça e que é "riquíssima em água", prosseguiu o representante da associação, lembrando também a proximidade da barragem do Alto Rabagão, "uma das maiores reservas de agua potável da Península Ibérica", que abastece boa parte da região norte do país.
Armando Pinto contestou também o argumento de que uma futura exploração de lítio trará proveitos económicos à região. "A mina para nós representa um perigo", defendeu, argumentando que a zona de baldio em que ficará instalada a mina "representa uma importante fonte de rendimento dos agricultores" ultrapassando o "meio milhão de euros/ano", da mesma forma que o abate de floresta será também penalizador, na medida em que os cortes programados na floresta representaram, no ano passado, proveitos de 300 mil euros.
A "população de Montalegre está contra, não vai aceitar a mina", concluiu.
Na audição foi igualmente ouvida Maria do Carmo Mendes, representante da Plataforma Mina (Movimento Nacional Anti-Mineração, que junta vários movimentos contra a exploração de lítio), que considerou também que o "que se está a passar é extremamente grave", repetindo igualmente o termo "atentado ambiental".
"O que se está a passar no interior do país é muito grave, não venham com a desculpa da descarbonização, nós é que vamos pagar a fatura", disse aos deputados, sublinhando que as populações não foram informadas dos trabalhos de prospeção ("víamos que andavam a fazer furos na serra, mas não sabíamos para quê") e descobriram por acaso que estava em curso um período de discussão pública sobre a exploração mineira. Nessa altura, as "pessoas manifestaram-se, mas a resposta foi zero".
O secretário de Estado Adjunto e da Energia, João Galamba, afirmou que "teria cometido um crime" se tivesse revertido o despacho que aprovou a concessão da pesquisa e exploração de lítio em Montalegre, conforme lhe foi pedido.
Na Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, o governante defendeu: "Não se pode interromper um processo administrativo que decorre nos termos da lei, porque alguém diz que 'há marosca'".
"O que foi pedido [a reversão do despacho] era uma ilegalidade. Se eu tivesse revertido o despacho aí sim teria cometido um crime", acrescentou, esclarecendo que, nesse caso, estaria a substituir-se a um juiz.
O contrato de concessão de exploração de lítio no concelho de Montalegre, assinado entre o Governo e a Lusorecursos Portugal Lithium, tem estado envolto em polémica e uma das razões apontadas é o facto de a empresa ter sido constituída três dias antes da assinatura do contrato.
"Só por estultice ou por má-fé se pode usar o argumento da juventude da empresa que assinou o contrato. É cristalino o cumprimento da lei", defendeu o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes.
"Insisto no facto de todos estes diplomas e o contrato que atribui direitos serem todos do tempo em que o PSD estava no governo. Não por discordar deles, mas por ser absolutamente insidiosa a campanha que o PSD tem feito em torno deste processo", declarou o ministro.
Com Lusa.