Numa altura em que está em cima da mesa a reorganização do dispositivo operacional da PSP em Lisboa, olhando para a realidade criminal da cidade, há uma conclusão que salta à vista: nas esquadras localizadas junto a zonas de maior fluxo turístico foi denunciado o maior número de crimes..Segundo dados oficiais da Direção-Geral da Política de Justiça (DGPJ) relativos a um período de quatro anos (entre 2015 e 2018), a Esquadra de Turismo de Lisboa, nos Restauradores - especializada no atendimento aos turistas estrangeiros -, destaca-se, a grande distância de outras, na quantidade de queixas registadas: em 2018 foram 5994, bem longe das 1728 da Esquadra da Folgosa (Martim Moniz), localizada igualmente numa zona turística. Veja a infografia completa mais abaixo..Curiosamente, em terceiro lugar está a esquadra localizada no Centro Colombo, com 1467 queixas. Esta é financiada pelo próprio centro e os polícias recebem em sistema de gratificados. Funciona das nove à uma da manhã e tem sempre um agente no atendimento que recebe queixas tanto relativas a crimes no centro como fora. Em média, outros cinco agentes vigiam as lojas. "Mais de 80% das queixas são de furtos na Primark, boa parte de bagatelas de dois ou três euros", revela um dos agentes deste posto..Em entrevista ao DN (ler mais abaixo), o presidente do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT) encontra um fator comum entre as dez esquadras com mais criminalidade participada. "Parece que existe um padrão: o fluxo de cidadãos. Mais turistas, mais negócio, mais circulação de pessoas e bens", sublinha. Quanto ao maior destaque nas esquadras em zonas turísticas, Praça do Comércio, aeroporto, Parque das Nações, Restauradores, principalmente nesta última, este especialista atribui o elevado número de denúncias a "mais turismo, mas eventualmente a falta de policiamento de proximidade e preventivo"..Mais polícias na rua, menos esquadras.A PSP não quis explicar estes dados nem justificar a realidade indicada por estas estatísticas. Fonte policial que tem estado envolvida no plano de reorganização do dispositivo da capital assume ao DN que, "embora se tenha feito um grande esforço nos últimos anos para pôr mais polícias nas ruas, que levaram até a uma descida das participações criminais, há ainda um défice de policiamento no terreno." No seu entender, "o que estes números mostram é que, tal como a direção da PSP tem defendido, é muito mais útil ter mais polícias a fazer patrulhas preventivas, policiamento apeado de proximidade, do que polícias que têm de estar dentro das esquadras só para as manter a funcionar - no mínimo 12 agentes em cada"..A lógica e os critérios para reorganizar o dispositivo ainda não são conhecidos publicamente. O Ministério da Administração Interna admitiu ao DN que "para a reorganização do dispositivo das esquadras da PSP em Lisboa mantêm-se válidos os critérios referidos em 2011". Nesse ano, na altura da troika, o valor elevado"de algumas rendas, a degradação das instalações e a baixa produtividade - poucas queixas apresentadas e atendimento ao público - foram os fundamentos apresentados..O presidente do OSCOT diz que "para uma reorganização bem feita é fundamental promover estudos de segurança por entidades independentes, inquéritos de opinião, falar com as autarquias. É preciso conhecer os fluxos da criminalidade, a sua mobilidade, padrões, tempos de resposta às chamadas, tempos de circulação". António Nunes concorda que para uma cidade como Lisboa "os agentes podem ficar concentrados em muito menos instalações, mas tem de se estudar bem quais devem ser esses pontos. Esses devem ser fixados de forma a ser garantido um patrulhamento preventivo nas áreas de mais movimentação em toda a cidade e um tempo de resposta adequado em casos de ocorrências criminais"..Criminalidade grave é rara.Em 2019, Portugal recebeu 27 milhões de turistas, mais 7,3% do que em 2018, refletindo uma aceleração no ritmo de crescimento, segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE). As receitas turísticas aumentaram para 4,28 mil milhões de euros. Os dados do INE indicam que a Área Metropolitana de Lisboa foi visitada por 8,1 milhões de turistas (mais 7,5% do que no ano anterior), que renderam à economia 1,359 mil milhões de euros. A segurança continua a ser apresentada como um dos principais atrativos no cartão-de-visita para o nosso país..Um estudo realizado em 2018 pela Universidade Nova de Lisboa (Information Management School e o Instituto Português de Relações Internacionais) mostrou que 98% dos turistas inquiridos sentem-se seguros em Portugal. O inquérito foi realizado em quatro cidades que são destinos turísticos importantes: Lisboa, Porto, Faro e Sintra (vila). Neste inquérito só a "beleza natural e o património" ultrapassaram a segurança nas razões para os turistas terem escolhido Portugal..O DN pediu à DGPJ e à PSP os dados sobre a tipologia dos crimes em cada uma das esquadras para analisar os padrões e caracterizar cada zona, mas não recebeu resposta.."Boa parte das queixas dos turistas são furtos de carteiras, máquinas fotográficas ou outros equipamentos. Eles precisam de registar a queixa para serem ressarcidos pelos seguros. São raros os crimes graves", explica outra fonte policial, analista de informações da PSP. Terão sido uma exceção os recentes casos de esfaqueamentos de turistas, ambos em fevereiro: um homem em Alfama (cujo autor foi já detido) e uma mulher num McDonald's em Lisboa..crimes por esquadra Infogram.PERGUNTAS A.António Nunes, presidente do OSCOT."Falta policiamento de proximidade".Olhando para a distribuição da criminalidade em Lisboa entre 2015 e 2018 em cada esquadra da PSP, que conclusões tira?.Em termos globais não existem desvios significativos ao longo dos anos. Portanto, não me parece que uma avaliação pontual seja significativa para avaliação da situação, pois teremos de observar outros dados como a evolução da população ou alteração da tipologia da habitação par cruzar informação..As dez esquadras com mais participações são a do Turismo, Folgosa, Centro Colombo, Campo Grande, Aeroporto, Benfica, Praça do Comércio, Penha de França, Calvário, Olaias e Parque das Nações. Encontra aqui algum padrão?.Parece que existe um padrão: o fluxo de cidadãos. Mais turistas, mais negócio, mais circulação de pessoas e bens..Como se explica a diferença tão grande de queixas na Esquadra do Turismo?.Mais turismo, mas eventualmente falta de policiamento de proximidade e preventivo nas zonas mais turísticas..A esquadra do Centro Colombo (Carnide) tem também tantas participações porquê?.Deve ter um fluxo maior de clientes e uma menor ação preventiva pelas empresas de segurança privada. Poderá não ser de desvalorizar a localização do Estádio da Luz, mesmo em frente, com uma taxa elevada de ocupação..Como poderia ser reorganizado este dispositivo de esquadras?.Existem modelos de policiamento que devem ser analisados e testados. Torna-se necessário promover estudos de segurança por entidades independentes, cruzando todas as informações, e inquéritos de opinião, e só depois se poderá formular uma reforma estratégica.