Leonor Cipriano foi torturada mas não há prova de culpados
O Tribunal Judicial de Faro condenou, ontem, à tarde, o ex-coordenador da Polícia Judiciária (PJ), Gonçalo Amaral (já aposentado) a um ano e meio de prisão por falso testemunho durante a investigação do caso Joana, que ele próprio liderou, e o inspector António Nunes Cardoso a dois anos e três meses. ambos com pena suspensa devido a falsificação de documento, no qual relatava a queda nas escadas de Leonor Cipriano, num dos interrogatórios na Directoria de Faro.
Já Paulo Pereira Cristóvão, Leonel Morgado Marques e Paulo Marques Bom acabaram por ser absolvidos do crime de autoria moral de tortura a Leonor Cipriano naquelas instalações policiais para a obrigar a confessar o homicídio da sua filha Joana, então com oito anos, desaparecida em 2004, na aldeia da Figueira, perto de Portimão, onde residia a família.
"Leonor Cipriano foi, efectivamente, agredida na Polícia Judiciária", afirmou, durante a leitura do acórdão, ao longo de cerca de uma hora (com a sala de audiências cheia) o juiz Henrique Pavão, presidente do colectivo que contou com jurados, ressalvando, porém ser difícil determinar a hora e quem praticou tais actos por haver inspectores da PJ no terreno à procura de provas sobre a morte da criança, enquanto outros se encontravam no edifício da Judiciária, na capital algarvia.
"No caso dos autos, demonstrou-se que foram cometidos actos cruéis na pessoa da assistente. Esta foi a pessoa torturada e de quem o agente pretendia obter uma determinada informação. Sabe-se ainda que o agente do crime é um agente da Polícia Judiciária, não se tendo, todavia, apurado quem praticou os factos da integridade pessoal da assistente", refere o acórdão do tribunal.
O advogado Pragal Colaço, que vai recorrer da sentença, não escondia aos jornalistas o seu sentimento de revolta, apesar de três dos seus constituintes terem sido absolvidos e um condenado, pelo facto de ter sido considerado credível o testemunha da médica do Instituto Nacional de Medicina Legal, Teresa Magalhães, ao considerar que as lesões expostas em várias partes do corpo de Leonor Cipriano não eram compatíveis com queda de escadas, como inicialmente defendeu o PJ para desmentir a versão de agressões. "O que acho que aconteceu? Uma vergonha. Acontece que a professora Teresa Magalhães se tem alguma coisa de particular é ser extraordinariamente incompetente e foi muito bem manobrada neste processo", afirmou Pragal Colaço.
Quem ficou surpreendido com a condenação de Gonçalo Amaral foi o seu advogado António Cabrita. "Não esperava esta condenação, mas conto recorrer", considerou António Cabrita, para quem "aparentemente há ali uma contradição". É que se Gonçalo Amaral foi absolvido do crime de omissão de denúncia dos factos de que estava acusado, "não consigo perceber como é que há falso depoimento não agravado".
Por seu turno, Rodrigo Santiago, representante da Ordem dos Advogados, assistente no julgamento, referiu, com emoção, que "como patriota e democrata não posso admitir que a polícia portuguesa bata e torture as pessoas que estão à sua confiança".