Lay-off já chega ao futebol, mas há clubes que fizeram acordos com jogadores
Serão os clubes profissionais de futebol abrangidos pelo regime de lay-off decretado pelo governo? A resposta é sim. Quem o garante é João Diogo Manteigas, especialista em direito desportivo, lembrando que "o futebol não é um mundo à parte" e como tal "enquadra-se o regime geral das empresas" às Sociedades Anónimas Desportivas (SAD) e às Sociedade Desportiva Unipessoal por Quotas (SDUQ), que, na prática, é o modelo de gestão obrigatório na I e na II Liga.
O Belenenses SAD foi o primeiro a avançar para o lay-off "parcial" como forma de fazer face à quebra abrupta de receitas, depois da paragem dos campeonatos no início do mês de março. Em comunicado divulgado nesta segunda-feira, os azuis justificam que "a indústria do futebol está entre as mais atingidas pelos efeitos da pandemia".
Também o Desportivo de Chaves, da II Liga, vai avançar para o lay-off, conforme revelou o presidente da SAD, Francisco José Carvalho, à agência Lusa. "Não temos outra hipótese, somos obrigados a parar a nossa atividade e se existe uma lei geral temos de a utilizar", revelou, anunciando que foi garantido o pagamento "na integra" dos salários do mês de março.
"O lay-off é aplicado a qualquer empresa que prove ter tido uma quebra de 40% da sua faturação nos 30 dias anteriores, o que, no caso do Belenenses SAD, não é difícil de provar", explica João Diogo Manteigas ao DN, acrescentando que "o regime é o mesmo das restantes empresas". Ou seja, a Segurança Social suporta dois terços de cada um dos salários dos trabalhadores, num limite máximo de 1905 euros, enquanto a empresa paga 33%.
Ao DN, Joaquim Evangelista, presidente do Sindicato dos Jogadores (SJPF), confirmou que além do Belenenses SAD "há um conjunto de clubes da II Liga e alguns da I Liga a avançar para o lay-off", uma decisão que diz ser "uma falta de respeito para com as empresas em grandes dificuldades de subsistência e pelos portugueses".
"A ideia é de que os clubes deixem de cumprir as suas obrigações e aproveitem os benefícios do Estado, numa altura em que receberam o mês de março por parte das operadoras de televisão, por isso considero um abuso de direito quando há empresas em maiores dificuldades do que o futebol", frisou, assumindo ser "grave" que os clubes queiram "beneficiar de uma medida de emergência".
O líder do SJPF é da opinião que "o futebol deve encontrar soluções por si próprio" e lembra uma opção que chegou a ser abordada nas reuniões da Liga e que passava pela "criação de uma linha de crédito específica para o futebol profissional", à semelhança da que foi criada para o setor do turismo.
Uma solução que João Diogo Manteigas considera ser plausível, embora admita que alguns clubes não estejam em condições de suportar. "Seria como pedir dinheiro ao banco, em que é preciso apresentar garantias, mas, como algumas SAD têm outros empréstimos, ser-lhes-iam apresentadas taxas de esforço muito altas e taxas de juro entre 1 e 2%", explica, lembrando que muitos deles não conseguiriam dar essas garantias, pois as fontes de rendimento dos clubes são "a bilhética, que neste momento não existe, os direitos de televisão, que em muitos casos já foram adiantados, merchandising e patrocínios, que na maioria dos casos é muito baixo".
Evangelista admite as dificuldades que alguns clubes teriam para ter acesso a essa linha de crédito para se financiarem durante a pandemia, razão pela qual defende que "as garantias teriam de ser dadas através da Liga e da Federação Portuguesa de Futebol". "Seria encontrada uma solução e evitar-se-ia esta indecência praticada pelos agentes desportivos", frisa o líder sindical, aproveitando para qualificar o último parágrafo do comunicado do Belenenses SAD "execrável".
"Dizem eles: 'Quando as entidades públicas permitirem, o futebol regressará, e o Belenenses SAD regressará também', naquilo que considero ser um colocar de pressão sobre o Estado e as autoridades de saúde pública, quando o que nesta altura é mais importante é a saúde das pessoas e não o futebol", frisou.
Há, no entanto, "clubes que são exemplos de boas práticas" nesta altura complicada, faz questão de dizer Joaquim Evangelista, prometendo em breve revelar os seus nomes. "Além do lay-off, as SAD podem chegar a acordo com os jogadores de suspensão de parte dos salários dos jogadores neste período sem futebol, podendo pagar o remanescente dos salários quando o campeonato for retomado", explica João Diogo Manteigas.
E é precisamente isto que alguns clubes da I Liga já fizeram, de acordo com o presidente do Sindicato dos Jogadores. "Alguns mantiveram os salários, outros promoveram reduções salariais entre 20% e 30%, com os atletas a recuperarem mais à frente esse dinheiro", sublinhou.
Uma solução que dependerá sempre do acordo entre futebolistas e entidade patronal, mas que Evangelista vê com bons olhos, apesar de achar bastante complicada de alcançar em alguns casos e explica porquê: "Há dirigentes de clubes portugueses que nem falam com os jogadores durante este período difícil. Não há uma partilha de confiança, que seria importante para se estabelecerem compromissos para alcançar acordos."