Kobe Bryant, o adeus da lenda da NBA que não deixou pedra sobre pedra

O basquetebol americano perdeu, de forma trágica, uma das suas maiores estrelas. Chegou à NBA aos 17 anos e conquistou cinco anéis de campeão. Morreu poucas horas depois de ter visto o amigo LeBron James ultrapassá-lo como terceiro melhor marcador de sempre. Fica a memória de um dos melhores da história.
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"Serei sempre aquele rapaz, a fazer lançamentos imaginários que decidiam jogos no Great Western Forum [antiga casa dos LA Lakers], com meias enroladas, o caixote de lixo a um canto, o cronómetro a marcar 5 segundos e a bola nas mãos: 5... 4... 3... 2... 1. Sempre hei de amar-te." Este é um excerto da carta de Kobe Bryant no dia em que anunciou o adeus ao basquetebol, aos 37 anos. Terminou a sua carreira ao serviço dos seus Lakers com 60 pontos frente aos Utah Jazz e com o público a gritar pelo seu nome.

É essa a última imagem que fica de um dos melhores basquetebolistas de todos os tempos que, três anos e nove meses depois dessa noite inesquecível, perdeu a vida num trágico acidente de helicóptero na cidade de Calabasas, na Califórnia, que vitimou também a filha Gianna, de 13 anos, que seguia as pisadas do pai e sonhava ser uma estrela do basquetebol.

O fim da vida de Kobe chegou horas depois de ter publicado no Twitter uma homenagem ao seu herdeiro na NBA, LeBron James, que na madrugada deste domingo ultrapassou-o na lista de melhores marcadores de sempre da NBA. "Continua a levar o jogo para a frente, King James. Muito respeito, meu irmão", escreveu, numa espécie de passagem de testemunho, não imaginando que não iria continuar a ver o amigo LeBron a fazer história, como ele fez com a camisola dos Lakers.

Kobe Bryant nasceu em Filadélfia a 23 de agosto de 1978. Herdou do pai, Joe Bryant, antigo basquetebolista que brilhou nos anos de 1970 e 1980, o gosto e o talento pelo basquetebol. Aos 6 anos foi viver para Itália, onde o seu pai jogou durante sete anos, e tornou-se admirador da estrela brasileira Oscar Schmidt, que também jogava na liga italiana, e adquiriu ainda o gosto pelo futebol, tornando-se fã do AC Milan. Aliás, Kobe disse anos mais tarde que se tivesse continuado a viver em Itália provavelmente iria tentar ser futebolista.

Aos 17 anos "exigiu" ir para os Lakers

Só que Kobe tinha um talento incomum com a bola nas mãos. Em 1991, quando regressa a Filadélfia, seguiu as pisadas do pai e começou a destacar-se, a tal ponto que não precisou de entrar para a universidade para chegar à NBA. É que, quando ainda estava no ensino secundário, foi escolhido no draft. Foi a 13.ª escolha, mas não lhe agradou que tivesse de ir jogar para os Charlotte Hornets. O seu desejo era claro... só queria jogar no Lakers. Tinha apenas 17 anos, mas acabou por fazer valer a sua vontade porque o diretor geral do emblema de Los Angeles, Jerry West, tinha ficado impressionado com o seu talento e resolveu trocá-lo pelo poste sérvio Vlad Divac, que era uma das estrelas da equipa.

Como ainda era menor, os seus pais tiveram de assinar o contrato que o iria ligar aos Lakers a partir de 1996. Por essa altura, Michael Jordan, considerado o melhor de todos os tempos, estava na reta final da sua carreira, mas ainda era a maior estrela do jogo. No entanto, aquele jovem com um talento extraordinário é que iria ocupar o trono do rei dos Chicago Bulls.

Kobe Bryant começou a destacar-se com os seus afundanços, mas só na segunda temporada começou a impor-se na equipa e, com uma média de 15,4 pontos por jogo, tornou-se o mais novo de sempre a integrar o All Star Game, jogo que reúne anualmente os melhores jogadores da NBA após escolha dos fãs. Aos poucos, começou a bater recordes e surgiram as inevitáveis comparações com Jordan e com Magic Johnson, uma das maiores estrelas de todos os tempos dos Lakers.

81 pontos num jogo e o escândalo que abalou a sua vida

Mas os tempos eram agora de Kobe Bryant, que se tornou comandante daquela que foi considerada a dinastia dos Lakers, campeões da NBA em 2000, 2001 e 2002, formando uma dupla fantástica com o gigante Shaquille O'Neill. A época de 2002-03 foi de sonho, com uma média de 30 pontos por jogo, destacando-se o mês de fevereiro, durante o qual marcou mais de 40 pontos em nove jogos consecutivos. Contudo, foi apenas em 2006 que conseguiu o feito histórico de marcar 81 pontos num jogo, com os Toronto Raptors, que só não é o melhor registo de sempre porque um tal de Wilt Chamberlain fez 100 pontos em 1962.

A estrela de Bryant só se apagou ligeiramente em 2003, quando se envolveu num escândalo sexual com uma rapariga de 19 anos. Foi acusado de violação por uma funcionária de um hotel, mas o basquetebolista garantiu que não se tratou de nenhum crime, uma vez que tudo tinha sido consentido. Esteve na altura à beira do divórcio, mas conseguiu resistir a tudo e a queixa acabou por ser retirada um ano depois.

Por causa deste caso, Kobe autointitulou-se The Black Mamba, numa alusão à serpente mamba, pois teve de gerir muitas dificuldades numa altura em que estava em grande forma. Além dos problemas fora do campo, teve de lidar com os insultos dos adeptos rivais... mas continuou a marcar pontos e a conseguir vitórias até que as nuvens se dissipassem.

Com a camisola dos Lakers conseguiu ainda mais dois anéis de campeão, em 2009 e 2010. Estava no auge da sua carreira, que foi coroada ainda com duas medalhas de ouro nos Jogos Olímpicos pelos Estados Unidos em Pequim 2008 e em Londres 2012.

O início do fim da sua carreira aconteceu em 2013, quando sofreu uma rotura do tendão de Aquiles, que o obrigou a uma paragem de oito meses, mas a alegria do regresso não durou muito, porque acabou por sofrer uma fratura num joelho. Foram mais três meses de baixa. Apesar de atormentado pelas lesões, Kobe Bryant conseguiu superar o número de pontos de Michael Jordan a 14 de dezembro de 2014, tornando-se o terceiro melhor marcador, estatuto que teve até à madrugada do último domingo, horas antes da sua morte, quando foi suplantado por LeBron James.

"A coisa mais próxima de Michael Jordan"

O desporto perde aquele que foi considerado pela grande maioria dos jogadores da NBA como o melhor basquetebolista do pós-Michael Jordan. "Kobe é a coisa mais próxima de Michael Jordan que já vimos. Era impossível pará-lo. A sua determinação para ganhar era incrível e esforçava-se como nenhum outro", disse a outra lenda dos Lakers, Magic Johnson, no dia da retirada de Bryant.

Os números mostram bem a importância deste mágico dos cestos, pois além dos cinco anéis de campeão da NBA foi considerado o melhor jogador da fase regular em 2007-08 e das finais em 2009 e 2010, foi o melhor marcador do campeonato em 2005-06 (média de 35,4 pontos por jogo) e 2006-07 (31,6). Esteve 18 vezes no All Star Game, tendo sido em quatro edições o MVP (jogador mais valioso). Foram muitos os adjetivos que serviram para definir Kobe Bryant, mas o mais utilizado no inquérito feito pelo Los Angeles Times no dia da sua retirada foi "decisivo".

"Não estou triste, estou grato. Não deixei pedra sobre pedra. Ao longo de 20 anos na NBA, e desde muito antes disso, dei tudo por este jogo. Fico grato por tê-lo jogado por tanto tempo", disse Kobe Bryant na noite da sua despedida. Hoje, partiu para sempre, mas deixa uma marca muito forte na história do jogo que fará que seja recordado como uma lenda.

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