Numa sala de cinema em Glasgow, um "tribunal popular" foi improvisado esta manhã para julgar a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC) pelo fracasso em travar o aquecimento global..Os queixosos são "os cidadãos e a natureza", que acusam os governos que subscreveram o Acordo de Paris de se terem comprometido com "metas, mecanismos e soluções falsos que estão a falhar em parar as alterações climáticas". .O julgamento é simulado, um exercício promovido por uma miríade de organizações ativistas de países da América Latina, Sudoeste Asiático, África ou Europa, mas segue o protocolo a audiência de dezenas de pessoas levanta-se quando entra o juiz, que inicia a audiência com o bater do martelo. .O evento, um dos primeiros da cimeira alternativa à COP26, reflete a frustração dos ativistas perante a falta de impacto dos planos para reduzir emissões de gases com efeito de estufa com os líderes políticos reunidos na 26.ª conferência do clima das Nações Unidas, a algumas centenas de metros. .Na lista de denúncias estão o fracasso em combater as causas originais das alterações climáticas, debelar as injustiças sociais e económicas mundiais, a falta de acordo em juntar financiamento para o clima apropriado e incapacidade em regulamentar a atividade das empresas ou em reconhecer os direitos da natureza. .O procurador público fictício, Pablo Solomon, antigo negociador-chefe da Bolívia nas questões ambientais, apresentou gráficos e quadros com dados para comprovar o impacto do aquecimento global e o risco para o planeta.."Se continuarmos assim vamos certamente falhar - nós já estamos a falhar", lamenta o antigo diplomata, reivindicando a necessidade de "mudar o rumo das atuais negociações". .A UNFCCC é "cúmplice", diz um dos intervenientes, enquanto outro questiona a privatização das tecnologias e transportes públicos e os "abusos" das companhias que exploram os combustíveis fósseis. .Dorothy Guerrero, do grupo Global Justice Now, explicou que este tipo de tribunais populares é uma tradição que remonta aos anos 1970 na América Latina. ."Quando não existia um local ou instituição para realizar o processo e ouvir as vozes das vítimas dos abusos de ditaduras militares, fazíamos estes julgamentos populares", contou. .O evento de hoje faz parte da Cimeira dos Povos pela Justiça Climática organizada pela Coligação COP26, que quer amplificar as "vozes mais marginalizadas, daqueles que estão a ser mais afetados pelas alterações climáticas e daqueles que estão a resistir e a agir para fazer a diferença". ."Depois de uma semana de propaganda ecológica, retórica e falsas soluções da Conferência do Clima da ONU, a Cimeira dos Povos é a ocasião para o movimento se unir e encontrar soluções justas para a crise climática", disse a coordenadora, Jana Ahlers. .O programa com mais de 200 sessoes ao longo de quatro dias integra desde 'workshops' sobre como processar empresas internacionais de combustíveis fósseis ou cultivar cogumelos na compostagem a exposições e projeções de filmes. .Os intervenientes incluem ativistas locais, sindicatos, jovens ambientalistas ou ativistas anti-racismo, mas também povos indígenas que estão a lutar para reaver o controlo das suas terras e florestas antigas na Columbia Britânica, nativos de ilhas do Pacífico que se opõem à extração de minérios em alto-mar ou representantes do povo Saarauí, que lutam contra a apropriação de terras no Saara Ocidental..O evento acontece um dia depois de dezenas de milhar de pessoas terem marchado pelas ruas de Glasgow para pedir ação climática..Decisores políticos e milhares de especialistas e ativistas reúnem-se até sexta-feira na COP26 para atualizar os contributos dos países para a redução das emissões de gases com efeito de estufa até 2030 e aumentar o financiamento para ajudar países afetados a enfrentar a crise climática..A COP26 decorre seis anos após o Acordo de Paris, que estabeleceu como meta limitar o aumento da temperatura média global do planeta entre 1,5 e 2 graus celsius acima dos valores da época pré-industrial..Apesar dos compromissos assumidos, as concentrações de gases com efeito de estufa atingiram níveis recorde em 2020, mesmo com a desaceleração económica provocada pela pandemia de covid-19, segundo a ONU, que estima que ao atual ritmo de emissões, as temperaturas serão no final do século superiores em 2,7 ºC.