Jovens, não façam noitadas a estudar. Pais, acalmem-se

Começa esta segunda feira a época de exames para mais de 260 mil alunos. Especialistas aconselham pais a controlar a ansiedade
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É ao som de música clássica que encontramos Sofia Santos a estudar Português. Não ouve canções com letra, porque começa logo a cantar "e torna-se complicado". Só no dia do exame. Amanhã, vai acordar bem cedo, toma o pequeno-almoço, põe música e canta. É uma forma de se "acalmar e reduzir o stress". Depois segue para a Escola Secundária Dr. João Carlos Celestino Gomes, em Ílhavo, onde vai fazer o exame nacional de Português do 12.º ano. Espera chegar às 08.30, uma hora antes da prova.

No dia seguinte, Sofia regressa às maratonas de estudo, porque ainda terá de fazer o exame de Matemática, no dia 23, e a melhoria de Biologia, a 26. Estuda sempre no quarto, mas consegue nunca ceder à tentação de ligar o enorme plasma que tem em frente à cama. À volta da secretária de paletes feita pelo avô, dezenas de frases inspiradoras que reuniu ao longo dos últimos três anos. Em cima, o portátil, muitos livros, apontamentos, um alperce e tortilhas de milho para o intervalo.

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Sofia tem média de 17,5 valores, mas ainda não está certa quanto ao curso que pretende. "Talvez Biologia, para seguir investigação." E essa é precisamente a disciplina que tem estudado menos. Nas últimas semanas, tentou alternar o estudo das três cadeiras, sempre com base nos exercícios, pois nunca teve o hábito de fazer resumos. "Mas confesso que estive mais focada no Português, porque é o primeiro exame." Segundo Manuela Matos Monteiro, autora de vários livros de pedagogia e psicologia, a tendência da maioria dos alunos é estudar mais para o primeiro exame. Assim, destaca, "é importante fazer um horário de tarefas, que permitirá dividir melhor o tempo". Além disso, não esquecer as pausas, mas também não as estender demasiado. "Se estiveram uma hora a estudar, podem fazer um intervalo de dez a 15 minutos. Até podem usar o alarme do telemóvel, para não exceder esse tempo", sugere a autora da coleção "Sucesso Escolar".

Noitadas nunca

Como sente muita necessidade de descansar, Sofia nunca estuda depois das 22.30: "É à noite que me concentro melhor, mas, se acordar com sono, não tenho tanta vontade de estudar. Às 23.00, no máximo, já estou a dormir." Já Raquel Maio, de 17 anos, prefere o horário noturno. Como passa a manhã e a tarde entre o apoio na escola e as explicações, acaba por ficar agarrada aos livros até mais tarde. "Quando começo a ficar cansada e o estudo não é produtivo, paro. Duas e meia da manhã é a hora-limite", conta.

As duas finalistas têm, no entanto, colegas que ficam a estudar pela noite dentro. "Tentam colmatar o stress com uma overdose de trabalho, mas isso não adianta nada", frisa Manuela Matos Monteiro. Segundo a docente de Psicologia, é preciso ter "um sono regular", ou seja, deitar e levantar "relativamente cedo", caso contrário "vão para os exames com as suas capacidades intelectuais perturbadas".

Raquel vai fazer exames de Português e Matemática do 12.º ano e de Biologia e Físico-Química do 11.º. "Para já, estou mais focada na Matemática, porque estou como aluna externa e, além disso, a matéria vai mudar no próximo ano. Se conseguir fazer na 1.ª fase, depois foco-me nas outras disciplinas." Tem o hábito de fazer resumos, a partir dos quais elabora esquemas, uma forma de "interiorizar a matéria". Por muito que estude, esta é uma altura de grande ansiedade. "É muita pressão. Queremos sempre tirar a melhor nota possível", refere.

Stress, pressão, nervos

Muitos estudantes passaram as últimas semanas fechados em quartos, salas de estudo, bibliotecas. Não há espaço para diversão. Os exames nacionais são sinónimo de stress, pressão, nervosismo. "Há um aumento assustador de alunos com níveis de ansiedade elevados, problemas de sono e alimentares", alerta Helena Marujo, professora do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, destacando que "há uma pressão exagerada para o sucesso". Essa ansiedade "bloqueia, limita a capacidade de pensar", conduzindo a "baixas performances". Em casos extremos, diz Manuela Matos Monteiro, pode mesmo ser necessário levar os estudantes ao médico.

Como se já não bastasse o stress dos alunos, toda a família sofre. "Os exames são eventos com uma grande carga emocional, que afetam alunos, professores e famílias. Os pais são um elemento central, mas por vezes não fazem o acompanhamento que deviam ao longo do ano e na altura dos exames criam uma ansiedade acrescida. Vemos pais, irmãos, padrinhos a descarregar toda a ansiedade nos alunos", crítica Manuela Matos Monteiro. Segundo a especialista, "esta não é altura para cobrar e estar constantemente a culpabilizar o aluno porque não estudou ao longo do ano. Um silêncio afetuoso é o melhor conselho". E também não é o momento para os pais falarem "dos seus casos exemplares". "Não tem efeito nenhum."

Vidas que dependem dos exames

Mafalda Oliveira, 18 anos, não tem razão de queixa dos pais. "São muito compreensivos. Já sabem a pressão que ponho em cima de mim própria, não metem mais", conta ao DN. Desde os 2 anos que quer ser médica veterinária, por isso assusta-a a "possibilidade de falhar devido aos nervos" e de não entrar no curso em que sempre sonhou.

Por estes dias, a finalista do 12.º ano, que repetiu o 11.º por opção, só pensa em estudar. Não há tempo nem cabeça para ter vida social. "A pressão é muito grande." Está com média de 15 valores, sem a nota dos exames, e a média do curso é de 15,7. Vai realizar provas de Português e Matemática, do 12.º ano, e Físico-Química e Biologia do 11.º. Esta última é a que mais a assusta. "Tenho de usar mnemónicas", adianta. Sente-se preparada. "Mas o nervosismo e o stress aumentam, o que por vezes me faz sentir que não estou", desabafa.

Helena Marujo lembra aos estudantes que, "quanto mais stress e tensão, mais é necessário fazer coisas que tragam emoções positivas, endorfinas e bem-estar". Um pensamento partilhado por Sofia Santos, que todos os dias caminha meia hora e ainda participa nas marchas.

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