"Não aceito prescindir do direito à expressão da opinião e palavra"

António Costa aceitou pedido de demissão de João Soares. "Respeito e compreendo a avaliação que João Soares fez"
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O ministro da Cultura, João Soares, apresentou hoje ao primeiro-ministro, António Costa, a demissão das suas funções no Governo, invocando razões de solidariedade com o executivo. Falando aos jornalistas no Porto, António Costa confirmou que aceitou "naturalmente" a demissão de Soares. "Respeito e compreendo a avaliação", acrescentou. "As coisas são como são", referiu, agradecendo ainda o empenho, energia e colaboração do ex-ministro da Cultura.

António Costa sublinhou que "nos próximos dias" vai entregar ao Presidente da República "o nome de uma personalidade que substitua João Soares", sem esclarecer se já tem alguém pensado para o cargo.

"Torno público que apresentei esta manhã ao senhor primeiro-ministro, António Costa, a minha demissão do XXI Governo Constitucional. Faço-o por razões que têm a ver com a minha profunda solidariedade com o Governo e o primeiro-ministro, e o seu projeto político de esquerda", salienta João Soares no comunicado enviado à agência Lusa.

No mesmo comunicado, João Soares sublinha "o privilégio que representou" para ter integrado este Governo. "E ter trabalhado com o primeiro-ministro, a quem agradeço a confiança. Demito-me também por razões que têm a ver com o meu respeito pelos valores da liberdade. Não aceito prescindir do direito à expressão da opinião e palavra", acrescenta.

Os dois comentadores a quem o ministro da Cultura, João Soares, prometeu "bofetadas" na rede social Facebook, consideraram que a demissão do governante foi a decisão certa. À agência Lusa, Augusto M. Seabra disse ter recebido a notícia da demissão "com alguma surpresa", mas considerou que foi "a mais saudável" e "a melhor do ponto de vista ético".

Por seu turno, Vasco Pulido Valente disse à Lusa que esta decisão do ministro da Cultura "não foi uma surpresa" porque considera que João Soares "não tinha outra saída".

PSD quer ouvir Soares no parlamento

Na manhã desta sexta-feira, o PSD apresentou um requerimento para que João Soares fosse ouvido na Assembleia da República. A bancada social-democrata explicava no documento, dirigido à presidente da Comissão de Cultura Comunicação, Juventude e Desporto, a socialista Edite Estrela, que as afirmações do ministro da Cultura são "graves e inqualificáveis", traduzindo "uma enorme falta de respeito pela liberdade de expressão". Pedro Pimpão reforçou a justificação da chamada do governante ao Parlamento dizendo que existia uma "agravante" no episódio, já que João Soares tutela a comunicação social.

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Como tal, os sociais-democratas solicitam que também o conselho regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) e Bárbara Reis, diretora do jornal Público - onde escrevem os dois colunistas visados pelo ministro, António M. Seabra e Vasco Pulido Valente -, sejam ouvidos com o intuito de avaliar se existem ou não riscos futuros "condicionamento da liberdade de expressão".

A reprimenda de Costa

O primeiro-ministro deu ontem uma violenta reprimenda ao ministro da Cultura, depois deste ter prometido distribuir umas "salutares bofetadas" a dois colunistas do jornal Público. António Costa obrigou mesmo João Soares a retratar-se publicamente.

À entrada para o Teatro da Comuna, para assistir à estreia da peça "O Último dos Românticos", Costa foi perentório: "Já recordei aos membros do Governo que, enquanto membros do Governo, nem à mesa do café podem deixar de se lembrar que são membros do Governo".

Não quis esclarecer se mantinha a confiança no ministro que escolheu para pasta da Cultura, mas garantiu que "este caso não traduz a forma como este Governo se quer relacionar com os agentes da cultura". E fez questão de dizer que já tinha apresentado ele próprio as desculpas a Augusto M. Seabra e a Vasco Pulido Valente, os dois visados pelas palavras de João Soares.

Quase de seguida, o ministro fazia chegar um comunicado à agência Lusa, onde se retratava pela mensagem que colocou no Facebook sobre os dois colunistas. "A minha intenção não foi ofender. Se ofendi alguém peço desculpa". Na mesma nota, João Soares diz que reagiu a um "ataque pessoal insultuoso, com uma figura de estilo de tradições queirosianas".

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