Israel e Palestina em 'Oslo': a paz ali tão perto 

Uma peça de teatro sobre os Acordos de Paz de Oslo adaptada ao pequeno ecrã, com Steven Spielberg entre os produtores executivos. <em>Oslo </em>chega à HBO numa altura mais oportuna do que se poderia esperar.
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É já quase no final do filme, quando surgem as imagens documentais do aperto de mão entre Yasser Arafat, presidente da Organização de Libertação da Palestina, e Yitzhak Rabin, primeiro-ministro de Israel, enquadrados pelos braços abertos de Bill Clinton a "aconchegar" o simbolismo do gesto dos dois líderes, que se sente o peso emocional de uma grande oportunidade perdida. A esse momento histórico de 1993, em que os antigos adversários reconheceram a legitimidade um do outro, seguiu-se, dois anos depois, o assassinato de Rabin por um extremista israelita, e em 2000 uma nova onda de violência com a Segunda Intifada. Conhecer agora, ainda no rescaldo dos confrontos e ataques em Israel e Gaza, a história de bastidores do que levou a esse aperto de mão deixa um sabor amargo.

Oslo, peça de 2016 do dramaturgo J.T. Rogers, vencedora do Tony, é um sucesso da Broadway levado ao ecrã pelo próprio encenador Bartlett Sher. Neste filme em estreia na HBO expõe-se o processo de negociações secretas entre Israel e Palestina - os chamados "acordos de Oslo" - organizadas em 1993, ao longo de nove meses, pelo casal de diplomatas noruegueses Mona Juul e Terje Rød-Larsen (Ruth Wilson e Andrew Scott nos respetivos papéis).

Para sair do registo teatral, Sher introduziu uns flashbacks com Mona e Terje em Gaza, no meio da poeira da destruição causada por bombas, tiroteios e pedradas, em que ela testemunha o confronto olhos nos olhos entre um soldado israelita e um jovem civil palestiniano, ambos paralisados pela consciência momentânea dos seus atos. É pegando nessa memória que o filme justifica tudo o que nele, no fim de contas, se confina ao modelo do teatro: as discussões atrás da porta que acabaram por sarar temporariamente mágoas e perspetivas diferentes, tal como aqueles rapazes iluminados, por instantes, no calor do conflito.

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Na génese do secretismo das conversas entre as duas partes está a crença na interação humana liberta do espartilho que define os encontros oficiais. Daí que a operação de Mona e Terje tenha sido especialmente cuidadosa nos detalhes: não só lhes importava que não houvesse interferências exteriores (inclusive deles próprios, responsáveis pela dinâmica), como criaram o ambiente propício à confraternização, gerida com pinças, para que o diálogo decorresse na base mais espontânea possível, dentro de uma mansão a 90 km de Oslo. Por sinal, uma hospedagem que a dada altura se torna o foco do filme, com a gastronomia a servir de ponto reconciliador para qualquer discussão mais acesa.

À superficialidade quase benigna do primeiro encontro, em que as negociações são feitas com dois professores de economia israelitas, inaptos para a seriedade do contexto, segue-se uma segunda reunião na mesma casa já com uma figura oficial da parte de Israel, Uri Savir, diretor-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros. É então que Oslo põe verdadeiramente a chave na ignição e assume a complexidade das questões no centro do conflito israelo-palestiniano, convertendo uma sala e uma mesa no terreno de batalha onde as palavras são armas, ora apontadas ora depostas.

As três horas de duração da peça de J.T. Rogers, aqui reduzidas a quase duas, pode explicar porque é que Oslo, o filme, parece não concretizar em pleno a tensão que terá marcado o processo de entendimento entre os dois lados hostis. Mas há uma justeza de tonalidade visual, mérito do diretor de fotografia Janusz Kaminski (colaborador regular de Steven Spielberg, também ele entre os produtores do filme), que respeita a "temperatura" das manobras secretas e a paixão contida com que os facilitadores Mona e Terje lidaram, pela vertente humana, com um assunto da mais elevada natureza política.

dnot@dn.pt

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