Inspecção impedida de punir no privado

Oito meses depois de ter ganho competências para fiscalizar o sector privado e social da saúde, a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde ainda não conta com um regime de coimas para punir as unidades e os profissionais que ali trabalham. A tutela garante que esse facto "não a impede" de actuar.
Publicado a

Em Julho do ano passado, a Inspecção -Geral das Actividades em Saúde (IGAS) ganhou novas competências, entre elas a de fiscalizar o sector privado.
Mas oito meses depois ainda não tem um quadro legal que lhe permita aplicar sanções nesta área.

Já pode investigar e fiscalizar, mas continua sem poder multar nem punir infracções de médicos e unidades que estejam fora do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Nas unidades que prestam cuidados no SNS, a IGAS pode punir disciplinarmente os profissionais e até fechar serviços. No privado, ainda não tem instrumentos próprios. E tem que recorrer a outros organismos.

 Questionado pelo DN, o Ministério da Saúde confirma que não há, de facto, um regime sancionatório, porque está ainda a ser trabalhado. Contudo, garante que esta situação "não está a restringir a actuação da IGAS". O organismo está já a actuar nas unidades que prestam cuidados de saúde no sector privado ou social (sem fins lucrativos), dando a tutela como exemplo o processo de investigação aberto a propósito das duas clínicas de aborto que funcionam à margem da lei.

E, tal como noticiou ontem o DN, um deles acabou por ser remetido para o Ministério Público, por se ter encontrado indícios da prática do crime de aborto. Além disso, mesmo sem regulamentação, o plano de actividades para este ano integra acções neste sector, algumas delas já a decorrer.


E no caso de serem encontradas irregularidades? De acordo com o Ministério, "de cada vez que há uma acção, os casos são remetidos para as autoridades competentes, como o Ministério Público, a Ordem dos Médicos ou a Entidade Reguladora da Saúde". E se se encontrar, por exemplo, irregularidades num serviço privado que tem convenções com o Estado, pode pedir às Administrações Regionais de Saúde para que revejam ou terminem esse acordo. Mas apenas quando as irregularidades caírem nas competências destes organismos.


A porta-voz do Ministério admite que "um regime de sanções reforça a acção da IGAS e, por isso, é que se entendeu que ele devia existir", mas refere que a sua actividade não fica a descoberto. Multas também no público O regime de coimas na saúde que sairá desta regulamentação terá uma inovação: vai definir sanções também para os serviços públicos, numa modalidade semelhante à que existirá para os privados e sociais. Desta forma, os hospitais e centros de saúde do SNS podem vir a pagar multas sempre que haja irregularidades.


O projecto de regulamentação da lei está a ser realizado pela própria IGAS. A justificação para que este processo esteja a demorar tanto tempo passa pela necessidade de articular com os outros organismos o regime de sanções. A IGAS absorveu competências que antes estavam atribuídas a outras entidades, como é o caso dos licenciamentos que estavam com a Direcção-Geral da Saúde. E é com estes outros organismos que está a ser pensado o novo regime de coimas.

O Ministério diz que não há vazio legal e que o processo está a decorrer dentro dos prazos, já que o PRACE (Programa de Reforma da Administração Central do Estado), que lhe deu origem, também ainda não está concluído. São várias as situações que podem ser investigadas nas unidades que estão fora do Serviço Nacional de Saúde.


Desde a qualidade da prestação de cuidados, a eventuais erros ou negligência médica, à cobrança indevida de verbas aos doentes ou à prescrição de medicamentos. Além disso, abre-se a possibilidade de cruzar informações entre o público e o privado, como no caso dos médicos em regime de exclusividade na função pública que têm consultório.

Recorde-se que, até aqui, o sector privado e social da saúde estava à margem do controlo e fiscalização que se aplica ao público, com lacunas a começar logo no licenciamento.

Diário de Notícias
www.dn.pt