Três aviões Canadair parados por falha mecânica e inspeção. MAI admite necessidade de ajustamentos

O incêndio que começou no sábado na localidade de Garrocho, no concelho da Covilhã, e que se estendeu a Manteigas, Gouveia e Guarda, mantém-se ativo. "O perímetro é significativo e o vento pode causar algumas adversidades", refere a Proteção Civil.
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O segundo-comandante nacional da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) disse esta quinta-feira que os três Canadair estiveram inoperacionais na quarta-feira, um por avaria mecânica e os outros dois devido a inspeção devido às horas de voo. O Ministério da Administração Interna (MAI) reconheceu, entretanto, que foram identificadas situações que "poderão necessitar de ajustamentos, e que estão já a ser objeto de avaliação".

Questionado pela Lusa sobre a inoperacionalidade dos dois Canadair (aviões anfíbios construídos especificamente para combate a incêndios), Miguel Cruz explicou que hoje "está um operacional e a operar".

"Tivemos efetivamente ontem [quarta-feira] uma inoperatividade destas duas aeronaves, sendo que o que está consagrado contratualmente é que a terceira aeronave substitui uma delas. Naturalmente temos que contar que as máquinas também falham e também tem que ter processos de revisão. Foi o que aconteceu com esta terceira aeronave, que teve um processo de revisão de 50 horas de voo. É algo que tem que forçosamente acontecer", sustentou.

O segundo-comandante nacional sublinhou ainda que existe um conjunto de outros meios aéreos que complementam o trabalho dos Canadair e que estão no teatro de operações.

"Não é o facto de ter estas aeronaves [Canadair] temporariamente inoperativas que possa criar aqui uma situação mais complicada ou de mais fácil resolução", frisou.

O incêndio que começou no sábado na localidade de Garrocho (Covilhã) e que se estendeu a três municípios do distrito da Guarda (Manteigas, Gouveia e Guarda) mantém-se ativo, apesar de ter tido uma evolução favorável durante a noite.

"Estamos cautelosos. Há ainda muito trabalho a fazer de consolidação. O perímetro é significativo e o vento pode causar algumas adversidades", afirmou Miguel Cruz.

Este responsável falava durante uma conferência de imprensa, realizada na Junta de Freguesia de Valhelhas (concelho da Guarda), sobre o incêndio que começou na Covilhã (distrito de Castelo Branco) e que afetou também Manteigas, Gouveia e Guarda.

"O incêndio mantém-se ativo, apesar de ter tido uma evolução favorável face ao dia anterior [quarta-feira], fruto do trabalho desenvolvido ao longo da noite. Aproveitaram-se as oportunidades que a noite permitiu, como variação da temperatura, humidade e vento", sublinhou.

O Ministério da Administração Interna (MAI) informou, entretanto, que foram identificadas no combate ao incêndio na Serra da Estrela situações que do ponto de vista operacional podem necessitar de ajustamentos e que já estão a ser avaliadas.

O MAI indica em comunicado que a secretária de Estado da Proteção Civil, Patrícia Gaspar, se reuniu na quarta-feira e hoje, por videoconferência, com os presidentes das Câmaras Municipais da Covilhã, de Gouveia, da Guarda e de Manteigas, para acompanhar o incêndio que começou no sábado em Garrocho, na Covilhã.

"Nos encontros de ontem [quarta-feira] e hoje foram identificadas situações que, do ponto de vista operacional e dadas as características do incêndio, poderão necessitar de ajustamentos, e que estão já a ser objeto de avaliação", refere o comunicado.

Nas reuniões estiveram presentes responsáveis da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) que explicaram as dificuldades identificadas ao nível da orografia da região, condições meteorológicas expectáveis e os meios empenhados.

O Governo e a ANEPC voltam a reunir-se com os autarcas na sexta-feira às 09:00, adianta o comunicado.

Na nota, o Ministério refere que "a complexidade deste incêndio desencadeou uma mobilização de meios excecional".

No comunicado, divulgado pelas 12:30, o Ministério referia a presença de mais de 1.500 operacionais, apoiados por 465 veículos, 14 meios aéreos e 16 máquinas de rasto.

O MAI indica ainda que "em função das regras previstas no Sistema de Gestão de Operações, e considerando o número de meios já envolvido, o comando da operação está a ser assegurado pelo 2.º Comandante Nacional da ANEPC, Miguel Cruz".

Através da ANEPC, o Governo transmitiu aos autarcas e a todos os operacionais uma mensagem de apoio às operações de socorro, indica o comunicado.

Ainda na conferência de imprensa sobre o incêndio que começou há seis dias na Covilhã , o segundo-comandante operacional da ANEPC realçou "algumas preocupações no triângulo posicionado entre Manteigas, Vale da Amoreira e Folgosinho. É aqui que estamos a insistir com maior intensidade", salientou.

Já sobre o número de operacionais no terreno (cerca de 1.500), Miguel Cruz disse que não é normal ter um número tão significativo.

"Normalmente não costumamos ter. Penso que já terá havido outros [números de operacionais] idênticos ou até superiores", salientou.

Quanto à área ardida até ao momento, que se estima em cerca de 10 mil hectares até quarta-feira, Miguel Cruz salientou que é um "valor provisório", e que será confirmado pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.

Para já, o segundo-comandante nacional da ANEPC não prevê a desmobilização de meios do teatro de operações.

"Não vai haver desmobilizações de operacionais. O dispositivo instalado será o adequado. Pode haver alguns ajustes", concluiu.

O presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses (LBP) defendeu, entretanto, que devem ser os bombeiros a tomar conta do combate inicial aos incêndios, com poder de decisão sobre o uso de todos os meios necessários, inclusive os aéreos.

António Nunes disse à Lusa que, desta forma, as janelas de oportunidade que aparecem para debelar os fogos poderão ser mais bem aproveitadas, "sem se perder tempo a aguardar decisões das diversas entidades que intervêm no combate ao fogo".

"Os bombeiros têm que ter um comando nacional de bombeiros, que tem de ser responsabilizado por tudo o que é combate a incêndios, sejam urbanos, florestais, rurais ou em indústria, para se saber quem são os responsáveis. E, depois, deixar à proteção civil um patamar superior, que é o da coordenação", defendeu António Nunes.

No caso do incêndio na Serra da Estrela, o presidente da LBP insistiu que "o foco dos bombeiros seria fazer o combate ao incêndio e deviam ser eles a decidir tudo. Não podemos querer utilizar uma máquina de rasto e, para isso, [ser necessário] ter o parecer do ICNF [Instituto da Conservação da Natureza e Florestas]".

"Depois, as pequenas janelas de oportunidade que existem, que duram uma hora ou duas horas, como uma rodagem de vento, uma humidade relativa mais alta, e que são a oportunidade de utilização do meio aéreo perde-se e quando se perde ardem mais dois, três ou quatro mil hectares", sublinhou.

António Nunes disse que Portugal não tem tido um elevado numero de incêndios, mas salientou que o numero de grandes incêndios é maior, insistindo: "O que é que isto quer dizer? Que não temos respondido adequadamente e que, portanto, temos de apurar responsabilidades e, neste momento, a responsabilidade é da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, porque não adequou o dispositivo às condições climáticas que eram expectáveis".

"Se temos menos incêndios é porque temos mais capacidade de ataque, se eles estão a escapar é porque a gestão do fogo não está a ser bem feita", acrescentou.

António Nunes defende ainda que a técnica de combate inicial do incêndio "não pode ser a mesma de há dois ou três anos atrás, porque as alterações climáticas obrigam a uma maior intervenção, mais musculada, no primeiro ataque".

"Se ele [o fogo] escapa à primeira hora, temos situações como esta", disse, referindo-se ao incêndio que lavra desde sábado na Serra da Estrela.

O presidente da LBP considerou que a estrutura de comando não está organizada e insistiu que "não e fácil gerir 1.500 homens ao mesmo tempo".

"Há muitas ineficiências que devem estar a acontecer e os autarcas estão a protestar, e bem. Nem o exército mobiliza 1.500 homens com uma estrutura como esta, que não está organizada", afirmou.

António Nunes defendeu ainda que "cada entidade deve estar focada no que deve fazer" e que o ICNF não se deve focar no combate: "Esqueçam importar coisas que vêm dos EUA, ou do Canadá, ou do Chile. O nosso tipo de floresta não é igual. O nosso povoamento e a dispersão das casas pela floresta não é igual".

"Nós não nos podemos dar ao luxo de perder 1.000 ou 2.000 hectares, como se pode fazer nos EUA que, quando tem um fogo grande, ardem 50.000 ou 60.000 hectares isso é praticamente o que arde aqui num ano", considera.

O responsável da LBP apontou a falta de aceiros e de caminhos na Serra da Estrela e disse que "o ICNF devia ser responsabilizado por tudo o que é a preparação da floresta e dos espaços rurais para o incêndio, a GNR pela vigilância e os bombeiros pelo combate".

António Nunes reconheceu que Portugal, desde 2017, "melhorou muito" na avaliação de risco e mobilizou bem as populações, que o Governo esteve bem nos meios dados para combate aos incêndios, mas sublinha que "a técnica e a metodologia não é a melhor".

Cerca de 10.000 hectares arderam até hoje na Serra da Estrela, onde desde sábado lavra o incêndio que começou na Covilhã, segundo o sistema de vigilância europeu Copernicus.

De acordo com a informação disponível no Copernicus, até quarta-feira tinham ardido 9.532 hectares na região da Serra da Estrela.

Na terça-feira, o vice-presidente da Câmara da Covilhã tinha dito que o incêndio que deflagrou no sábado em Garrocho (Covilhã) já tinha consumido cerca de três mil hectares de floresta e mato no concelho.

Segundo a informação provisória recolhida até hoje e disponível no 'site' do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), já arderam este ano 74.304 hectares em espaços rurais, sendo que metade são povoamentos florestais, 41% representa área ardida de mato e 9% área agrícola.

No total, segundo a mesma fonte, este ano já foram registadas 8.184 ocorrências.

No início da semana, o último relatório do ICNF, que não incluía o incêndio que deflagrou no sábado na Covilhã, indicava um total de 58.354 hectares de área ardida até 31 de julho.

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