Hospital Lisboa Oriental tinha Estado como fiador

A proposta que venceu o concurso para construção do Hospital de Lisboa Oriental, e que o Governo vai anular, apresentava o Estado como fiador e teve regras alteradas depois do concurso ser lançado, segundo o presidente da comissão avaliadora.
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Em entrevista à agência Lusa, o antigo ministro da Saúde Luís Filipe Pereira, que preside à comissão que avaliou o projeto do futuro Hospital de Lisboa Oriental, revelou as razões que levaram estes especialistas a recomendar a Paulo Macedo a anulação do concurso.

"Dissemos duas coisas [ao ministro da Saúde]: Este procedimento concursal não podia prosseguir. Aconselhámos portanto o Governo a não adjudicar, mas também que este projeto continua a fazer sentido do ponto de vista estratégico e do ponto de vista económico-financeiro".

Contribuiu para a recomendação de não adjudicação o facto do consórcio vencedor (Solveo) prever, na sua proposta, uma participação do Banco Europeu de Investimento (BEI) superior a 41 por cento.

Mas esta participação pressupunha uma garantia do Estado. "Na prática, significa que o BEI empresta o dinheiro, desde que o Estado dê uma garantia de que se o consórcio não pagar, paga o Estado", disse.

Luís Filipe Pereira, e a comissão a que presidiu, é contra esta fiança do Estado, para um valor na ordem dos 120 a 130 milhões de euros.

"Se o Estado tem de dar uma fiança a uma parte importante do financiamento, o Estado não está a transferir riscos [que é uma vantagem das Parceiras Público Privadas, como é o caso deste hospital]", adiantou.

Desta forma, o Estado estaria a "transferir para um privado a construção, mas na porta de trás assumiria o risco financeiro", o que, na opinião destes especialistas, "não era aceitável".

"Falámos com o poder político e ele disse que isto não ia ser assim, que o Estado não ia dar uma fiança", adiantou.

"Na opinião da comissão, o Governo não deveria ter aceite" esta condição, a qual "teve efeitos práticos concretos: baixou fortemente o custo financeiro (juros)".

Segundo Luís Filipe Pereira, a fiança do Estado representou uma vantagem de 17 a 19 milhões de euros. Uma vez que a proposta aprovada passa apenas 130 mil euros do Custo Público Comparado (CPC) - um cálculo do valor que o Estado pagaria se desenvolvesse este projeto em vez dos privados -, tal significa que se fosse levada em conta o financiamento do BEI, passava por cima do CPC.

"Concluímos que [a proposta] não era vantajosa em nada", disse.

A comissão encontrou ainda outro aspeto determinante: "O CPC foi alterado já depois de lançado o concurso e foi alterado depois da emissão do relatório final de seleção (2010), antes da negociação dos dois concorrentes", o que poderia levar o Tribunal de Contas a não dar o visto.

Luís Filipe Pereira disse que, informalmente, contactou o BEI e que este foi "perentório" ao afirmar que não emprestaria o dinheiro sem a fiança do Estado.

Sobre a construção do novo hospital, a comissão defende que este projeto "continua a fazer sentido do ponto de vista estratégico e do ponto de vista económico-financeiro".

"Este projeto, devido a uma maior eficiência e às poupanças que gera, paga-se em três anos", disse, lembrando que o valor da sua construção e equipamentos ronda os 380 milhões de euros.

"Este concurso não. Mas construir o hospital sim, é urgente. Agora compete ao Governo decidir sob que forma: empreitada direta, PPP ou outra forma".

Sobre a possibilidade do consórcio solicitar uma indemnização após a anulação do concurso, Luís Filipe Pereira disse que tal é possível.

"É possível que o consórcio possa vir a pôr uma ação ao Estado pelo facto de ter arrastado o processo quatro a cinco anos. Poderá ser expectável", disse.

Porém, ressalvou, "é preciso destrinçar dois aspetos: uma coisa é o interesse do concorrente que gastou dinheiro nisto e outro é o interesse público".

O futuro Hospital de Lisboa Oriental deverá abrir em 2016, e prevê-se que receba serviços dos Hospitais de São José, Santa Marta, Curry Cabral, Estefânia, Capuchos e Maternidade Alfredo da Costa.

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