Hong Kong: Pró-democratas garantem vitória esmagadora nas eleições distritais
Os candidatos pró-democratas, até às 09:00 (01:00 em Lisboa) alcançaram pelo menos 390 assentos dos 452 em jogo, numa eleição com uma participação recorde de 71,2% que demonstrou o forte apoio para as organizações que mobilizaram os protestos que levaram à rua milhões de pessoas em Hong Kong desde junho.
Nas últimas eleições, em 2015, o campo pró-Pequim tinha obtido quase dois terços dos assentos nos conselhos distritais. Agora, os pró-Pequim perderam mais de 240 assentos, em comparação com 2015.
Segundo o jornal South China Morning Post, os pró-democratas venceram 17 dos 18 conselhos distritais, todos anteriormente sob controlo das forças pró-governamentais.
Os dados preliminares oficiais, quando falta apenas conhecer os vencedores de 58 dos 452 lugares em disputa dão conta da conquista de 344 lugares pelos pró-democratas.
A líder de Hong Kong, Carrie Lam, disse hoje que vai ouvir com "humildade e seriedade" a sociedade depois da esmagadora vitória dos candidatos pró-democracia nas eleições de domingo sobre o campo pró-Pequim.
"O Governo de Hong Kong vai ouvir as opiniões dos membros do público com humildade e seriedade", apontou Carrie Lam em comunicado divulgado no 'site' do Governo, acrescentado que "respeita os resultados das eleições".
A líder de Hong Kong afirmou que podem existir "várias análises e interpretações na comunidade em relação aos resultados" e que muitas delas são da opinião que "os resultados refletem a insatisfação das pessoas com a situação atual e com os problemas profundos da sociedade".
Na mesma nota, a líder do executivo de Hong Kong enfatizou ainda o facto de a eleição ter sido realizada de "maneira pacífica segura e ordenada".
"Após a agitação social nos últimos cinco meses, acredito firmemente que a grande maioria do público compartilharia o meu desejo de que a situação pacífica, segura e ordenada continue", frisou.
Já o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês lembrou que Hong Kong "faz parte da China" independentemente dos resultados das eleições. ""Qualquer tentativa de causar estragos em Hong Kong ou de minar a sua prosperidade e estabilidade está condenada ao fracasso", advertiu Wang Yi, em Tóquio, onde se encontrou com o primeiro-ministro nipónico Shinzo Abe.
O coordenador da Frente Cívica de Direitos Humanos (FCDH), Jimmy Sham, que tem liderado o movimento pró-democracia em Hong Kong responsável pelas maiores manifestações, venceu o distrito de Lek Yuen, em Sha Tin.
Após a sua vitória, Jimmy Sham afirmou aos jornalistas que as eleições locais foram um referendo que refletiu a vontade da opinião pública de que sejam realizadas reformas democráticas no território.
Em agosto passado, dois homens com o rosto coberto atacaram-no com um taco de beisebol e uma faca. Em outubro, foi brutalmente espancado por quatro pessoas que utilizaram martelos, tendo sido hospitalizado com ferimentos na cabeça e no braço.
Pelo menos nove candidatos pró-democratas que foram vítimas de agressões durante os quase seis meses de protestos ganharam as eleições.
No bloco pró-Pequim - que sofreu uma pesada derrota, com apenas 59 assentos às 09:00 (01:00 em Lisboa), segundo a agência Efe - destaque para o candidato mais visado pelos manifestantes, Junius Ho, que não conseguiu a reeleição.
Segundo o campo pró-democracia, Junius Ho, um advogado alinhado com Pequim, tem vínculos com máfias locais que atacaram indiscriminadamente pessoas nas estações de metro para semear o caos durante protestos.
Junius Ho acabou por ser esfaqueado durante uma ação de campanha para as eleições locais.
No lado pró-democrático, outra vitória simbólica foi a de Kelvin Lam, que substituiu Joshua Wong, figura proeminente do movimento pró-democracia em Hong Kong e que foi impedido de concorrer.
O ativista foi o único candidato excluído das eleições para o conselho distrital.
"O facto de eu ser o único candidato desqualificado por Pequim prova que as eleições de Hong Kong são manipuladas pelo Partido Comunista Chinês. Mas mesmo que eles me censurem nas urnas ou me prendam, isso incentiva-me a continuar a lutar com mais determinação ", disse Wong no domingo, antes da votação.
Foi a primeira vez que todos os assentos nas eleições do conselho distrital tiveram candidatos de pelo menos dois partidos opostos. Durante o último ciclo eleitoral, em 2015, 68 candidatos concorreram sem oposição.
A Comissão dos Assuntos Eleitorais informou que 71,2% dos 4,1 milhões de eleitores recenseados na região administrativa especial votaram, superando em muito a participação de 47% verificada nas mesmas eleições há quatro anos.
A participação normalmente baixa nas eleições para os conselhos distritais, tradicionalmente controlados por partidos pró-Pequim, ganhou uma nova importância no contexto dos protestos. Mesmo antes do escrutínio, vários analistas defendiam que um resultado forte da oposição seria lido como um apoio público aos manifestantes, ainda que o recurso à violência tivesse aumentado.
Estas eleições são as únicas totalmente democráticas em Hong Kong. Os membros do Conselho Legislativo, o parlamento local, são escolhidos em parte pelo voto popular e em parte por grupos de interesses que representam diferentes setores da sociedade, e o chefe do executivo da região administrativa especial é escolhido por um colégio eleitoral de 1.200 membros, dominado por Pequim.
Após ter recuperado a soberania do território das mãos britânicas em 1997, sob a fórmula "um país, dois sistemas", o Governo chinês comprometeu-se a manter a autonomia de Hong Kong e a respeitar até 2047 uma série de liberdades de que os cidadãos da China continental não gozam.