Hoje o verão chega ao Primavera. E a festa começa

Arranca hoje no Porto o NOS Primavera Sound. Sigur Rós e Animal Collective são os nomes fortes do dia, com Sensible Soccers a abrir e Deerhunter e Julia Holter como aperitivos.
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Convoquem-se espíritos, tribalistas e druidas, gentes de toda a parte, pagãos, crentes, abstémios e agnósticos, desçam à cidade, embrenhem-se por entre árvores e flores, ouçam a cidade tão perto e tão longe, escutem a terra a brotar, o céu que se espera estrelado, o vento que leva sons e sussurros. A partir de hoje, o Parque da Cidade, no Porto, é vosso. Para começar, há sonoridades de lava, há pinturas que rasgaram as paredes - há verão a acontecer hoje no NOS Primavera Sound: primeiro com os islandeses Sigur Rós, depois os americanos Animal Collective.

O cartaz deste ano já foi incensado devidamente: PJ Harvey, Brian Wilson com os 50 anos de Pet Sounds, Air, Beach House, mas também Deerhunter, Explosions in the Sky, Sensible Soccers, Linda Martini, Cass McCombs, Tortoise, Julia Holter ou Savages, entre outros, muitos outros que se distribuem pelos quatro palcos desta quinta edição do festival no Porto, irmão do que se realiza em Barcelona desde 2001.

Hoje, já a noite se levantou, sobem ao palco os Sigur Rós, sem álbum novo desde 2013 mas que se fizeram à estrada numa digressão mundial para reinventar as obras-primas absolutas que são ágaetis byrjun (1999) e ( ), álbum de 2002 e com a promessa de mais canções novas e outras surpresas. Os próprios explicam que o segundo nasceu da digressão do primeiro, com o grupo a experimentar ao vivo as canções que formariam ( ) e que agora se lançam num registo idêntico e com "espírito de aventura".

Esta aventura de Jónsi Birgisson, Goggi Hólm e Orri Páll Dyrason promete desvelar as sonoridades que compõem agora as paisagens despidas dos Sigur Rós - ou pelo menos apontar pistas para o que vem depois de Kveikur, a obra de 2013 que se apresentava bem mais rugosa e menos misteriosa do que a limpidez e a pureza de ágaetis byrjun e ( ) - mesmo que a voz de Jónsi continue a planar numa dimensão quase espiritual.

No palco principal, que leva o nome do patrocinador do festival, aos Sigur Rós (tocam às 22.20) sucedem-se os Animal Collective, prontos para uma outra celebração de emoções à flor da pele, eles que celebram também 15 anos. De Baltimore, o último cartão de visita dá pelo nome de Painting With, álbum já deste ano, que é agora apresentado ao vivo, quatro anos depois de Centipede Hz ter baralhado e dado de novo as sonoridades com que se experimenta este coletivo americano.

Apesar da hora (o concerto é às 01.10) e de a meteorologia prever uma noite limpa mas fresca - e o mar está ali também ao lado para ajudar ao frio que se entranha nos ossos -, o que se antecipa é uma luz de verão cheia de ritmo, em que Avey Tare, Panda Bear e Geologist (que, no álbum, se cruzaram com John Cale e Colin Stetson) vão obrigar todos a mexerem os corpos dolentes que se tenham estirado pela relva e a ensaiarem o coro em FloriDada.

Avey Tare explicou que "toda a gente concorda que a Florida é um lugar estranho", mas que é isso que, "de um certo modo, lhe dá charme". A revista Newsweek viu nesta caracterização daquele estado americano a perfeita definição para o que são os Animal Collective: estranhos e charmosos por isso. Mesmo que com uma irresistível sonoridade pop a entranhar-se sem nunca se estranhar verdadeiramente, como se pode conferir em Golden Gal.

Pontapé de saída

Não se julgue que a oferta do primeiro dia fica fechada com Sigur Rós e Animal Collective. Na véspera do arranque do Europeu de Futebol, o Primavera Sound também abre as portas à música logo às 17.00 com os portugueses Sensible Soccers a mostrarem o seu jogo minimalista. Villa Soledade é o álbum de 2016 de uma equipa reduzida a três mas que preenche muito bem o campo com múltiplas texturas sonoras. O sol estará alto a pedir quietude q.b. e uma disponibilidade para acompanhar as explosões de guitarras que rompem com os sintetizadores.

À hora de jantar, é possível espreitar o pop que não tem vergonha de viver entre a garagem e o noise, que os Deerhunter sintetizam bem no último trabalho, Fading Frontier, de 2015, e deixar-se embriagar pela voz delicada de Julia Holter, que acrescentou um dos álbuns essenciais ao ano passado, Have You In My Wilderness. E o dia tem ainda em cartaz U.S. Girls, Wild Nothing e Parquet Couts. A festa pode começar.

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