O ensino particular e cooperativo tem "pelo menos 30 mil alunos" que, caso frequentassem as escolas públicas, estariam integrados nos escalões A e B da ação social - os mais carenciados - mas que não têm direito sequer a comparticipação nos manuais que, a partir do próximo ano letivo, serão entregues sem custos a todos os estudantes da rede estatal, do 1.º ao 12.º ano de escolaridade..A estimativa é de Rodrigo Queirós e Melo, diretor executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (AEEP), para quem é "incompreensível que se deixe de fora alunos carenciados "que deveriam ter direito aos manuais antes de se estar a generalizar a oferta dos mesmos aos que não precisam"..Para chegar a estes números, Queirós e Melo baseia-se nos contratos simples, um tipo de protocolo entre o Ministério da Educação e as escolas privadas em que o apoio estatal para o pagamento da propina é dado em função das condições económicas da família, mas também em muitas outras situações em que os estudantes frequentam gratuitamente os colégios..No caso dos alunos dos contratos simples, ainda que as capitações não sejam idênticas às da ação social escolar (ASE), o dirigente da AEEP aponta para a existência de cerca de duas dezenas de milhares de estudantes cujas famílias, pelos rendimentos que auferem, estariam nos dois escalões superiores de apoio na rede estatal. E a estes soma muitos outros estudantes que frequentam o privado "não pagando mensalidade", por iniciativa das próprias instituições.."Uma quantidade significativa de colégios não cobram mensalidades aos filhos de trabalhadores que recebam perto do ordenado mínimo. Temos, por exemplo, o pessoal da limpeza, o pessoal do refeitório. Além disso, muitos dos colégios, não só mas especialmente os religiosos, têm por natureza sistemas de apoio. Recebem alunos extras que não pagam", explica, acrescentando que existem ainda situações em que as famílias têm poucos meios e beneficiam de reduções nas mensalidades, sendo que "os avós ajudam" a pagar as mesmas. "Isto também acontece nas escolas públicas", ilustra. "Há filhos de pais sem meios, que têm ação social escolar, e os avós acabam por ajudar.".Uma questão de três milhões de euros.O problema é que no privado, ao contrário do que sucede no ensino superior, o básico e o secundário não têm ação social. A exceção são os colégios com contrato de associação, considerados parte integrante da rede pública de educação. Uma diferença de tratamento que, para a AEEP, torna ainda mais injusta a recusa de dar manuais aos alunos carenciados deste setor.."É incompreensível que a distinção [na gratuitidade dos manuais] seja se o aluno está no privado ou no público, e é ainda mais incompreensível que não se dê a ação social a quem precisa dela porque está no privado e se dê manuais a quem tem meios para os adquirir e está no ensino público", critica Queirós e Melo, para quem tudo se resume a uma questão de preconceito político e ideológico em relação a este subsistema. "Não vale a pena negar a evidência de que, para o Bloco de Esquerda e para o PCP, a lógica é antiprivado. E enquanto o PS estiver refém dessas posições dificilmente fará o que é justo.".Durante o debate do Orçamento do Estado de 2019, a AEEP apresentou várias propostas - entre as quais a atribuição de ASE para os alunos carenciados do privado e o alargamento da oferta dos livros escolares a este setor, lembrando que no primeiro ano de oferta dos manuais, que começou pelo 1.º ano de escolaridade, os livros eram gratuitos para todos os alunos mas depois o Ministério da Educação mudou de ideias no ano seguinte..As propostas não foram aceites, mas Queirós e Melo garante que a associação vai "continuar a insistir junto dos partidos políticos", e defende ser possível rever a situação até ao próximo ano letivo. "Não há nenhuma razão para, em setembro, não começar a ser diferente. Estamos a falar de números residuais para o Orçamento do Estado", diz..De acordo com as projeções da AEEP, tendo em conta um valor médio de cerca de cem euros por cada cabaz de manuais do 2.º ou 3.º ciclos, alargar a oferta no mínimo aos alunos carenciados do privado "teria um custo de cerca de três milhões de euros... num orçamento [do Ministério da Educação] de três mil milhões"..O DN questionou o Ministério da Educação em relação aos números e argumentos apresentados pela AEEP mas não teve ainda resposta do gabinete do ministro Tiago Brandão Rodrigues.