A Guerra da Coreia começou no verão de 1950, com um ataque surpresa do Norte comunista a um Sul apoiado em teoria pelos Estados Unidos. E em teoria porquê? A 12 de janeiro, portanto escassos meses antes da invasão através do Paralelo 38, o secretário de Estado americano fez um discurso no clube de jornalistas de Washington. Dean Acheson, que evoluíra da necessidade de conciliação com Estaline para a de criador da NATO a fim de contrair o expansionismo soviético na Europa, descreveu com pormenor o perímetro defensivo americano na Ásia Oriental: ilhas Aleutas, a norte, depois Japão e também o arquipélago onde fica Okinawa, por fim, a sul, as Filipinas. Ainda hoje se especula se a omissão da sulista República da Coreia, proclamada em 1948, não foi o incentivo que faltava a Kim Il-sung para mandar avançar o seu exército. Antes, o líder norte-coreano tinha já obtido luz verde de Estaline e garantias de apoio da China Comunista se algo corresse pior do que previsto, ou seja, um passeio sobre um Sul sozinho..A guerra durou três anos e depois de terríveis combates e um sofrimento horrível para o povo coreano, terminou empatada. A fronteira atual quase segue o Paralelo 38 definido por soviéticos e americanos em 1945, quando ainda eram aliados na Segunda Guerra Mundial, para receberem a rendição das tropas japonesas na península Coreana. É que a América, com a cobertura da ONU, veio mesmo em defesa da Coreia do Sul em 1950. O presidente Harry Truman percebera que se falhasse na proteção do Sul, outros parceiros da América poderiam também ser atacados pelo bloco comunista, incentivado pela passividade dos Estados Unidos..Faltaram, pois, palavras e a guerra começou. Houve então ação e a guerra teve um rumo diferente do previsto. Duas lições a tirar: o que dizem ou deixam de dizer os governantes tem consequências, e as ações também contam na hora decisiva. Como aplicar estas duas lições à atual tensão entre a Coreia do Norte de Kim Jong-un, neto do fundador do regime e arquiteto da invasão de 1950, e o presidente americano Donald Trump, que em comum com Truman terá talvez só o viver na Casa Branca?.Olhe-se para Kim. Fala demais e corre por isso riscos acrescidos. É ilógico e contraproducente. A sua ação de dotar-se de armas nucleares até deixa o regime mais a salvo de um ataque do que em qualquer outro momento da sua história. Afrontar os Estados Unidos nunca é boa ideia, tal como não o é desprezar os conselhos da China, o grande aliado ainda hoje..Já Trump, sem uma estratégia para lidar com uma Coreia do Norte nuclear, emergência que foi tolerada por George W. Bush e Barack Obama (primeiro teste nuclear foi em 2006), mostra aos 71 anos tanta inexperiência como o jovem Kim, de 34, e profere ameaças que a América mesmo que tenha poder para executar não ganhará nada em fazê-lo. A destruição da própria Coreia do Norte seria um desastre regional e de impacto muito negativo para a América..Digamos que nisto de palavras e ações a China é quem tem estado melhor. Um jornal chinês relembrou aos norte-coreanos que se atacassem estavam por sua conta. E aos americanos disse que se fossem eles a atacar teriam de prestar contas. Palavras sábias, que traçam linhas vermelhas, que se seguiram a uma ação de grande peso: votar novas sanções ao Norte..Ontem, Xi Jinping telefonou a Trump. Pediu-lhe uma retórica mais comedida. Resta saber em que tom pedirá o mesmo a Kim, o seu protegido que é tão rebelde como o avô conseguia ser em relação a Mao Tsé-tung.