"Greta Scarano: "Somos fascinados pela máfia! Já faz parte da nossa cultura"
A maneira como a sua personagem ama aquele mafioso faz-nos pensar como por vezes temos a tendência para gostar de quem não devemos. Nesse capítulo não estaremos numa verdadeira história de amor incondicional?
Sim, ela chega a matar por amor. Ela amo-o tanto, mesmo quando ele é violento e cruel para si. Por outro lado, ela sabe bem que ele a ama verdadeiramente. É daquelas coisas que nós, mulheres, sentimos. No íntimo está convencida de que nunca será magoada ou traída por ele, mesmo quando acaba por ser tentado. Essa fidelidade é a razão para o amor dela, não obstante perceber que não se trata de um homem bom.
Haverá um tipo de mulher que fica atraída ao género do "mau rapaz"?
Provavelmente, mas esta não é uma boa rapariga. Também está atraída pelo mal: consome droga. Tenho a suspeita de que se não fosse namorada deste bandido estaria morta... Sem ele não sobreviveria.
A nível de composição, trabalhou muito numa expressão corporal bastante concreta... A maneira como se movimenta... Por outro lado, há também o detalhe do corte de cabelo radical.
Sim, quis dar-lhe toda a credibilidade. Trabalhei muito para esta personagem e aprendi muito sobre consumo de droga e heroína. Agora já sei preparar um caldo! Coisa tão estranha! Especialmente porque tinha medo de agulhas. Ao mesmo tempo, diverti-me tanto em pequenos detalhes como a roupa. Tudo foi muito detalhado e preparado com todo o cuidado. Foi uma personagem muito pensada, fartei-me de ter conversas com o realizador. Quisemos mesmo ser credíveis. Simultaneamente, quisemos ainda fazer uma história de amor, embora esse desejo só tenha sido detetado posteriormente. Por isso, a história investe tanto na relação deste casal. Eu e o ator Alessandro Borghi quisemos que fosse tudo uma coisa à base da energia.
A relação entre a máfia e os políticos é aqui muito acentuada. Não haverá uma certa liberdade criativa em relação ao que se passa na realidade?
Enquanto rodávamos, o tema da máfia estava ao rubro: um líder tinha saído da prisão, outros mafiosos foram detidos. Nós ficávamos de boca aberta: estávamos a rodar ficção mas havia algo muito idêntico a acontecer fora do plateau. O que se passa com Roma é que é uma cidade muito interessante para a máfia devido à concentração do poder. A máfia em Roma cresceu em redor desse círculo do poder. Na estreia em Roma foram vistos muito divertidos dois mafiosos conhecidos a tirarem selfies. Acredito que tenham gostado do filme...(risos) e os jornais falaram imenso disso. A verdade é que eles não querem saber! Trata-se de gente muito arrogante.
Diria que Roma é neste momento a capital da corrupção?
É e isso é muito assustador. Eu vivo em Roma e sinto diariamente que algo não está bem. Mesmo assim não é uma cidade tão violenta como o que vemos em Suburra. Os romanos sabem que um dia nunca vai ser muito produtivo pois nada funciona, sobretudo tudo o que passe pela burocracia. Nada funciona! O que é incrível é que gostamos de viver ali! No meu caso, suporto tudo, habituei-me. Basta viajar até ao norte do meu país para pensar que cheguei ao paraíso - onde tudo já funciona.
Sei que vai haver uma versão para série de televisão deste filme. A verdade é que ao longo dos anos podemos falar em tradição do audiovisual de abordagem deste tema, não sente isso?
Sim! Somos fascinados pela máfia! Já faz parte da nossa cultura. É uma pena.
É uma pena, sim, mas é interessante os italianos não se afastarem do tema, exibem-no!
Não temos vergonha! Gostamos de contar histórias sobre a máfia!
A seguir à sessão oficial na Festa do Cinema Italiano o filme foi muito aplaudido e seguiu-se uma concorrida sessão de perguntas e respostas consigo. Ficou surpreendida com a reação do nosso público?
Fiquei feliz. Foi um pergunta-resposta muito bom e a sala estava cheia. As pessoas fizeram perguntas e sei que nem sempre isso acontece, ao que parece costumam ser bastante tímidas. Enfim, todos ficaram curiosos, o filme tem esse sortilégio. Uma senhora até ficou intrigada com o uso da chuva.