Em 1920, uma caminhada à beira-mar em Nova Jérsia, nos Estados Unidos, inspirou um jovem de 9 anos a inaugurar a palavra que daí para o futuro passaria a expressar um grande número. "Googol", foi a resposta de Milton Sirotta ao desafio lançado por seu tio, o matemático Edward Kasner, empenhado em corporizar numa palavra um número difícil de conceber. Nascido em Nova Iorque em 1878, Kasner especializou os seus estudos na geometria diferencial, assumindo o papel de docente na Universidade de Columbia por várias décadas. Seria, contudo, a aparente simplicidade que encerra o número 1 seguido de cem zeros (ou 10100) a talhar a memória futura do pai do googol e inspirador da futura designação da gigante da internet Google..Edward quis com o seu googol demonstrar a diferença entre um número inimaginavelmente grande e o infinito. Um número com tal grandeza que expressasse uma quantidade superior às partículas elementares existentes no universo (1080). O matemático aguardaria perto de duas décadas para popularizar a nova palavra. Fê-lo em 1940, ao publicar o livro Mathematics and the Imagination, em coautoria com o também matemático James R. Newman..Googol ganhava na época expressão visual e dava escala a outros grandes números, alguns deles a "viverem" bem próximo de nós. Por comparação com o 10100 do googol, o número de células do corpo humano é 1014. Edward Kasner quis ir mais longe nos limites tangíveis para os seus grandes números e apresentou o googolplex, imenso, mas também não infinito. Para o representar, o norte-americano sugeriu a potência 10googol o que em sistema decimal se pode apresentar como o número 1 seguido "de tantos zeros quantos quisermos", como referia Kasner..Na prática, o exercício de escrever um googolplex revela-se impossível, mesmo que se transformasse toda a matéria do universo em tinta e papel. Isso mesmo sublinhava o astrofísico e grande divulgador científico norte-americano Carl Sagan, em Cosmos, série para televisão transmitida na década de 1980, transposta do livro com o mesmo título e do mesmo autor. Sagan calculou que escrever um googolplex no seu formato decimal exigiria mais espaço do que aquele disponível no universo atualmente conhecido. Exemplo que mereceria a aprovação de Kasner que à expressão "escrever tantos zeros quantos quisermos" adicionava um corolário não destituído de sentido de humor: "Pessoas diferentes cansam-se em momentos diferentes. Não seria bom ver em Carnera [Primo Carnera, pugilista italiano, campeão mundial de pesos-pesados na década de 1930] um matemático melhor do que o Dr. Einstein, simplesmente porque apresentava mais resistência.".Resistência e perseverança eram atributos que não faltavam ao grego Arquimedes que, mais de dois milénios antes de Edward Kasner, perseguia grandes números, tal como o seu "colega" do século XX. Matemático, filósofo, engenheiro e astrónomo, Arquimedes dispôs-se a determinar no século III a.C. o limite máximo para o número de grãos de areia que comportaria o universo então conhecido, finito, o que implicou estimar a distância da Terra à Lua e do nosso planeta ao Sol. Para o seu trabalho O Contador de Areia, o matemático grego teve, contudo, de ir mais longe, criou uma classificação de números. Na época, o número maior cifrava-se em 104 (ou seja, 10 mil), a miríade dos gregos. Para Arquimedes, empenhado em preencher o universo com grãos de areia, era pouco. O matemático apresentou então os números de primeira ordem, ou seja, a miríade de miríades, correspondente a 100 milhões; os de segunda ordem, correspondentes à multiplicação de 100 milhões por 100 milhões (108x108) e assim sucessivamente. Para calcular o número de grãos que acomodaria no universo, o grego estimou um número de oitava ordem, ou seja (108)8=1064. Grande, mas ainda não suficientemente robusto para as ambições de Arquimedes que das ordens passou para os períodos. Na sua representação decimal o primeiro período corresponde ao 1 a que se seguem 800 milhões de zeros. Kasner iria apreciar, Carnera teria, por certo, matéria para exercitar os bíceps. Estima-se que a representação fixa da multidão de zeros do primeiro período de Arquimedes preencheria 300 mil páginas..Do século III a.C., para o nosso século XXI, mas com o sabor da homenagem aos idos da centúria anterior, a 1 de março de 2020, o designer holandês Daniel de Bruin comemorou o seu trigésimo segundo ano de vida, o que corresponde, aproximadamente, a mil milhões de segundos sobre o planeta Terra. Bruin quis fazê-lo com arte, ao criar um mecanismo com um sistema de engrenagens, que representa um googol, neste caso a expressão física da passagem do tempo presente e futuro. Para cada dez rotações em cada uma das cem engrenagens do engenho, a que lhe está mais próxima executa apenas uma rotação e assim sucessivamente. Ou seja, por cada mil rotações da primeira engrenagem, a segunda gira cem entalhes, a terceira dez, a quarta um. Calcula-se que, se o engenho girasse à velocidade improvável de 300 mil voltas por minuto, o número de evoluções em 50 anos corresponderia ao número 1 seguido de 12 zeros..De googol a Google.Larry Page e Sergey Brin, dois jovens de doutoramento da Universidade Stanford, na Califórnia, criaram em 1996 um motor online de pesquisa, alojado na instituição de ensino que frequentavam. O BackRrub, como foi denominado, pesquisava links na rede, avaliava a sua pertinência e relacionava sites. Em 1997, a ferramenta de pesquisa mudou de nome. Como premissa, uma designação que remetesse o utilizador para uma imensa indexação de dados. Googolplex e googol, termos cunhados na primeira metade do século XX pelo matemático Edward Kasner, mereceram disputa. Venceu googol, embora com um erro de registo: google.com..dnot@dn.pt.artigo publicado na edição impressa de 29 de agosto