Gamito ainda pedala, à boleia do marketing e da comunicação
"Não tenho saudades dos tempos de ciclista profissional. Foi uma experiência muito importante mas consegui aproveitar esse currículo para me tornar o que sou hoje, um comunicador." É sem falsas nostalgias que Vítor Gamito se mostra na nova pele. O antigo ícone da Volta a Portugal (vencedor da prova em 2000) converteu-se num gestor de marketing, apaixonado pela comunicação digital. Mas ainda continua a pedalar: dedica-se ao BTT - hoje inicia a participação no Transpyr Gran Raid MTB, que atravessa os Pirenéus - e treina outros atletas.
No fundo, quase todas as ocupações estão interligadas. Na principal, Vítor Gamito move-se como peixe na água. "A nível profissional, continuo ligado ao desporto, de forma indireta. Trabalho no marketing de uma empresa de produtos de nutrição desportiva, a Gold Nutrition. Uma das minhas principais funções é fazer a gestão dos patrocínios aos atletas a que estamos associados, muitos olímpicos, como Jéssica Augusto, Dulce Félix, Emanuel Silva ou Fernando Pimenta", descreve, ao DN, o ex-ciclista profissional. "Também faço a gestão da presença da marca em eventos desportivos, quase todos os fins de semana vou a provas patrocinadas."
De ciclista "exigente" a treinador
Gamito colabora com a empresa de produtos de nutrição desde a sua génese, em 2003. E fortaleceu o vínculo quando deixou o ciclismo de estrada, por motivos de saúde, em 2004. Primeiro, foi diretor desportivo da equipa patrocinada pela marca (Riberalves/Gold Nutrition/Alcobaça). Depois aventurou-se pelos caminhos da comunicação (tem o mestrado em marketing desportivo), uma paixão tão grande como o treino. Hoje, todas as áreas estão de alguma forma conectadas: o antigo atleta profissional treina outros ciclistas, compete em provas nacionais e internacionais de BTT e partilhas todos os passos dessas aventuras por via digital (promovendo, de caminho, as marcas parceiras e, em particular, a Gold Nutrition).
Vamos por partes. Em primeiro lugar, o treino: "Sou treinador credenciado de nível 3. Fiz formação e treino vários atletas, entre os 18 e os 54 anos, sobretudo de BTT, incluindo campeões nacionais, como a Celina Carpinteiro. Faço o planeamento e treino com eles, quase como colega. É um dos meus part-times", conta Vítor Gamito, de 47 anos.
A curiosidade pela componente técnica vem dos tempos de atleta - "sempre fui muito exigente, comprava livros em inglês e espanhol e aplicava o conhecimento nos meus treinos, para fazer coisas mais elaboradas do que era prática em Portugal", recorda. E, hoje, Gamito vê no treino uma extensão da sua carreira na estrada. "Gosto muito deste trabalho. Dá-me tanta ou mais alegria um deles conseguir os seus objetivos do que me davam as minhas vitórias na altura", garante.
No entanto, a velha lenda da Volta a Portugal continua a competir - e a vencer -, agora em cima de uma bicicleta de montanha. "Ainda tenho tempo para continuar a pedalar. Deixei a estrada e passei a fazer mais aventuras de BTT, que me dá possibilidade de seguir por outros trilhos, encontrar outras pessoas e conhecer sítios novos", explica.
É essa ânsia de descoberta que o leva agora ao Transpyr Gran Raid MTB - prova de sete etapas, no total de 775 quilómetros, que cruza os Pirenéus entre hoje e sábado. "É a minha primeira vez lá. Tento sempre fazer eventos diferentes e encontrar os que tenham uma mais-valia, seja pela dureza, pela paisagem ou por qualquer outro motivo. Este será seguramente dos mais duros, pelo desnível acumulado: 20 mil metros de ascensão no somatório dos sete dias. Como já o fiz nos Alpes, faz todo o sentido cruzar também os Pirenéus", aponta Vítor Gamito, que já passou por outras provas de referência na disciplina, em destinos tão dispares como Brasil, Marrocos, Nova Zelândia ou Chile - onde venceu o Epica MTB Raid Atacama 2016, no escalão Masters-40.
"Jornalista em cima da bicicleta"
Mas nem tudo é desporto: para o antigo ciclista profissional, o Transpyr Gran Raid MTB "é quase um trabalho de comunicação". O atleta partilha na internet todos os pormenores das provas em que participa - com fotos, vídeos ou resumos diários. "Apesar de não ganhar dinheiro diretamente por isso, ao comunicar digitalmente as aventuras desportivas acabo por dar retorno aos parceiros que me facilitam este passatempo. Isto também é importante para a Gold Nutrition, é um triângulo que se liga", esclarece.
"Para o Transpyr vou quase como um jornalista em cima da bicicleta. Não vou pagar [pela participação], porque a organização sabe a influência que tenho no meio. Vou fazê-lo para partilhar com todos os que não podem participar, vou contar o que de bom e mau tem a prova, como são as montanhas, como é estar 800 quilómetros em cima da bicicleta a passar pelos lugares mais recônditos da península", explica.
"Só tenho pena de que na altura em que era profissional não houvesse esta facilidade de aproximação com os nossos seguidores", diz o ciclista, que, além de escrever crónicas diárias, também recolhe imagens e faz edição de vídeos (que partilha após concluir as competições). Todavia, esse capítulo - do ciclismo de estrada - ficou definitivamente encerrado com a presença na Volta a Portugal de 2014 ("faltava-me fechar esse capítulo, foi aí que o concluí"). Agora, Vítor Gamito pode dar largas à paixão pela comunicação digital.