Galiza. Uma das mais belas bíblias do mundo regressa a "casa" após 500 anos

Proprietários da obra eram judeus e foram obrigados a abandonar o país em 1492. É a primeira vez que o valioso manuscrito volta a pisar solo espanhol.
Publicado a
Atualizado a

É considerada uma das bíblias mais bonitas do mundo e uma das mais valiosas obras de ilustração medieval. A Bíblia Kennicott, escrita em 1476 na Galiza, está de regresso às origens, embora temporariamente, depois de mais de cinco séculos fora de Espanha. Propriedade da Biblioteca Bodlein​​​ da​​​​ Universidade de Oxford há cerca de 150 anos, o manuscrito vai estar em exibição na Cidade da Cultura de Santiago, de 14 de novembro até abril do próximo ano.

A obra foi encomendada por um comerciante judeu da Corunha, Don Isaac, ao escriba Moisés Ibn Zabara e ao ilustrador Joseph Ibn Hayyim, que terminaram os trabalhos a 24 de julho de 1476, conta o El País. Terão demorado 10 meses para preencher as 900 páginas, que estão repletas de dragões, macacos e pavões. Dezasseis anos mais tarde, os monarcas espanhóis expulsaram os judeus, que há cem anos sofriam perseguições. Com eles, a obra também sairia do país.

Quando foram condenados ao exílio, os proprietários da bíblia terão deixado a Corunha de barco, chegando primeiro a Portugal e depois ao norte de Marrocos, segundo o curador da exposição, Manuel Gago. Mas não se sabe muito sobre os 300 anos seguintes em que a obra esteve desaparecida. O certo é que se encontra em ótimo estado de conservação, o que revela que "sempre foi tratada com cuidado".

Só no século XVIII se volta a recuperar o rumo da bíblia, que foi comprada em 1771, em Gibraltar, por Benjamin Kennicott, chefe da Biblioteca Radcliffe da Universidade de Oxford. E foi a partir daí que herdou o nome pelo qual atualmente é conhecida. Alguns anos mais tarde, em 1872, foi transferida para a Biblioteca Bodlein​​​, da mesma universidade, onde se encontrava até ser emprestada ao governo da Galiza.

Dado o valor incalculável da obra, o ministro da Cultura admitiu ter de adotar medidas de segurança mais exigentes para a proteger.

Segundo o The Guardian, esta será a peça central da primeira de três exposições, que pretendem refletir sobre o contributo da Galiza para a cultura e a história do mundo.

"O Kennicott é uma das maiores bíblias do mundo e tem um valor duplo: técnico devido à sua arte espetacular, mas também simbólico", afirmou Román Rodríguez, ministro da Cultura e Turismo do governo regional. Segundo este, a obra mostra como, ao mesmo tempo, pessoas de três religiões - católicos, muçulmanos e judeus - coexistiram em Espanha. Além disso, "também mostra que existia uma forte presença cultural e económica judaica na Galiza, mas que foi forçada a sair".

Apesar da importância da obra, Román Rodríguez diz que não há intenções de tentar o regresso permanente da bíblia ao país. "É galega, não importa onde está", explicou.

Para César Merchán-Hamann, responsável pelo manuscrito em Oxford, "é muito emocionante" ver a obra regressar a Espanha. Confessa que será difícil deixar a bíblia longe dos cuidados da equipa durante cinco meses, mas diz estar satisfeitos com a oportunidade de ser exposta na Galiza. "É como ver um filho partir".

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt