Galiza. Uma das mais belas bíblias do mundo regressa a "casa" após 500 anos
É considerada uma das bíblias mais bonitas do mundo e uma das mais valiosas obras de ilustração medieval. A Bíblia Kennicott, escrita em 1476 na Galiza, está de regresso às origens, embora temporariamente, depois de mais de cinco séculos fora de Espanha. Propriedade da Biblioteca Bodlein da Universidade de Oxford há cerca de 150 anos, o manuscrito vai estar em exibição na Cidade da Cultura de Santiago, de 14 de novembro até abril do próximo ano.
A obra foi encomendada por um comerciante judeu da Corunha, Don Isaac, ao escriba Moisés Ibn Zabara e ao ilustrador Joseph Ibn Hayyim, que terminaram os trabalhos a 24 de julho de 1476, conta o El País. Terão demorado 10 meses para preencher as 900 páginas, que estão repletas de dragões, macacos e pavões. Dezasseis anos mais tarde, os monarcas espanhóis expulsaram os judeus, que há cem anos sofriam perseguições. Com eles, a obra também sairia do país.
Quando foram condenados ao exílio, os proprietários da bíblia terão deixado a Corunha de barco, chegando primeiro a Portugal e depois ao norte de Marrocos, segundo o curador da exposição, Manuel Gago. Mas não se sabe muito sobre os 300 anos seguintes em que a obra esteve desaparecida. O certo é que se encontra em ótimo estado de conservação, o que revela que "sempre foi tratada com cuidado".
Só no século XVIII se volta a recuperar o rumo da bíblia, que foi comprada em 1771, em Gibraltar, por Benjamin Kennicott, chefe da Biblioteca Radcliffe da Universidade de Oxford. E foi a partir daí que herdou o nome pelo qual atualmente é conhecida. Alguns anos mais tarde, em 1872, foi transferida para a Biblioteca Bodlein, da mesma universidade, onde se encontrava até ser emprestada ao governo da Galiza.
Dado o valor incalculável da obra, o ministro da Cultura admitiu ter de adotar medidas de segurança mais exigentes para a proteger.
Segundo o The Guardian, esta será a peça central da primeira de três exposições, que pretendem refletir sobre o contributo da Galiza para a cultura e a história do mundo.
"O Kennicott é uma das maiores bíblias do mundo e tem um valor duplo: técnico devido à sua arte espetacular, mas também simbólico", afirmou Román Rodríguez, ministro da Cultura e Turismo do governo regional. Segundo este, a obra mostra como, ao mesmo tempo, pessoas de três religiões - católicos, muçulmanos e judeus - coexistiram em Espanha. Além disso, "também mostra que existia uma forte presença cultural e económica judaica na Galiza, mas que foi forçada a sair".
Apesar da importância da obra, Román Rodríguez diz que não há intenções de tentar o regresso permanente da bíblia ao país. "É galega, não importa onde está", explicou.
Para César Merchán-Hamann, responsável pelo manuscrito em Oxford, "é muito emocionante" ver a obra regressar a Espanha. Confessa que será difícil deixar a bíblia longe dos cuidados da equipa durante cinco meses, mas diz estar satisfeitos com a oportunidade de ser exposta na Galiza. "É como ver um filho partir".