Frenesim parlamentar na produção de votos marca início da legislatura
Trinta e quatro deliberações ao todo. Ou seja, na gíria parlamentar, os "votos". "Votos" de "pesar", de "congratulação", de "solidariedade", de "saudação", de "condenação", de "repúdio", de "protesto", de "preocupação", de "louvor". A primeira sessão de votações na XIV legislatura parlamentar ficou hoje marcada por uma proliferação imensa de "deliberações" - e tudo aponta para que vá ser assim sempre até que o país volte a ir a votos. Somaram-se a estas votações outras 29, na generalidade, de projetos-lei.
Tudo isto aconteceu a encerrar uma manhã parlamentar com cinco pontos na agenda para debater, todos impulsionados a partir de petições que tinham transitado da legislatura anterior. Uma sobre a "adoção de medidas para defesa do Pinhal do Rei", outra "pelo direito à redução do horário de trabalho, para acompanhamento de filhos até aos 3 anos de idade, em duas horas diárias, por parte de um dos progenitores", uma terceira solicitando que "as baixas médicas para doentes oncológicos seja paga a 100%", mais uma pedindo uma " alteração legislativa com vista a estabelecer a presunção jurídica da residência alternada para crianças com pais separados" e por último uma pedindo que "a maternidade de Coimbra seja integrada no espaço do Hospital dos Covões".
Nas deliberações discutiram-se e votaram-se cinco textos que, a propósito de uma discussão ocorrida no Parlamento Europeu há semanas, refletiam sobre o problema da equiparação entre nazismo e comunismo.
Aconteceu o que se previa: as posições extremaram-se, com a direita a acusar a esquerda de ter duas medidas para avaliar as violações dos direitos humanos, consoante a cor política dos regimes, e as bancadas da esquerda a devolverem a acusação e a colarem PSD e CDS aos "reacionários" da Iniciativa Liberal e do Chega.
Feitas as votações, dos cinco votos em cima da mesa (da IL, CDS, Chega, PS e PCP) apenas o dos socialistas foi aprovado, com o voto das bancadas da direita, do BE e do PAN, além do próprio PS. PCP, PEV e Chega votaram contra.
Outro tema discutido foi a situação no Chile, onde, no último mês, se verificaram manifestações contra as desigualdades sociais e a constituição do país, mas apenas um, do PS, foi aprovado. No total, foram apresentados cinco projetos de resolução de condenação, preocupação ou repúdio, embora com diferenças, em que se notou uma divisão esquerda-direita.
O cruzamento dos votos contra ou a abstenção do PS e PSD e dos partidos de esquerda ditou o chumbo dos projetos de resolução do BE, IL, CDS e PCP. Apenas o do PS, de "preocupação pela violação dos direitos humanos no Chile", foi aprovado, apesar da abstenção do PCP e PEV , e do voto contra do Chega.
Quanto às petições, foram rejeitados, por exemplo, dois projetos-leis (do BE e do PCP) e um um projeto de resolução do PAN, que decorreram da iniciativa popular que visava reforçar o subsídio de doença para doentes crónicos, oncológicos ou graves.
O projeto de lei do BE previa a "sexta alteração ao regime jurídico de proteção social na eventualidade doença, no âmbito do subsistema previdencial de segurança social, majorando o subsídio de doença atribuído a doentes graves, a doentes crónicos e a doentes oncológicos". Os bloquistas pretendiam que fosse "garantido um valor mínimo de subsídio de doença correspondente à Retribuição Mínima Mensal Garantida", ou seja, os 600 euros atuais do Salário Mínimo Nacional.
O projeto de lei do BE foi rejeitado com os votos contra do PS, PSD, Iniciativa Liberal e CDS-PP, a abstenção do PAN e o voto favorável dos proponentes, do PCP, PEV, Livre e Chega.
Também o projeto apresentado pelo PCP foi rejeitado, apesar de ter contado com votos favoráveis da bancada proponente, BE, PEV, Chega e Livre e com a abstenção do PAN. Com este documento pretendia-se um reforço do "subsídio de doença para os doentes oncológicos e os doentes crónicos", sem prejudicar a "adoção de quaisquer outros que se revelem adequados e necessários no apoio aos doentes com tuberculose, aos doentes crónicos, designadamente com doença oncológica, e seus familiares".
Já o projeto de resolução do PAN - que foi chumbado pelo PS, BE, PCP, PEV e Livre - recomendava ao Governo a criação de condições para o "reforço da proteção dos trabalhadores na doença quando esta implique circunstâncias económicas particularmente gravosas".
Aprovada foi, isso sim, uma recomendação (não vinculativa) ao Governo para que garanta as condições para que as crianças até aos três anos tenham a "efetiva possibilidade" de fazer uma sesta na rede pré-escolar pública.
O projeto de resolução aprovado, apesar dos votos contra do PS, CDS e Iniciativa Liberal, foi apresentado pela bancada do PCP, teve o apoio do BE, PCP, Livre e PSD, o voto contra do Chega, e foi o único dos três em discussão a ter luz verde dos deputados.
Os outros, do BE, que recomendava uma avaliação para introduzir a sesta no pré-escolar do ensino público, e do PAN, que também pedia condições para a prática da sesta, foram chumbados. Na quinta-feira o Parlamento tinha discutido uma petição assinada por 4.751 cidadãos a pedir medidas e condições à introdução da sesta nos estabelecimentos de educação pré-escolar, revelando o debate que os partidos estavam genericamente de acordo, mas com soluções diferentes.
Foram também aprovados, na generalidade, quatro projetos de resolução que recomendam ao Governo a atribuição de um cartão para acesso fácil e prioritário a casas de banho aos cidadãos com Doenças Inflamatórias do Intestino (DII).