Filho de Bolsonaro lavou dinheiro em loja de chocolates, diz acusação

"Não tenho nada a ver com isso", diz o presidente da república acerca da investigação sobre um esquema de corrupção envolvendo o senador, um amigo assessor e a família do chefe da milícia acusada de matar Marielle Franco.
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O Ministério Público do Rio de Janeiro suspeita que o senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente da República Jair Bolsonaro, lavou dinheiro de um esquema de corrupção praticado ainda enquanto vereador naquela cidade em imóveis na região de Copacabana e numa loja de chocolates de sua propriedade.

Acusado de praticar "rachadinha", o nome que se dá no Brasil ao desvio de salários de assessores, Flávio e a sua mulher, Fernanda, pagaram em dinheiro vivo de forma ilegal 638 mil reais [em torno de 140 mil euros] na compra de dois imóveis em Copacabana. O uso desses recursos em papel tinha como objetivo lavar o dinheiro obtido na tal "rachadinha", diz o pedido de busca e apreensão emitido pelo Ministério Público na quarta-feira.

Uma loja de chocolates do qual o senador é sócio, do grupo Kopenhagen, arrombada pelos agentes na operação de busca e apreensão, serviria para o mesmo fim, lê-se ainda nas 111 páginas da acusação. Uma empresa de segurança privada ilegal de um polícia militar, Diego Sodré, transferiu dinheiro para a conta da Kopenhagen de Flávio. Sodré e o casal Bolsonaro estão envolvidos também em transações imobiliárias suspeitas.

A investigação apurou que Glenn Dillard, o cidadão norte-americano proprietário dos imóveis de Copacabana, teria recebido 310 mil reais, pagos em cheque pelo casal. No entanto, no mesmo dia e na mesma agência bancária, Dillard depositou também aqueles 638 mil reais em dinheiro vivo. Para o ministério público a única origem possível dessa quantia em espécie é o esquema de "rachadinha".

Investigação começou há pouco mais de um ano

Esse esquema começou a ser investigado há pouco mais de um ano quando, no âmbito de um outro esquema corrupto na Assembleia Legislativa do Rio, o COAF, órgão público que apura irregularidades em transferências financeiras, notou "movimentações atípicas" - o equivalente a mais de 300 mil euros - nas contas de Fabrício Queiroz, assessor de Flávio e amigo de Jair Bolsonaro há mais de 30 anos. Além da quantia, a forma como as operações eram realizadas levantou suspeitas - depósitos e levantamentos em dinheiro vivo em datas próximas ao pagamento dos funcionários da Assembleia Legislativa do Rio.

A suspeita é que Queiroz recolhia o salário de funcionários do gabinete de Flávio. Entre esses funcionários estão, além de familiares do próprio Queiroz, nove familiares de Ana Cristina Valle, ex-mulher de Jair Bolsonaro, também eles alvo da operação de busca e apreensão do Ministério Público. E ainda a mulher e a mãe de Adriano Nóbrega, o líder do Escritório do Crime, a mais perigosa milícia do Rio de Janeiro, acusada, num outro processo, de ter executado o assassinato da vereadora Marielle Franco, em março de 2018.

As notícias dando conta da operação em moradas ligadas a Flávio e seus assessores criaram ruído em Brasília. A deputada Joice Hasselmann, ex-aliada da família presidencial, chamou os filhos de Bolsonaro de "tropa da "rachadinha"". "Natal bem tenso para a Tropa da Rachadinha. O Ministério Público fez nova operação e, com base na investigação, suspeita que Flávio Bolsonaro e a esposa lavaram dinheiro sujo em dois imóveis e até na lojinha de chocolates... ah e o Flávio é vice-presidente do Aliança, que exemplo", escreveu a deputada, aludindo ao novo partido de Jair e Flávio Bolsonaro, dissidentes do PSL, onde ela ainda milita.

"Nada a ver com isso"

A reação mais esperada, entretanto, era a do presidente da República. "Não tenho nada a ver com isso", disse Jair Bolsonaro, na manhã de quinta-feira, embora o nome da sua mulher, a primeira-dama Michelle Bolsonaro, também faça parte das investigações, na qualidade de depositária de um cheque de Queiroz.

Horas depois da operação de busca e apreensão de quarta-feira, o presidente, Flávio e o advogado deste estiveram longas horas reunidos no Palácio do Alvorada, residência oficial do primeiro.

Segundo os jornais, Bolsonaro queixou-se ao seu núcleo mais próximo de estar a ser vítima de uma investida de Wilson Witzel, o governador do Rio de Janeiro. Witzel, que era aliado do presidente até há poucos meses, já fora acusado pelo presidente também no caso do porteiro do seu condomínio noticiado pela TV Globo. Na ocasião, revelou-se que o porteiro, em depoimento à polícia, disse que foi Bolsonaro quem permitiu a entrada de Élcio Queiroz, um dos alegados autores da execução de Marielle, no condomínio onde mora o outro suposto autor material, Ronnie Lessa, no dia do crime.

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