Fernando dos Santos Pedro, de 20 anos, extremo-esquerdo brasileiro, foi uma das três caras novas garantidas pelo Sporting em cima do fecho do mercado. Chegou por empréstimo de um ano do Shakhtar Donetsk, clube ucraniano pelo qual assinou em 2018, ainda o português Paulo Fonseca era o treinador da equipa..À semelhança da grande maioria dos jogadores brasileiros, Fernando teve uma infância e adolescência difíceis. Mas em poucos anos conseguiu passar de vendedor de feijão-tropeiro (prato típico de algumas regiões do Brasil feito à base de feijão misturado com farinha de mandioca, torresmo, linguiça, ovos, alho, cebola e outros temperos) à porta do estádio a jogador de futebol profissional. Um salto que lhe permitiu cumprir as promessas feitas aos pais e proporcionar-lhes hoje uma vida melhor..Fernando nasceu em Belo Horizonte, no Brasil, e logo muito cedo começou a trabalhar para ajudar o pai. "Quando eu tinha 12 anos, o meu pai tinha um carrinho de lanche e eu sempre quis trabalhar com ele. Antes, ele não me deixava porque eu era muito pequeno. Depois, quando fiz 14, ele começou pouco a pouco a deixar-me ajudá-lo", lembrou em entrevista à ESPN em fevereiro..O local era precisamente em frente a um estádio de futebol nos dias de jogos. No famoso Mineirão, recinto do Cruzeiro, também conhecido como Toca da Raposa. "Ficávamos sempre à porta do Mineirão e no Parque Municipal de Belo Horizonte. Primeiro ia mais ao Parque, mas depois passei a ir para o Mineirão também. Virou a minha rotina: todos os dias de jogo eu ajudava o meu pai. Estive uns três anos nesta rotina. Jogava ao sábado, trabalhava com o meu pai ao domingo a vender o famoso feijão-tropeiro", acrescentou..A mãe e os dois irmãos também trabalhavam. Mas o dinheiro era escasso e as contas não paravam de chegar. Por isso, um certo dia, Fernando fez duas promessas aos pais. "Sempre lhes prometi coisas, mas há uma que guardo com um carinho especial e que nunca vou esquecer. Quando ainda estávamos em Belo Horizonte, e numa altura em que estava lesionado, cheguei a casa e vi a minha mãe a fazer as contas da casa, a calcular o que precisava de pagar. E disse-lhe: 'Mãe, quando eu voltar da lesão, essas contas todas vão acabar'.".E acabaram mesmo, porque meses depois transferiu-se para o Palmeiras, clube que lhe permitiu algum desafogo financeiro e, claro, ajudar os pais. E também pagar uma promessa que tinha feito ao pai. "Muitas vezes, quando estávamos a vender feijão-tropeiro à porta do Mineirão, dizia ao meu pai que um dia ele ainda me ia ver jogar ali. Quando o Palmeiras foi jogar lá contra o Cruzeiro e vi que o meu nome estava na lista de convocados, fiquei sem acreditar. Peguei no telefone e liguei-lhe: 'Pai, lembras-te do que eu falava incansavelmente à porta do Mineirão? Então...' Ele fez uma festa enorme, a felicidade foi gigante. Chorei muito quando cheguei ao estádio, fiquei muito feliz por realizar mais um sonho e, claro, cumprir uma antiga promessa", contou ao site besoccer.com..A família é um pilar fundamental para Fernando e ainda hoje se emociona ao recordar certos momentos que viveu na infância e na adolescência. Sobretudo uma história relacionada com a mãe, que ficou com a guarda de um sobrinho bebé e de uma sobrinha de 10 anos antes de dar à luz Fernando, devido à morte da irmã pouco tempo após o parto.."A minha mãe pegou o meu primo recém-nascido para criar e também na minha prima, que na época já tinha 10 anos. Fez tudo isto mesmo sem condições de criá-los. Anos depois, quando descobri tudo, fiquei ainda mais motivado para procurar o meu sonho de jogar futebol profissionalmente. Se a minha mãe não tivesse criado os meus primos, que agora são meus irmãos, talvez eu não fosse quem sou hoje, poderia ter uma vida totalmente diferente." Tenho um orgulho enorme da minha mãe, que criou três crianças mesmo sem ter condições. Felizmente, os meus pais nunca nos deixaram faltar nada", recordou..Palmeiras, Shakhtar e comparações com Gabriel Jesus.Fernando começou a jogar no Democrata de Sete Lagoas, cidade que ficava a 60 km de Belo Horizonte. Em 2016 o clube fechou e o então jovem aspirante a jogador de futebol profissional mudou-se para o AMDH (Associação Mineira de Desenvolvimento Humano), onde teve a oportunidade de disputar a Taça BH em sub-17. Deu nas vistas e no final do torneio recebeu três propostas: do São Paulo, do At. Paranaense e do Palmeiras. Optou por esta última: "O Palmeiras veio com uma oferta de três anos de contrato e um salário que me ajudaria bastante. Na hora, eu e o meu pai decidimos assinar." E assim foi. A venda de feijão-tropeiro passou a fazer parte do passado..A adaptação a São Paulo não foi fácil inicialmente, até porque era a primeira vez que estava fora da cidade onde nasceu e longe dos pais. Isto com 17 anos: "O início foi muito difícil. Estava longe dos meus familiares e todo o dia pensava em ir embora. A minha mãe brinca até hoje: 'Ainda bem que você não tinha dinheiro para voltar para casa, senão tinha ido embora'.".Mas de repente tudo mudou. Fernando fez dois bons jogos pelo sub-17 do Palmeiras e subiu logo ao escalão de sub-20. E daí até à equipa principal foi um pequeno passo, estreando-se em 2017 num jogo do Brasileirão frente ao Vitória. "Ligaram-me a avisar que ia viajar com a equipa para Salvador. Apanhei um susto, nem queria acreditar. Só depois a ficha caiu. Ao intervalo, o treinador mandou-me aquecer e as pernas até me tremeram. Infelizmente perdemos esse jogo.".No segundo jogo pelo Palmeiras, contra o Ituano, começou uma vez mais no banco. Mas entrou e marcou um golo. "Até me deitei no chão, nem acreditei naquele sonho. Chorei para caramba, não acreditava", confessou. Foi o bastante para atrair a atenção dos jornais e televisões, que começaram a elogiar aquele menino e a apelidá-lo de novo Gabriel Jesus. O eco foi tanto que o Shakhtar Donetsk foi bater à porta do Palmeiras para contratar Fernando. E o negócio de 5,5 milhões de euros fez-se tão rapidamente que até apanhou Fernando de surpresa..Na hora apanhei um susto. Os meus empresários disseram-me que tinha sido vendido, que ia para a Ucrânia na quinta-feira e que na segunda tinha de me apresentar no clube. Pensei: "Como assim? Nem me despedi da minha família!" Foi a primeira coisa que me passou pela minha cabeça. "Foi tudo muito rápido. Eu soube na terça do interesse e na quinta já estava no avião para assinar o contrato", contou..E assim foi, na companhia de um primo rumou ao Shakhtar Donetsk, clube que na altura era treinado pelo português Paulo Fonseca. Pegou de estaca na equipa, participou em 22 jogos e marcou dois golos. Até teve oportunidade de defrontar na Liga dos Campeões o seu grande ídolo, Gabriel Jesus, quando o Shakhtar defrontou o Manchester City. No final trocaram de camisolas..Há algum tempo no radar do Sporting, na segunda-feira, último dia do mercado de transferências, foi anunciado como reforço dos leões por empréstimo até ao final da época, dado que, com a saída de Paulo Fonseca e a entrada de Luís Castro para o comando da equipa ucraniana, o extremo brasileiro perdeu algum espaço. E, tal como há uns anos fez promessas aos pais, na terça-feira, quando foi apresentado, deixou uma mensagem aos adeptos do Sporting: "Vou tentar marcar muitos golos e ajudar a equipa a conquistar títulos. Vim para Portugal porque o Sporting é um excelente clube - sempre me disseram isso. Podem esperar bastante garra da minha parte e muitos golos."