Fátima. Santuário oferece à Ucrânia nova imagem da Virgem Maria
Um mar de gente voltou a encher o recinto do santuário de Fátima nas celebrações do 13 de maio. Milhares de peregrinos vieram de todo o país, maioritariamente do norte, e a pé, num regresso emotivo que esteve suspenso durante dois anos.
"A queda das restrições não significa da nossa parte uma menor responsabilidade. Alegramo-nos por podermos celebrar desta forma, mas continuamos a sugerir aos peregrinos o uso de máscara, sobretudo nos lugares de maior aglomeração de pessoas. Já não existe obrigação, mas a máscara não está proibida", lembrou o padre Carlos Cabecinhas, reitor do Santuário de Fátima, quando anunciava aos jornalistas que, afinal, ao contrário do que esperava, os peregrinos superaram todas as expectativas.
"A partir do mês de março fomos assistindo à chegada de grupos organizados (dioceses, paróquias e outros), que praticamente tinham desaparecido nos dois anos anteriores, tal como os grupos de peregrinos estrangeiros. E sobretudo a partir da Páscoa chegou ao Santuário um número significativo de peregrinos a pé. Devo confessar que, uma vez que eram tantos os que anteciparam a sua vinda, a nossa expectativa era que não houvesse uma presença tão significativa nestes dias. E enganámo-nos", disse.
O momento alto desta peregrinação será a bênção de uma réplica da imagem de Nossa Senhora de Fátima, que o Santuário vai enviar para a Ucrânia. A cerimónia acontecerá depois da missa deste 13 de maio.
D. José Ornelas - que ainda está "a conhecer os cantos à casa", como fez questão de lembrar, no encontro com os jornalistas - vive nesta peregrinação o seu primeiro 13 de maio enquanto bispo da diocese de Leiria-Fátima. Mas Fátima não é uma casa qualquer. E o que ali aconteceu há 105 anos encontra, para ele, muitas semelhanças com a atualidade: "uma situação de pandemia - a gripe espanhola - que até vitimou dois dos pastorinhos e uma situação de guerra. Portanto, não é nada de novo. Fátima é um lugar posto no mundo, que tem a sua dimensão de beleza e de tragicidade", disse. Estava dado o mote para se falar do tema que viria a dominar o encontro com os jornalistas. "É significativo que se tenha repetido este desejo da consagração da Rússia e da Ucrânia ao Coração Imaculado de Maria, contemporaneamente em Roma e em Fátima".
Mas quando, mais tarde, uma jornalista da TSF perguntava sobre a alusão à Rússia num dos Segredos de Fátima, estabelecendo um eventual paralelismo, o reitor do Santuário recusou ligações: "A questão do segredo não tem que ver com a geografia e com um povo. Tem que ver com uma ideologia que pretende excluir de forma radical Deus daquilo que é o horizonte das pessoas. E, por isso, a mensagem de Fátima fala da necessidade de dar a Deus o lugar que lhe compete na vida dos crentes", disse o padre Carlos Cabecinhas. "Ora, a situação atual não é isso", considera. "Os tempos são outros, o horizonte mudou radicalmente. Mesmo quando o papa Francisco propõe a consagração da Rússia e da Ucrânia, falamos de uma outra realidade, que é necessidade de oração pela paz".
Dentro de um ano Fátima será palco de uma visita do Papa Francisco, a propósito da Jornada Mundial da Juventude, que decorre em Lisboa. E, por isso, D. José Ornelas projetou esse futuro (já) próximo. "Hoje a mobilidade está no coração dos jovens. Os santuários tradicionalmente têm o caráter de ser imóveis. Esta diocese será o ponto de partida. Nós somos um mundo em mobilidade. É o sentido que queremos imprimir a Fátima nestes próximos tempos, com a nossa Igreja, com os jovens que estão desafiados à participação para as Jornadas Mundiais da Juventude em 2023. Vamos precisar mesmo deles. Vamos precisar mesmo deles. De gente que fale línguas, que saiba acolher. É importante que o bispo cá esteja...mas não querem o velhote, simplesmente, querem gente nova, que faça caminho ao mesmo passo", disse.
O bispo de Leiria-Fátima tem consciência de que "o mundo está em mudança de uma força rápida e radical" e, por isso, o Santuário não pode ficar alheio ao que acontece à sua volta. "Temos de nos precaver completamente contra uma visão ideológica da mensagem de Fátima como se estivéssemos em 1917 ou 1918, com um contexto que já não é o nosso. Aqui nós não estamos a pedir a conversão da Rússia", enfatizou.
A peregrinação internacional aniversária - que acontece exatamente 40 anos depois da primeira visita do papa João Paulo II a Fátima - é presidida por D. Edgar Peña Parra, substituto da Secretaria de Estado do Vaticano. Na homilia desta noite, também levou o tema da guerra para o altar do mundo: "em cima da mesa do nosso mundo, no banquete da humanidade, falta o vinho da fraternidade e da paz, enquanto os egoísmos e os rancores explodem com frequência, como, neste nosso tempo, na violência atroz e bárbara [desumana] da guerra, onde não há nem vencedores, nem vencidos, mas apenas lágrimas como as da Mãe de Deus, que, como nos recordou o Papa Francisco, "são também sinal do pranto de Deus pelas vítimas da guerra que destrói não apenas a Ucrânia, (...) destrói todos os povos envolvidos na guerra" .Todos! Pois a guerra não destrói só o povo derrotado, não, destrói também o vencedor; destrói inclusive aqueles que a observam, com notícias superficiais, para ver quem é o vencedor e quem é o vencido".
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