Faro Capital Nacional da Cultura (FCNC) 2005 chega hoje ao fim. Sem a presença da ministra Isabel Pires de Lima, que optou por enviar o secretário de Estado Mário Vieira de Carvalho à inauguração da última exposição, e sob um mar de críticas quanto à falta de tempo para preparar um projecto ambicioso e à constante e penosa indefinição financeira que caracterizou o mesmo. .No dia de encerramento do evento, falta ainda receber uma parte das verbas resultantes da candidatura ao Programa Operacional da Cultura (POC). . O presidente da estrutura de missão, António Rosa Mendes, faz um balanço "francamente positivo" da iniciativa, dado que os objectivos propostos - "colocar o Algarve no mapa cultural do País, dinamizar a sociedade algarvia, proporcionar- -lhe uma oferta de grande qualidade e estimular o espírito criativo das populações" - foram conseguidos", mas reconhece que "toda a equipa trabalhou, nos últimos oito meses, no fio da navalha", devido ao factor orçamental, sendo obrigada, em determinadas alturas, a arranjar dinheiro através de expedientes que só por "pudor" prefere não revelar. Com efeito, "a programação inicialmente definida foi cumprida na sua quase totalidade (ficou por fazer muito pouco) e a FCNC encerra "sem um cêntimo de dívidas", mas tal só foi possível devido a um "enorme esforço de gestão financeira e a muitos sacrifícios pessoais".. É que, recorda Rosa Mendes, logo em Janeiro, a FCNC foi alvo da primeira cativação de verbas, voltando a sofrer idêntico rombo em Setembro, com a agravante de, entre Julho e Setembro, o Ministério da Cultura ter proibido a estrutura de missão de assumir novos compromissos financeiros. Paralelamente, a candidatura ao POC implicou, na opinião de Rosa Mendes, um "esforço titânico, devido às exigências do próprio programa", tendo chegado a primeira tranche, de 50 mil euros (necessários para a realização da grande exposição de arte sacra, que esteve em risco de não se realizar), apenas há duas semanas..CRÍTICAS. Para Anabela Moutinho, a programadora da área do cinema, um balanço final da FCNC "nunca poderá obviar a turbulência do processo". "Foram meses conturbados, com muitas noites sem dormir, devido à constante indefinição fi- nanceira que contaminou toda a FCNC", referiu ao DN, sustentando que, em consequência disso, o evento "não teve o impacto mediático que devia ter, tendo sido feita a sua divulgação e promoção da forma mais precária". .Luísa Taveira, responsável pela dança e novo circo, considera que este foi um ano "muito penoso", tecendo fortes críticas ao "modelo administrativo adoptado", o qual "não serve". Muitas companhias, nomeadamente estrangeiras, foram para o Algarve sem contratos assinados e só dois meses depois é que a estrutura de missão pagou os respectivos cachets", revelou. "Isto é uma loucura", considera a programadora, sublinhando que "tudo acabou por se fazer, mas muito mais caro e não tendo o mesmo resultado". .Críticas ainda mais acutilantes partem do programador da área do teatro, Miguel Abreu, para quem a falta de tempo resultou de uma "pressão de agenda política, que acabou por transformar aquilo que supostamente devia ter sido uma Capital Nacional da Cultura num mero festival de artes performativas". E interroga-se sobre os motivos da insistência de uma CNC em 2005. É que "a programação de qualquer capital da cultura, mesmo que tenha um horizonte temporal de quatro, cinco ou seis meses, deve demorar pelo menos um ano"..Contabilizados os prós e os contras, é consensual entre os seis programadores da FCNC que a programação foi de "altíssima qualidade e o público aderiu de forma significativa". Esta adesão foi, aliás, o tónico para quem teve a missão ingrata e difícil de, em pouco mais de dois meses, programar e produzir eventos diversificados. E se alguns, como Luís Madureira, responsável pela música, lamentam não ter sido possível deixar obra física, outros congratulam-se pelo contrário. .É o caso de Anabela Moutinho, em cuja disciplina foram executados "projectos estruturantes", tendo deixado quatro filmes, ou de Pedro Ferré, da Universidade do Algarve, a grande parceira da FCNC na área da literatura e ciência, com quatro títulos publicados e um quinto na calha. As actas dos colóquios vão ser publicadas e em 2006, Os Lusíadas sairão em audiolivro, com a participação de Luís Miguel Cintra..PÚBLICOs. Unanimidade há também em torno da conquista de novos públicos. Rosa Mendes afirma que "não só conseguimos atrair novos públicos, como criar neles uma apetência para as actividades culturais". "São públicos mais receptivos, com uma exigência crítica", salienta, justificando que se trata de uma vitória da "qualidade da programação". "Provámos que a cultura de qualidade não é privilégio das elites, mas sim susceptível de atrair amplas massas da população", sustenta. Prova disso foram os espectáculos de música erudita, muitos dos quais com "lotação esgotada", frisa o programador Luís Madureira. .Opinião corroborada por vários agentes culturais algarvios, que reconhecem, como salientou Luís Vicente, director da ACTA, a Companhia Profissional de Teatro do Algarve, ser "muito bom termos um público mais exigente, porque é isso que motiva os criadores. Cabe agora às autarquias dar continuidade a todo este trabalho, passando a assumir a cultura como prioridade e não como um mero entretenimento para residentes e turistas".