O Parlamento volta esta quarta-feira a debater o enquadramento legal em torno da violência doméstica, desta vez com o foco nas crianças que são expostas a esta realidade. Iniciativa Liberal, Bloco de Esquerda e Livre avançam com projetos de lei para que a exposição de menores a situações de violência doméstica seja tipificada no Código Penal como um crime autónomo..Patrícia Gilvaz, deputada da IL, fala numa "clarificação, um reforço da proteção dos menores" num contexto em que a exposição de crianças ou jovens a situações de agressão ou maus tratos a um terceiro (em regra um dos progenitores, com maior incidência a mãe) tem vindo a ser entendida como "uma mera agravação do crime" de violência doméstica propriamente dito. Nesse sentido, o que se pretende é que a exposição de menor seja "expressamente autonomizado, de forma a que não haja interpretações diferentes e não fique à disponibilidade do juiz decidir", refere Patrícia Gilvaz, sublinhando os efeitos "psicológicos devastadores" da exposição de um menor a situações de violência doméstica. O que acontece, especifica o projeto de lei apresentado pela IL - citando o Relatório Anual de Monitorização de Violência Doméstica referente ao ano de 2020 - em cerca de 31,7% dos casos de violência doméstica registados. Em favor da proposta, a deputada aponta também um parecer do Conselho Superior do Ministério Público que, na legislatura anterior, se mostrou favorável à autonomização desta figura legal..Para a IL, que apresentou a proposta inicial sobre este tema, quem expuser um menor a situação de violência pode ser punido com pena de prisão de um a cinco anos, podendo também ser aplicadas as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e proibição de uso e porte de arma até um período máximo de cinco anos, assim como a "obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica e de reforço da parentalidade". Já a proposta do BE prevê uma moldura penal de dois a cinco anos a "quem expuser menor, de modo reiterado ou não, e de forma a prejudicar o seu bem-estar ou desenvolvimento saudável, a situação de violência doméstica". Uma pena que aumenta para três a seis anos caso o crime seja praticado "por quem tenha para com o menor um especial dever de guarda ou assistência". Quem for condenado pelo crime de exposição de menor a violência doméstica pode ainda ser "inibido do exercício das responsabilidades parentais, da tutela ou da curatela por um período de 1 a 10 anos" (uma medida que já está prevista no Código Penal para condenados por violência doméstica). Já o Livre quer incluir na lei a possibilidade de o agressor frequentar "programas específicos de educação parental" quando haja exposição de menores a violência..A proposta do BE admite "avanços tímidos" nesta matéria na última legislatura, mas que ainda assim não tiveram como resultado que "as crianças sejam efetivamente consideradas vítimas da exposição à violência doméstica". "O que se pretende cumprir, no estrito respeito pela Convenção de Istambul é que as crianças sejam consideradas vítimas de violência doméstica, designadamente enquanto testemunhas", refere a proposta dos bloquistas..O PS não avança para já o sentido de voto sobre estas propostas, mas na anterior legislatura os socialistas, então em conjunto com as bancadas do PSD e do PCP, chumbaram textos idênticoss então avançados pela IL e pelo BE..Além dos três projetos de lei que visam autonomizar o crime de exposição de menor a violência doméstica, o Parlamento debate esta quarta-feira (e vota na quinta) mais três propostas conexas. A IL quer que as vítimas de violência doméstica possam prescindir da (obrigatória) tentativa de conciliação que é feita nos casos de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, nos casos em que um deles tenha sido condenado por violência doméstica. Uma exigência que é "danosa e totalmente dispensável" em casos em que se esteja perante um agressor e uma vítima, já com um processo transitado em julgado, sublinha Patrícia Gilvaz, sublinhando que a decisão deve ficar ao critério da vítima..A Iniciativa Liberal apresenta ainda a debate uma outra proposta em que defende que as vítimas que sejam qualificadas como "especialmente vulneráveis" - como é o caso das vítimas de violência doméstica - tenham acesso de imediato a um "patrono". Ou seja, que possam aceder a patrocínio jurídico com celeridade, logo desde o momento em que se dirijam às autoridades para prestar depoimento. Já o PAN quer tornar obrigatória a tomada de declarações para memória futura de vítimas de violência doméstica..susete.francisco@dn.pt