Eutanásia, corrupção, teletrabalho: a agenda parlamentar de um outono quente

Fechada a segunda sessão, vários dossiês difíceis transitam para setembro. Com apenas três semanas de trabalhos antes do OE, alguns arriscam-se a ficar para o final do ano.
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Com a segunda sessão legislativa praticamente encerrada, o próximo mês de setembro marca a viragem para a segunda metade da legislatura, no que promete ser um novo ciclo - ou uma "espécie de subciclo", como já lhe chamou Marcelo Rebelo de Sousa - na política portuguesa. Num mês de eleições autárquicas e de negociações do Orçamento do Estado (OE) para 2022, muito pode mudar. Mas, em termos parlamentares, há vários dossiês que seguem para setembro e terão continuidade nos meses seguintes.

Alguns dos temas pendentes arriscam-se, aliás, a passar para o final do ano ou mesmo para 2022, face à agenda apertada da Assembleia da República até à entrada do Orçamento do Estado, logo a 10 de outubro. As sessões plenárias serão retomadas a 15 de setembro e, para dois dias depois está já marcada a eleição de quatro candidatos a juízes do Tribunal Constitucional. A votação dos novos juízes do Palácio Ratton esteve agendada para julho, mas acabou por ser adiada a pedido de PS e PSD, dado estarem então mais de duas dezenas de deputados em isolamento profilático, portanto impedidos de votar presencialmente em urna, como é obrigatório.

A eleição dos juízes do Constitucional pode ser determinante para o mais controverso diploma que está na Assembleia da República e que voltará a plenário na próxima sessão legislativa: a despenalização da morte medicamente assistida. Os cinco partidos na origem da proposta (PS, BE, PAN, PEV e Iniciativa Liberal) finalizaram as alterações ao diploma nas últimas semanas, mas o novo texto, que visa ultrapassar o chumbo do Tribunal Constitucional, acabou por não ir a votos. E não é certo que isso aconteça logo no retomar dos trabalhos parlamentares. Será "depois das férias", diz ao DN a deputada socialista Isabel Moreira, mas para já sem data mais concreta. Caso não entre na reabertura dos trabalhos, a eutanásia ficará remetida para o final do ano, dado que a entrega do Orçamento aos deputados interrompe o agendamento de outras matérias até ao final de novembro. Recorde-se que o texto inicial sobre a morte medicamente assistida foi aprovado pelos deputados no final de janeiro, mas foi depois remetido por Marcelo Rebelo de Sousa para o Tribunal Constitucional, que viria a declarar a inconstitucionalidade de alguns pontos do diploma.

Outro tema que promete animar a rentrée parlamentar, em particular nas bancadas à esquerda, é o teletrabalho. Nesta altura há dez projetos de lei na especialidade (onde as propostas são trabalhadas ponto a ponto), versando questões como o direito à desconexão ou o pagamento dos custos associados ao teletrabalho. Em paralelo haverá ainda as propostas legislativas do governo que resultam do Livro Verde para o futuro do trabalho e que implicarão alterações às leis laborais.

Um tema que promete ainda muitos meses de trabalho é o pacote de medidas contra a corrupção. São mais de duas dezenas de propostas, que baixaram já neste mês sem votação, entre as quais se contam uma mão cheia de projetos de lei sobre enriquecimento ilícito ou injustificado, um tema que é discutido há anos pelos deputados sem que daí tenha resultado alguma lei.

Outro tema que cai para a terceira sessão legislativa é a Lei de Bases do Clima, aprovada por unanimidade em janeiro deste ano, mas que ainda não terminou o processo legislativo. Tal como duas outras questões que estão já praticamente fechadas na comissão de Saúde, mas ainda não foram a votação: a gestação de substituição e a inseminação pós-morte, dois diplomas que foram aprovados pelos deputados, mas voltaram à Assembleia da República, o primeiro devido a a uma declaração de inconstitucionalidade do TC, o segundo porque não passou o crivo de Belém.

E há ainda a legalização da produção, venda e consumo de canábis, que ficou também em trabalho de especialidade e será retomada na próxima sessão.

O parlamento regressa em meados de setembro para uma primeira semana que terá três sessões plenárias. Depois disso os deputados voltam a interromper os trabalhos na semana que antecede as autárquicas, marcadas para 26 de setembro. No pós-eleições há mais duas semanas de atividade e, a partir de 10 de outubro, entra no parlamento o Orçamento do Estado.

Pelo caminho, muito pode mudar na política portuguesa. O dia seguinte às autárquicas deverá deixar mais claro quem será o candidato do PSD às próximas legislativas: Rui Rio, se o resultado for o suficiente para se manter na liderança dos sociais-democratas sem contestação de peso; ou o cenário inverso, caso as eleições se saldem por novo desaire .

Com as autárquicas a cair em plena reta final das negociações do OE, outro resultado que pode fazer interferir no xadrez político é o do PCP, que nas autárquicas de 2017 perdeu dez câmaras para os socialistas. O posicionamento dos comunistas face ao próximo OE é decisivo: pela primeira vez desde 2015, o PS parte para as negociações com o pano de fundo de um chumbo dos bloquistas. Marcelo Rebelo de Sousa já recusou cenários de crise política, declarando-se "nada preocupado" com a aprovação do Orçamento para 2022.

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