O veredicto quanto ao Brexit tem corrido de frente para trás, de trás para a frente. A data para a saída do Reino Unido da União Europeia já foi lançada duas vezes - a última no próximo dia 31 de outubro - e a falta de consenso dentro do Parlamento britânico ainda traz mais dúvidas do que certezas. Mesmo após o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, ter chegado a um consenso com a UE relativamente ao acordo escolhido para a saída. Certo é que essa incerteza está a afastar alunos das universidades portuguesas das britânicas..Até que o Brexit se confirme, o financiamento do programa de mobilidade Erasmus não deverá estar em risco, garante o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES). No entanto, há universidades que assistem à diminuição do número de estudantes portugueses candidatos ao Reino Unido como destino e também de britânicos a procurar a instituição. Como a Universidade do Porto. Se no primeiro semestre do ano passado contabilizava 23 portugueses candidatos ao Reino Unido através do programa Erasmus, neste ano são apenas 13. Já britânicos eram 45 no ano passado e, neste ano, são 17..Um cenário que a universidade admite ser fruto dos receios que o Brexit possa estar a provocar no momento de decisão dos jovens. Segundo a vice-reitora da instituição, "as notícias sobre o Brexit e os consequentes receios de não concretização da mobilidade terão influenciado, compreensivelmente, as escolhas dos estudantes", "ainda que a Universidade do Porto tenha deixado claro que a continuidade das mobilidades com início anterior ao anunciado Brexit estava assegurada". Contudo, acrescenta Maria de Lurdes Correia Fernandes, a universidade "reitera a sua disponibilidade para, caso o Brexit se concretize sem um acordo que inclua o acesso ao programa Erasmus+, manter os acordos que tem com prestigiadas universidades do Reino Unido e que permitem - como sucede com muitas universidades de países não europeus - a mobilidade académica (estudantes, docentes e técnicos)". Por isso, ainda há alunos que arriscam..É o caso de Paula Ribeiro. Primeiro sonhou com uma experiência de Erasmus em Madrid. Mas as barreiras académicas (com a dificuldade em conseguir equivalências para as unidades curriculares) puseram um travão nas aspirações e, depois, decidiu-se por um país onde pudesse melhorar significativamente o seu inglês..A estudante de 25 anos do 2.º ano de mestrado de Marketing na Faculdade de Economia da Universidade do Porto candidatou-se em janeiro deste ano, quando o Brexit era um plano para maio. Partiu, no início deste ano letivo, para a Universidade de Middlesex, em Inglaterra, onde decidiu ficar durante um semestre, apesar dos receios. "Disseram-me que, caso o Brexit acontecesse em maio, eu perderia a bolsa", recorda. Sem bolsa, não teria possibilidades de seguir viagem, mas arriscou. Até agora, "está a superar todas as expectativas" e garante que não há sombra de medo pelo que aí pode vir..Arriscar parece ainda ser uma atitude de grande parte dos estudantes frente ao Brexit. "Neste ano, houve alguma apreensão por parte dos alunos, mas em geral confiaram que as mobilidades, uma vez iniciadas, estariam garantidas até ao seu final", escreve fonte do gabinete de apoio ao aluno da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade Nova de Lisboa. Os números provam isso mesmo, ao contrário do que acontece na Universidade do Porto. Só neste semestre, há nove estudantes desta instituição a procurar o Reino Unido para estudar, o maior número desde 2015-2016, em que se registou cinco estudantes..Já relativamente ao lado britânico, acrescenta a FCSH, "tem havido alguns contactos por parte das universidades, de modo a demonstrar vontade de continuar a cooperar, mesmo num cenário de pós-Brexit", mas a faculdade garante que, para já, não pode fazer "mais do que aguardar pelos desenvolvimentos que se seguirão"..Também a OK Estudante, uma empresa dedicada à intermediação no processo de acesso a instituições de ensino superior britânicas, a partir de Portugal, garante estar longe de sentir os receios nos números. Aliás, "é visível o crescimento que está a acontecer de ano para ano, ao nível de estudantes portugueses no Reino Unido", escreve o gabinete de comunicação da empresa. Em 2017, enviaram cerca de 1057 alunos, no seguinte 1300 e neste ano 1550 - cerca de mais 500 do que há dois anos. Este destino continua a ser "muito procurado pelos alunos portugueses"..Garantias apenas até ao dia D.Numa nota enviada ao DN, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior explica que "até 31 de outubro de 2019, data atualmente prevista para a saída do Reino Unido da União Europeia (Brexit), este Estado membro da União continuará a participar no programa Erasmus+", financiado pela Comissão Europeia..Por outro lado, no caso de um "cenário de saída do Reino Unido sem acordo a 31 de outubro, a Comissão Europeia manterá as medidas adotadas em 25 de março de 2019 (Regulamento 2019/499 do PE e do Conselho)". Medidas estas que asseguram que os candidatos ao programa de mobilidade que procurem o Reino Unido como destino ou os britânicos que procurem os países incluídos no programa Erasmus "gozem das garantias e dos direitos atuais, desde que a sua mobilidade tenha tido início até 31 de outubro de 2019"..O mesmo se aplica às mobilidades em curso no momento da saída deste país da União Europeia. Desta forma, sob indicação da Agência Nacional Erasmus + Educação e Formação, as universidades não podem anular ou criar entraves a uma mobilidade aprovada ou iniciada enquanto o Reino Unido permanecer como Estado membro. Já quem inicia ou pretende iniciar o processo de mobilidade após a data de saída deste país da União Europeia não estará abrangido pelo regulamento de contingência Erasmus+..Contudo, "a Comissão [Europeia] propôs um regulamento de contingência horizontal [regulamento sobre medidas relativas à execução e ao financiamento do orçamento geral da União em 2019 tendo em conta a saída do Reino Unido da União]". A ser adotado, "abrangerá os intercâmbios para fins de aprendizagem que tenham início depois da data de saída do Reino Unido da União Europeia, embora sob certas condições e de uma forma mais restritiva"..Apenas 2%.Ainda que as universidades portuguesas estejam a sentir o efeito do Brexit nas estatísticas, a quantidade de estudantes candidatos a Erasmus entre Portugal e o Reino Unido não tem grande expressão no país. Também de acordo com o ministério, o número de estudantes portugueses com destino ao Reino Unido representa apenas 4% da totalidade dos processos de mobilidade. No ano letivo de 2018-2019, eram 336 de um universo de 9613..Ainda menor é a representação dos alunos de universidades britânicas que escolhem fazer mobilidade para Portugal: 2%. Em 2017-2018 - o último ano de que há registo nesta modalidade -, eram apenas 279 de 14 948..Por outro lado, a totalidade do número de estudantes Erasmus tem aumentado ao longo dos anos, o que demonstra "um crescente interesse pela participação no programa", lembra o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. O número de participantes nacionais sofreu um aumento de quase quatro vezes. Já o número de candidatos estrangeiros nos programas de mobilidade em Portugal aumentou cerca de seis vezes.