Esquecida a rasteira, Osama só quer treinar futebol em Espanha
De fato de treino, sorridente e com um olhar tímido, Osama aparece nas instalações do campo de futebol madrileno de Villaverde-Boetticher junto ao filho mais novo, Zaid, de sete anos. O rapaz não para de correr e sorrir, tem olhos grandes e saídos, sempre bem-disposto. Osama Abdul Mohsen e Zaid são refugiados sírios e foram notícia há um mês e meio quando tentavam atravessar a fronteira entre Sérvia e Hungria e caíram após a rasteira de uma repórter de imagem húngara. Agora pai e filho vivem em Getafe (Madrid), com outro dos quatro filhos de Osama, Mohammad, e esperam a chegada da outra metade da família: a mulher e mais dois filhos.
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Cristiano Ronaldo foi uma das primeiras pessoas que os Mohsen conheceram em Espanha porque visitaram o estádio Santiago Bernabéu e tiveram a oportunidade de cumprimentar os jogadores. "Ele disse-me que não ia esquecer jamais o meu filho Zaid, adorou-o". O rapaz é adepto do Real Madrid, como o resto da família, e fica muito feliz ao saber que Ronaldo é português, como o jornal que está a entrevistar o pai. "Yes!", diz a sorrir. Esperto, atento e brincalhão, tanto ele como o irmão já estão a treinar em equipas de futebol em Getafe.
Todos os dias Osama leva os seus filhos à escola, depois vai às aulas de espanhol e à tarde, das 17:00 às 20:00, trabalha no Centro Nacional de Formação de Treinadores de Futebol (Cenafe), responsável pela ida do refugiado para Espanha. "Todos os dias vou ao campo, estou a aprender como são os treinos porque há diferenças com o meu país", explica Osama ao DN. "Estou feliz mas ainda não temos a família toda junta, espero que eles possam chegar em breve", confessa o sírio. Esquecida a mulher que lhe passou a rasteira porque "devo olhar para o meu futuro e o dos meus filhos". O tempo acabou por dar a volta a uma situação "feia" e converteu-se numa "oportunidade" para ter um projeto de vida para ele e a família. "Fomos muito bem recebidos, todas as pessoas estão a ser muito simpáticas connosco", sublinha.
Mas admite: "O espanhol é difícil". "Quando falar melhor vou poder treinar e ajudar os treinadores árabes que venham cá", acrescenta. Osama trata das relações comerciais com o mundo árabe no Cenafe, curso de treinador de futebol. Presidido por Miguel Ángel Galán, este suporta as despesas de Osama e da família, além de lhe pagar um pequeno salário pelo seu trabalho, tudo procedente do orçamento do centro, sem qualquer ajuda ou subsídios de outras instituições.
"Quando falar espanhol Osama vai trabalhar connosco de manhã e de tarde e vai treinar uma equipa", explica ao DN o presidente do Cenafe, que, depois de conhecer a história da rasteira e saber que Osama treinava uma equipa da primeira divisão síria, "quis fazer alguma coisa pelo meu colega". Foi um ato de solidariedade e ao mesmo tempo Miguel Ángel Galán teve muita visão de futuro. "Estamos abertos ao mercado árabe e Osama pode ser uma grande ajuda", comenta.
Com Osama, Zaid e Mohammad instalados, "estamos a tentar trazer a mulher e os outros filhos o mais depressa possível. Conseguimos a autorização de residência de Osama em tempo recorde, 22 dias, e esperamos o visto dos familiares", afirma Galán. "O presidente de Cenafe espera que Osama possa estar a treinar no início do ano, "se o seu espanhol o permitir", reconhece.
Osama sabe que voltar à Síria a curto ou meio prazo vai ser difícil e sonha com continuar a carreira de treinador em Espanha. "Ou porque não em Portugal?", afirma a sorrir. "O Porto é uma grande equipa, e o Benfica, gosto muito de Portugal, tem jogadores muito bons", acrescenta.