Espanha: Depois do gato por lebre, o boi por touro
"Se o tratas com carinho e respeito, reage assim", garante Laura Duarte, 32 anos, candidata do Partido Animalista Contra o Abuso de Animais (PACMA) espanhol, num vídeo filmado durante a recente campanha eleitoral para as cortes. O animal, chamado Marius, está a centímetros da candidata, e vai comendo folhas de oliveira, enquanto Laura Duarte olha para a câmara e sorri, várias vezes, ao lado de um bicho mais alto, com 1,73 metros, e muito mais pesado (quase uma tonelada), do que ela.
Sem palavras, o vídeo poderia ter ajudado Laura a ser eleita, como a primeira deputada do PACMA. A imagem era forte. Bonita, até. Mas a retórica sobrepôs-se, irremediavelmente. Laura fala da "valentia", que exibe, e de como não há coragem nenhuma que se aplique aos "cobardes" que gostariam de tourear o animal, torturando-o e, no final, matando-o. Laura repete que Marius é um touro. E é aí que o seu argumento pega de cernelha. Marius não é um touro, é um boi castrado.
A diferença é importante. Não retira, em nada, validade aos argumentos políticos que a candidata defende (o que não quer dizer que os seus adversários não tenham, também, boas razões para defender a tourada - essa é a razão de ser, e a beleza, da política). Retira-lhe algo de muito mais importante: sem factos, as opiniões são frágeis.
Marius nunca poderia chegar a uma arena, porque lhe falta a vontade de correr atrás de cavalos e bandarilheiros. Não baixa, nunca, os chifres para ameaçar. Por isso, vários aficionados de touradas desmontaram o argumento de Laura Duarte com facilidade. "Para animalistas, sabem muito pouco sobre animais. Convido-te a acariciar um touro, não castrado. Vais ver o abraço... Isso é um boi", escreveu no Twitter Cayetano Rivera, que é toureiro, modelo da Armani e filho de Paquirri, um "mítico" da arena, como lhe chama o El Mundo.
E, mesmo sendo um boi, e não um touro, Marius tinha tudo para estar num vídeo do PACMA. Foi encontrado, em 2015, à beira da morte num curral em Villafranca del Ebro (Huelva). Estava amarrado, sem comida nem água. Foi resgatado pela Guardia Civil e o seu dono foi acusado, e acabou internado num hospital psiquiátrico.
Marius foi acolhido no Santuário Asas do Coração, uma quinta nos arredores de Madrid, criada por dois ativistas, Eduardo e Laura. E é ali que, como descreve o El Mundo, mais parece um cachorro do que um touro selvagem, caminhando atrás de quem quer que lhe ofereça um ramo de oliveira.