O Partido Democrático (PD) tem 297 deputados no Parlamento cessante; naquele que vai ser escolhido nas legislativas de 4 de março terá entre 130 e 170 lugares, segundo as sondagens. Estas revelam ainda a crescente erosão do partido de centro-esquerda junto do eleitorado desde o momento em que foram marcadas as eleições e mostram, por outro lado, a subida consistente do polo de centro-direita, encabeçado pela Força Itália de Silvio Berlusconi. Algumas das sondagens colocam o espaço político do antigo e controverso primeiro-ministro à beira da maioria absoluta..Para muitos no interior do PD, o responsável por esta situação é Matteo Renzi, que chefiou o governo entre fevereiro de 2014 e dezembro de 2016, e que dirige o partido desde 2013. Sujeito a comentários negativos nos últimos meses, aquele que foi o mais jovem primeiro-ministro na história de Itália, aos 39 anos, Renzi teve de enfrentar ontem uma barragem de críticas ao ser conhecida a lista de deputados às eleições de março. Se o líder do PD garantiu que "esta é a melhor equipa para triunfar", os críticos preferiram chamar a atenção para a exclusão de reputados parlamentares, sem qualquer justificação, a não ser de uma espécie de caça às bruxas aos adversários de Renzi no partido. Mas para este, "não é tempo de polémicas" e "a mudança e a renovação são coisas fisiológicas", ou seja, necessárias..As escolhas de Renzi, cujo processo o próprio classificou como "uma das experiências mais terríveis que tive de viver", foi considerado uma tentativa de travar a queda do PD nas sondagens, apresentando nomes centristas, tornando-o mais atrativo para eleitores que, de outro modo, poderiam optar pelo polo de Berlusconi que, além do seu Força Itália, agrega os populistas anti-imigração da Liga Norte e os Irmãos de Itália, direita nacionalista..Recorde-se que Renzi foi sempre criticado pelos setores mais à esquerda do partido e o PD assistiu a uma importante cisão, em 2016, quando Massimo D"Alema (que pertencera ao extinto Partido Comunista Italiano e fora primeiro-ministro entre 1998 e 2000) e outras figuras de esquerda a abandonarem o partido em rotura com Renzi. E em 2017, um outro grupo de personalidades sai para fundar o Livres e Iguais, liderado pelo juiz antimáfia Pietro Grasso, que tem surgido nas sondagens com 5% a 7% das intenções de voto..Perante as escolhas de Renzi, um colunista do La Repubblica (esquerda), Massimo Giannini, escrevia ontem que o "PD viveu a sua Noite das Facas Longas [referência à violenta eliminação de uma das fações do movimento nazi, as SA, levada a cabo por Hitler em 1934]" e o líder do partido "não tem nenhuma razão para estar exultante"; pelo contrário, "não se respira qualquer perfume de vitória", antes "um odor" de crise..O estado de espírito entre os afastados está bem ilustrado pelo deputado Beppe Lumia, agora afastado das listas: "Renzi teve o seu ajuste de contas"..As sondagens publicadas desde o início do mês confirmam o ambiente de "crise" referido por Giannini. O polo de Berlusconi, que pretende para o cargo de primeiro-ministro o atual presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, surge com 35% a 39% das intenções de voto, enquanto o PD se situa entre os 28% e os 25%. O Movimento 5 Estrelas (M5E), hoje dirigido por Luigi Di Maio, recolhe valores semelhantes, na casa dos 27% a 29%. O M5E já mostrou disponibilidade para formar governo com a Liga Norte, com a qual partilha alguns elementos populistas e anti-imigração, mas tradicionalmente este partido tem estado associado com Berlusconi. As intenções de voto no M5E e da Liga, que oscilam entre os 12,5% e os 14%, permitiriam a formação de um executivo, mas a natureza de ambas as formações políticas não é de molde a sugerir que esta fosse uma solução estável e duradoura..Se o PD vive um momento de encruzilhada, com dirigentes a indicarem que qualquer resultado abaixo dos 25% é um duplo desaire para o partido e para o seu dirigente, que veria reduzida a margem para negociar uma coligação (que os seus críticos dizem estar em preparação com Berlusconi), a popularidade de Renzi também está em queda. Este recolhe apenas 25% de apreciação positiva enquanto o atual primeiro-ministro e seu aliado no PD, Paolo Gentiloni, chega aos 35%..Para alguns próximos de Renzi, este passou por uma metamorfose... e para pior. "Sempre gostei muito dele como pessoa. Mas não compreendo o que lhe sucedeu", dizia na passada semana o presidente da Fiat-Chrysler, Sergio Marchionne, citado no Politico europeu. "O Renzi que eu apoiava já não aparece há algum tempo". Um cientista político, Wolfango Piccoli, explicava à mesma publicação que, aquele que pretendia destruir os vícios da política italiana, "acabou por aderir à velha maneira de fazer política" neste país.