Está por um fio o consenso entre o PSD e o governo no que toca ao estado de emergência. O PSD foi até agora o único partido que votou sempre a favor todos os decretos presidenciais, ao lado do PS. Mas agora as medidas concretas que regulamentam o novo estado de emergência, traduzidas num decreto aprovado na quarta-feira da semana passada em Conselho de Ministros, merecem discordância frontal da direção do PSD, começando pelo seu líder..O caso poderá ter contornos mais graves do que um mero arrufo político. Um estado de emergência representa um estado de exceção com forte compressão de direitos dos cidadãos - e, nesse contexto, o Presidente da República tem feito questão de sublinhar a importância de os seus decretos terem uma forte base de apoio no parlamento (ou seja: merecerem pelo menos o apoio conjugado do PS e do PSD, o que tem sempre acontecido desde o princípio)..Seria um tiro de morte na estratégia do governo se os decretos do Presidente - que dão ao governo as balizas onde se depois se encaixam medidas concretas - passassem a ser aprovados sem o PSD e, consequentemente, por margens mínimas no parlamento (como aconteceu por exemplo com o último Orçamento do Estado)..Acontece que agora o PSD discorda frontalmente da tradução concreta que o governo deu ao novo estado de emergência aprovado na quarta-feira passada no parlamento. E não ficou à espera do agravamento da situação pandémica para o dizer..Ricardo Baptista Leite, deputado e vice-presidente do partido - além de médico -, afirmou-o logo na quinta-feira, quando entrou em vigor o novo decreto governamental regulamentador do estado de emergência. O foco então foi colocado no facto de o executivo ter decidido manter as escolas abertas (decisão que, de resto, teve o apoio do Presidente da República)..Dois dias antes já Rui Rio tinha dito que o PSD era a favor do encerramento dos estabelecimentos de ensino do 7.º ano ao 12.º ano..Para Baptista Leite - cujo tom cerrado de críticas ao governo tem sido muito mais acentuado do que o de Rio - o decreto do governo representava, no seu entender, "mais um conjunto de meias medidas", particularmente no que dizia respeito à "situação nas escolas"..Segundo afirmava então, "o mínimo dos mínimos" seria o encerramento dos estabelecimentos de ensino "a partir do sétimo ano de escolaridade". "É a diferença entre conseguirmos conter esta pandemia em três, quatro semanas, ou podermos ver um arrastar de mais e mais medidas ao longo de semanas sucessivas, seis, oito semanas, o que tem consequências absolutamente devastadoras", completou o deputado, considerando que a manutenção das aulas presenciais em todos os graus de ensino é "contraproducente", na mesma altura em que "se pede à economia para travar a fundo", considerou..Baptista Leite defendia assim que era preferível encerrar os estabelecimentos de ensino até 30 de janeiro e reavaliar o impacto desta decisão, ao nível da contenção dos contágios, daqui a duas semanas..Ao mesmo tempo deixava no ar uma ameaça, recordando o quanto o PSD tem sido indispensável para sucessivas renovações do estado de emergência: "Se não fosse o PSD, se dependesse dos parceiros habituais do governo [BE, PCP e PEV], estaríamos numa situação sem estado de emergência, o que impediria todas as medidas. Isso colocaria o país numa situação de sermos lançados pelo precipício abaixo", completou..Nesta segunda-feira, face ao agravamento da situação pandémica - com o sistema hospitalar a dar sinais de rutura, como se viu no fim de semana -, o PSD voltou a manifestar profunda discordância face ao conteúdo concreto das medidas aprovadas pelo governo para o novo confinamento geral..Falando em nome da direção do PSD, o vice-presidente do partido David Justino exortou o executivo a "restringir de forma drástica o número de exceções" existentes para o confinamento decretado para mitigar a propagação da pandemia, porque "quando as exceções abundam a regra desaparece".."Quando se elencam 52 exceções, isto é dar o sinal contrário ao reforço da regra. Se sabemos que não há regra sem exceção, quando as exceções abundam, a regra desaparece", disse, numa conferência de imprensa na sede do PSD, em Lisboa..Mais uma vez os sociais-democratas sugeriram o fecho das escolas, ao apelarem ao governo que restrinja "de forma drástica o número de exceções e a rever algumas situações com maior poder estruturante, como sejam a maioria dos serviços públicos, o setor da educação e da administração central e local, cujo contributo direto para a produção nacional é mais reduzido". "O problema não está na ligeireza das medidas, está, precisamente, na imagem que se transmitiu" com um número "tão elevado de exceções", disse ainda o dirigente social-democrata. "A regra do confinamento, que era a regra que devia estar a ser seguida por todos, não está a ser seguida", significando isso que a mais recente declaração do estado de emergência "não está a ser consequente com a gravidade da situação".