Erro com os cartazes não faz Bloco recuar na eutanásia
Ponto final no assunto. Catarina Martins assumiu ontem o "erro" da divulgação dos cartazes com imagens de Cristo e a frase "Jesus também tinha dois pais" e quer votar o incidente ao esquecimento. Já fontes bloquistas notam que o episódio não terá mais repercussões e de forma alguma condicionará o partido noutros temas da chamada agenda fraturante, em particular na legalização da eutanásia.
Vamos por partes. A porta-voz do BE deu por encerrada a polémica dizendo, à margem do Congresso da CGTP, em Almada, que o intuito do partido com a campanha para celebrar a aprovação da adoção de crianças por casais do mesmo sexo visava "assinalar uma conquista muito importante" e que o cartaz foi inspirado num slogan do movimento internacional cristão pela igualdade.
E assumiu a falha, tal como a eurodeputada Marisa Matias e o fundador do Bloco Francisco Louçã tinham feito na véspera. "Não foi compreendido e, como não foi compreendido, é um erro", afirmou Catarina, apesar de notar: "Aprende-se, vive-se. As imagens passam, as conquistas pela igualdade, essas, ficam com certeza."
Questionada pelos jornalistas sobre se a imagem tinha tido o seu aval, Catarina confirmou aquilo que o DN ontem escrevera: "Tudo o que passa pelo BE passa naturalmente pela direção do BE e por mim, como é normal."
O assunto dos cartazes, como não poderia deixar de ser, foi falado na reunião de ontem da Comissão Política do BE. En passant, é certo, mas gerando um amplo consenso: a imagem foi um "equívoco" e um "tiro no pé", que em campanha eleitoral poderia ter feito mossa. Lá diz a regra que "uma vez na net, para sempre na net" e quanto a isso nada há a fazer, mas vozes bloquistas ouvidas pelo DN garantem que não a voltarão a utilizar.
Em todo o caso, garantem que o sucedido não vai beliscar as pretensões do partido quanto à legalização da morte assistida, sobre a qual já está anunciada uma proposta do BE.
Não condicionará o calendário, garantem os mesmos interlocutores - antes da aprovação do Orçamento do Estado em votação final global não haverá qualquer iniciativa, nem fragilizarão o argumentário do BE - que depressa se aproximou do manifesto (convertido em petição) "Direito a morrer com dignidade". O ex-coordenador do Bloco João Semedo, subscritor do documento que reúne 112 personalidades de diversas áreas, reconhece, no entanto, que poderá haver contaminação do debate.
"Da parte do sim julgo que não, mas da parte do não é provável que usem isso para dividir e criar algum mal-estar no movimento com aqueles que são católicos, quer para argumentar na base de que se trata de mais uma agressão aos valores do catolicismo e da Igreja Católica por gente que nem Jesus respeita. É provável que os setores mais conservadores vão por aí", nota. Contudo, deixa o aviso: "Não vão longe."
Já Laura Ferreira dos Santos, uma das fundadoras do movimento "Direito a morrer com dignidade", menoriza o caso dos cartazes e lança um apelo. Espero que os portugueses saibam distinguir as questões. "Uma coisa é uma situação de mau gosto da parte de alguns - também não podemos responsabilizar todo o Bloco pelo que foi feito - com o que verdadeiramente está em causa."
Sobre a aproximação do BE, é cautelosa, mas abre as portas a que mais forças se juntem: "É óbvio que também precisamos de apoio dos representantes dos portugueses, os deputados, para levarem esta iniciativa para a frente. Seja o Bloco seja outro qualquer. Todos os partidos que se associarem a este manifesto serão sempre bem-vindos."
No entanto, pede muita ponderação e que a discussão seja travada "sem pressas". "Que se avance, mas com prudência, com as devidas cautelas e com as audições necessárias", observa.
Petição conta com sete mil
Como se não bastassem as críticas do PSD, do CDS, da Conferência Episcopal, do cardeal-patriarca de Lisboa e até de movimentos LGBT, na internet está também a crescer a ritmo acelerado uma petição para "retirada dos cartazes blasfemos e ofensivos".
Os 6677 subscritores (à hora de fecho desta edição) dirigem-se especificamente a Catarina Martins e explicam que não aceitam "que se use a imagem do Sagrado Coração de Jesus para afrontar as suas convicções mais profundas".
Assim, pedem que o BE se retrate "publicamente pela mensagem e pelos objetivos da campanha" e socorrem-se do Código Penal para defenderem a intervenção do provedor de Justiça. Seja como for, quanto aos cartazes, o efeito será nulo - não existem.