Trinta e três anos depois chegou a altura de arrumar a mesa e deixar a cadeira vaga. A última semana foi invadida pelo sentimento de despedida, que ontem teve o seu ponto máximo. David Letterman, homem que revolucionou a comédia nos Estados Unidos e que esteve à frente do Late Show with David Letterman durante mais de três décadas, disse adeus. As luzes apagaram-se, ficou o silêncio. E todo um legado deixado pelo apresentador..[twitter:601249258562551808].Vários foram os artistas que ao longo dos últimos programas quiseram prestar homenagem a Letterman, que aos 68 anos decidiu reformar-se. A atriz e produtora Tina Fey foi uma das personalidades que fizeram questão de mostrar a sua importância no panorama televisivo. "Depois de o Dave se reformar, não ficará ninguém de quem possamos sentir medo", disse..[youtube:_5XZunwreYo].O fim da era Letterman - que será agora substituído por Stephen Colbert, se é que se pode falar em substituição - ficou marcada por momentos que não vão sair mais da história da televisão. Entrevistas especiais com individualidades como o ex-presidente Bill Clinton, os atores Julia Roberts e George Clooney ou a apresentadora Oprah Winfrey, momentos musicais como Eddie Vedder a dedicar ao apresentador o mítico tema dos Pearl Jam Better Man ou Bob Dylan a cantar Forever Young e ainda Bill Murray - o primeiro convidado de Letterman no Late Night (formato da NBC que depois deu lugar ao Late Show da CBS) - a sair de um bolo gigante foram alguns dos pontos altos deste formato..[youtube:sKk7-rcYH6Q].O apresentador junta-se, assim, a outros rostos que marcaram o panorama televisivo norte-americano e que decidiram que estava na altura de se ausentarem. Larry King e Barbara Walters foram os casos mais prementes, aos quais se juntam ainda Jay Leno, que cedeu o seu lugar a Jimmy Fallon no The Tonight Show (NBC), e Jon Stewart, que em setembro despede-se do Daily Show (Comedy Central)..Letterman não vive de saudosismos e já avisou que não pretende regressar ao local onde foi feliz durante 33 anos, referindo-se ao Ed Sullivan Theater, "a casa" do Late Show. "Acho que nunca mais voltarei a entrar neste edifício", revelou o apresentador em entrevista ao programa Sunday Morning (CBS)..Ao todo foram mais de 40 os anos que dedicou à televisão. Tudo começou no início da década de 70. Na altura, Letterman tinha 23 anos e era apresentador do serviço de meteorologia do canal de televisão local WTHR, de Indianapolis, e deu nas vistas por ter dado os parabéns a uma tempestade tropical que se converteu num furacão. Dias depois, este norte-americano, recém-formado em telecomunicações, anunciou a queda de "pedras de granizo do tamanho de presuntos enlatados"..Admirador de Johnny Carson, fã da série de televisão Beavis & Butt--Head, adepto de corridas de automóveis, David Michael Letterman nasceu a 12 de abril de 1947 em Indianapolis, nos EUA. Filho de Harry Joseph Letterman e de Dorothy Letterman, passou a infância ao lado do famoso circuito de Indianapolis, o que alimentou a sua paixão por carros. O seu espírito cómico, disse o próprio, veio com a admiração que sempre sentiu pelo pai..A paixão pela comédia fez que deixasse a sua terra natal e se mudasse para Los Angeles, na Califórnia. Começou por atuar na Comedy Store, um clube de stand up comedy, ao mesmo tempo que escrevia argumentos para séries humorísticas. Apareceu em vários sketches no programa The Tonight Show, de Johnny Carson, e a partir de 1978 tornou-se convidado regular deste apresentador. Dois anos mais tarde, David Letterman estreou nas manhãs da NBC o seu primeiro espaço em nome próprio, o David Letterman Show. Em 1982 iniciou, então, o aclamado formato Late Night with David Letterman..Os nove Emmys que recebeu desde que se estreou na TV com nome próprio são um reflexo da sua importância. Letterman despediu-se ontem, mas a sua marca, essa, não vai desaparecer juntamente com a reforma. "Nunca soube se as coisas mais estúpidas que fizemos ou as mais tradicionais iriam funcionar. Não sabia se as coisas estúpidas alienariam pessoas. Não sabia se as coisas tradicionais seriam mais apelativas. E no fim contas, quando olho para trás, claro que a resposta é - o que se quer é fazer as coisas estranhas", disse em entrevista ao The New York Times.