Atualmente, o balanço que já é possível fazer dos dois orçamentos do atual ministro das Finanças indica que Fernando Medina conseguiu ir muito além das metas orçamentais a que se propôs inicialmente e que foram aprovadas pela maioria absoluta do PS na Assembleia da República (AR)..Em 2022, tinha entre mãos um Orçamento do Estado (OE) com uma meta de défice de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB) que acabou nos 0,3%, soube-se ontem pelo Instituto Nacional de Estatística (INE)..Este ano, o ministro tinha um objetivo inicial de défice de 0,9%, mas afinal diz que está a tentar entregar um défice que será menos de metade disso ou até um excedente histórico de 0,9% do PIB, antecipou esta semana o Conselho das Finanças Públicas (CFP)..Na hipótese de entregar um défice de 0,4% este ano, a consolidação destes dois anos além das metas aprovadas no Parlamento ascende a um desvio positivo (ou folga, termo que Medina recusa usar) de 4,9 mil milhões de euros. É o equivalente a 2,1% do PIB, aproximadamente..Mas se o CFP tiver razão e este ano o governo terminar com um excedente de 0,9%, então o desvio além do orçamentado vai ser monumental: em dois anos, Medina consegue um esforço adicional nas contas públicas (mesmo com apoios por causa da crise inflacionista) na ordem dos 8,2 mil milhões de euros (sempre face às metas iniciais dos OE aprovados)..É o equivalente a 3,4% do PIB em compressão orçamental adicional, segundo cálculos do DN/Dinheiro Vivo..Medina parece estar empenhado em cumprir escrupulosamente o Pacto de Estabilidade e seguir as recomendações da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu, levando ao máximo o esforço de consolidação orçamental..Ministro das Finanças desde o final de março de 2022, foi Fernando Medina quem executou o primeiro orçamento da maioria absoluta de António Costa em 2022 e, agora, está a pouco mais de três meses de fechar o OE de 2023..Tal como os seus antecessores mais recentes (João Leão, Mário Centeno, Maria Luís Albuquerque, Vítor Gaspar), Medina quer dar o máximo para conseguir reduzir a dívida que é monumental, a terceira maior da Europa e uma das maiores do mundo desenvolvido, boa parte dela empolada pelas ajudas do passado (do tempo da troika) aos bancos, para salvar depositantes e o sistema financeiro português do colapso..O argumento, repetiu ontem o antigo autarca de Lisboa, é apenas um: é preciso ter défices muito pequenos e, preferencialmente, excedentes orçamentais anuais consecutivos para se conseguir, como referido, reduzir a dívida, que é ainda demasiado elevada..Segundo disse Medina, ontem em conferência de imprensa, "temos um objetivo central para o país que é poder vir a ter uma dívida inferior a 100% do PIB, algo que já não acontece há mais de uma década". Este ano ainda estará acima disso: 106,2% do PIB, segundo as Finanças, ontem; 104,7%, segundo o CFP, na véspera..E disse mais: "Há do lado das oposições um discurso errado e bastante pouco responsável de associar uma melhoria de um resultado orçamental à existência de uma disponibilidade ilimitada para haver reduções fiscais e dar tudo a todos e gastar o que se tem e o que não se tem como se não houvesse amanhã".."Mesmo com a melhoria dos resultados da dívida, esta continua muito elevada, pelo que temos de criar condições para que, quando o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) acabar, tenhamos recursos para assegurar que o investimento no país se mantém, para não sofrermos uma crise de investimento", avisou o ministro na conferência para comentar os novos dados do INE..Como referido, o défice orçamental público do ano passado foi ainda mais baixo do que o anunciado em março deste ano devido ao comportamento da economia, impulsionado pela inflação muito alta, que acabou por conduzir a uma nova revisão em alta da receita de IVA em 2022, revelou o INE. Com o rácio da dívida aconteceu o mesmo..De acordo com o reporte relativo ao Procedimento dos Défices Excessivos, um documento que é enviado pelo INE à Comissão Europeia (Eurostat), o ponto de partida do ministro das Finanças, Fernando Medina, para a execução orçamental deste ano foi ainda mais favorável do que se pensava..O défice final de 2022 (ainda que provisório) ficou em 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB) e não 0,4% como estimou o INE a 24 de março na primeira notificação ao Eurostat..A diferença aconteceu no valor nominal do défice de 2022, que foi efetivamente mais baixo (779 milhões de euros em vez de 944 milhões de euros estimados em março, ou seja, um défice inferior em cerca de 165 milhões de euros)..Além disto, há ainda a revisão em alta do PIB nominal, que foi bem superior ao estimado (mais 3,1 mil milhões de euros), segundo o INE..Na conferência de imprensa de ontem, Medina também aludiu a esse bónus de crescimento que ajudou a condução das suas contas públicas, revelando que o crescimento real do ano passado terá sido, afinal, 6,8% em vez de 6,7%..Segundo o INE, "a principal revisão do saldo das Administrações Públicas (AP) em 2022 ocorre na Administração Central (que melhorou em 228,1 milhões de euros) principalmente em consequência da incorporação da informação subjacente à Conta Geral do Estado, que determinou uma revisão em alta da receita de impostos (IVA)"..Segundo o INE, "em contas nacionais, registou-se um crescimento da receita (10,1%) superior ao da despesa (4,2%)".."O aumento da receita decorreu, essencialmente, da evolução positiva da receita fiscal e contributiva, refletindo a recuperação da atividade económica e do mercado de trabalho face a 2021", acrescentou..Em 2023, a probabilidade de haver novo brilharete é elevada. O saldo orçamental das AP foi de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) no segundo trimestre, depois de um excedente de 1,4% nos primeiros três meses deste ano, revelou o INE..Como dito anteriormente, governo e Ministério das Finanças resolveram manter também a meta de défice de 2023..Recorde-se que há um ano aconteceu o mesmo: Medina reiterou em setembro de 2022 que o défice do ano passado iria ser 1,9% e afinal... ficou em 0,3%, sabe-se hoje..Também segundo o INE, o governo terminou o primeiro semestre com um excedente de 1,4 mil milhões de euros (1,1% do PIB), mas no reporte enviado a Bruxelas, Medina repete que a meta do défice deste ano continua a ser de 0,4%, a mesma que está no PE desde abril (começou por ser 0,9% no Orçamento aprovado)..E isto apesar de haver sinais de que pode terminar este ano com um excedente histórico de 0,9%..O impulso extraordinário nas contas, como em 2022, está a acontecer essencialmente pela via da receita fiscal e contribuições sociais, e muito apoiado pelo empolamento de rendimentos provocado pela inflação..Segundo o CFP, dois terços do aumento do saldo orçamental (de um défice de 0,4% para o tal excedente previsto de 0,9% pelo Conselho) acontece por via de muito mais receita fiscal e contributiva.."Considerando valores para o conjunto do primeiro semestre de 2023, o saldo das AP foi positivo", fixando-se em 1,1% do PIB..O INE qualifica o feito do governo dizendo que se trata de "uma clara melhoria deste indicador face aos semestres de 2020 e 2021, marcados pelos impactos da pandemia covid"..Na receita, registou-se um avanço de 6,7% da receita corrente que "traduz aumentos em todas as componentes", exceto na chamada outra receita corrente..Assim, o encaixe com impostos sobre o rendimento e património [onde estão IRS e IRC, por exemplo] disparou uns expressivos 17,9% face ao segundo trimestre do ano passado..Os impostos sobre a produção e importação (onde está o IVA e o ISP) ganharam 3,1%. As contribuições sociais somaram mais 10,6%..O INE reitera os argumentos do governo, dizendo que "a evolução positiva da receita fiscal (8,2%) e contributiva (10,6%) evidencia o crescimento da atividade económica e o comportamento do mercado de trabalho"..No caso dos impostos sobre a produção e importação, a evolução positiva "evidencia o crescimento dos preços", confirma o instituto..jornalista do Dinheiro Vivo