Em defesa de até farsolas dizerem: "Intolerável!"

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Houve jornalistas que acharam intolerável que um primeiro-ministro lhes telefonasse, dizendo: "Eh pá, que bosta foi essa que escreveste?!" Como se dois tipos que se tratam por tu não pudessem chicotear-se com palavras. Houve cronistas que acharam intolerável que um ministro lhes prometesse um par de bofetadas. Como se citar Fialho deixasse marcas nas bochechas. Houve um ex-primeiro-ministro que achou intolerável que o primeiro-ministro, correligionário, não se suicidasse por ele (o ex) ter feito hara-kiri. Como se a osmose partidária obrigasse a lealdades estúpidas. Houve um jornal que achou intolerável que um ex-primeiro-ministro não se calasse. Como se um político, mesmo ex, perdesse, por alegadas verbas mal paradas, o verbo. Houve um ex-primeiro-ministro que achou intolerável que outro ex-primeiro-ministro fosse mandado calar por um jornal. Como se os editoriais opinando, até sobre gargarejos, não fossem tão legítimos como um ex-primeiro farsolas que só acha intolerável para passar por tolerante. E depois, acho eu, tudo isto é tolerável. É opinião, senhores! Um dia, Luiz Pacheco entrou num café escuro de Caldas da Rainha e viu Vergílio Ferreira numa mesa, às gargalhadas. Nesse tempo não havia telemóveis nem Twitter e não deu para filmar e postar aquela surpresa. Pacheco, porém, escreveu um texto sobre o intolerável que era o amargo, e afinal hipócrita, Vergílio Ferreira a rir. O intolerável seria termos perdido esse maravilhoso texto de má-fé.

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