El Chapo recebeu Sean Penn no seu esconderijo secreto
O mais perigoso narcotraficante do mundo. Uma beldade mexicana. Um produtor de cinema com um nome falso e um ator rodeado de metralhadoras no meio de uma selva desconhecida. Sean Penn poderia ganhar outro Óscar, não fosse esta ser a história verdadeira do seu encontro com Joaquín Guzmán Loera, também conhecido por El Chapo, o traficante mexicano que era procurado pelas autoridades desde julho de 2015 - após mais uma fuga cinematográfica da prisão - e que foi capturado na passada sexta-feira. No dia seguinte, a revista americana Rolling Stone publicava um longo artigo - assinado por Sean Penn - e divulgava um vídeo de dois minutos onde El Chapo respondia a uma série de perguntas encomendadas pelo ator. O governo mexicano quer ouvir Penn, mas também já assumiu que o encontro na selva terá ajudado a capturar o traficante.
"El Chapo fala: uma visita secreta com o homem mais procurado do mundo" - é este o título do artigo da Rolling Stone que dá o mote ao texto onde Sean Penn explica as circunstâncias em que aconteceu o encontro, a 2 de outubro de 2015, com o narcotraficante e os motivos que o levaram a procurá-lo.
Ator queria perceber o "outro lado"
"[O negócio de El Chapo] É um negócio de venda de drogas e não é segredo que os EUA são um dos seus melhores clientes", escreveu o ator, que queria ver o outro lado da guerra às drogas, "um lado que é demonizado pelos americanos sem que alguma vez estes tenham aprendido alguma coisa sobre isso", esclareceu.A reunião com Joaquín Guzmán Loera - ligado à Alianza de Sangre, também conhecida como Cartel de Sinaloa e considerado o criminoso mais procurado do mundo - só foi possível com a ajuda da atriz mexicana Kate del Castillo, que desde 2012 tem estado em contacto direto com El Chapo.
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Foi Kate quem comunicou a um produtor amigo de Sean Penn que este gostaria de fazer um filme sobre a sua própria vida. No artigo, o ator chama-lhe Espinosa - um nome falso - para proteger o produtor, que descreve como "a coruja que voa entre os falcões". Foi a Kate - que já interpretou uma rainha da droga numa telenovela mexicana - a quem Sean Penn pediu para que intercedesse junto do traficante para que este lhe concedesse uma entrevista.
O encontro acabaria por ser marcado no meio da selva mexicana - um lugar que o ator não conseguiu identificar. A conversa durou sete horas e incluiu um jantar em que estiveram presentes Sean Penn, El Chapo, Kate e Espinosa. Cerca de trinta homens armados rodeavam o sítio onde decorreu o encontro, mas o ator escreveu que, mais tarde, saberia que mais de uma centena, também armados, estavam escondidos na selva.
Jantaram e beberam tequila
O ator bebeu tequila com o narcotraficante durante o jantar - um buffet de tacos, enchiladas, galinha, arroz, feijão, salada e carne assada - e fez-lhe algumas perguntas - "todas aquelas de que me poderia lembrar (...) sentia-me nu sem papel e caneta", confessou no artigo. Pediu-lhe, depois, para tirar uma fotografia com ele, sem sorrir, para "efeitos de verificação", ou seja, para provar à Rolling Stone que tinha realmente estado com o homem que prometera entrevistar. A fotografia foi tirada com um telemóvel de um dos homens de El Chapo e depois enviada a Kate, que a reenviou para o ator.
Sean Penn admite que era provável que estivesse a ser seguido pelas autoridades mexicanas e por agentes da DEA - o órgão da polícia norte-americana de combate ao narcotráfico. Depois desse encontro, o sítio onde El Chapo se escondia foi descoberto, mas o traficante ainda conseguiu fugir. Por causa desse raid da polícia, a entrevista que Sean Penn queria fazer não aconteceu e foi o próprio criminoso quem enviou um vídeo com algumas respostas às perguntas do ator - feitas pelo operador de câmara - e através da atriz mexicana, Dois minutos da gravação são disponibilizados no site da Rolling Stone. Sean Penn avisa que "algumas perguntas foram reformuladas e outras nem foram colocadas".
Entretanto, o governo mexicano fez saber que quer ouvir Sean Penn sobre o encontro que este manteve com o traficante, mas , de acordo com a AFP, fonte governamental assumiu que não é claro que Sean Penn tenha cometido um crime. "Um repórter pode entrevistar um suposto narcotraficante, mas "eles não são jornalistas"", terá dito a mesma fonte. No dia em que El Chapo foi novamente capturado, a procuradora-geral mexicana Arely Gómez afirmou que o traficante também se reuniu com atrizes e produtores com a intenção de produzir um filme sobre a sua vida e que esses contactos foram importantes para a investigação.
A amizade com Hugo Chávez
Esta não é a primeira vez que Sean Penn parece assumir uma personagem de um dos seus filmes. O ator é conhecido pelo seu ativismo político. Em 2002 pagou um artigo no Washington Post que consistia numa carta ao presidente Bush, incentivando-o a desistir do ataque iminente ao Iraque, e em 2007 voltou a dirigir-lhe uma carta aberta onde condenava a guerra do Iraque e descrevia Bush e a secretária de Estado Condoleezza Rice como "pessoas vilãs e criminosas".
Em setembro de 2005, o ator viajou até Nova Orleães e ajudou as pessoas atingidas pelo furacão Katrina, recebendo acusações de ter filmado os seus atos para fins "publicitários". Em resposta, Sean Penn publicou um artigo no The Huffington Post em que dizia que o governo de Bush "não parecia inclinado a ajudar o seu povo" e descreveu parte do seu trabalho: "Ajudámos a retirar cadáveres da água e isso foi o pior momento que já vivi como ser humano." Era conhecida a sua amizade com Hugo Chávez. Quando o presidente venezuelano morreu, Sean Penn disse ter "perdido um amigo que teve a honra de conhecer".