O Diário de Notícias nasceu no Bairro Alto em 1864 e lá se mantém através da rua que tem o nome do jornal; o DN sairá em breve da Avenida da Liberdade, mas continuará também no coração de Lisboa através do atual edifício-sede que preservará o título do diário em letras góticas."O edifício manterá as principais características arquitetónicas, como a fachada virada para a Avenida da Liberdade e os painéis assinados por Almada Negreiros, entre outras", explicou Pedro Coimbra, administrador com o pelouro financeiro do Global Media, o grupo dono do DN..Os novos proprietários terão também de respeitar outras características do edifício inaugurado em 1940 e da autoria de Porfírio Pardal Monteiro, que ganharia nesse ano o Prémio Valmor. Pedro Coimbra dá como exemplo nos interiores a Sala Verde, localizada no segundo piso, desde sempre considerada a sala de honra do DN, servindo para receber visitantes ilustres como presidentes da República e onde estão expostos os retratos pintados dos primeiros diretores..Em comunicado divulgado ontem aos trabalhadores, a administração assumiu a venda do prédio e a concentração numa das Torres de Lisboa, próxima da 2.ª Circular, de todos os meios do grupo na capital, neste momento repartidos pelo edifício do DN e pelo edifício da TSF na Matinha. "Este novo espaço Global Media irá ocupar uma área superior a cinco mil metros quadrados, distribuídos por seis pisos", pode ler-se no comunicado, em que se realça ainda a concretização do "objetivo de manter as operações na cidade de Lisboa". Além do DN e da rádio TSF, as novas instalações vão assim alojar as delegações lisboetas do Jornal de Notícias e de O Jogo (jornais com sede no Porto) e ainda as redações de Notícias Magazine, Evasões, Dinheiro Vivo, Delas e Volta ao Mundo. A mudança está prevista até ao final do ano..O destino do edifício será habitação e comércio, projeto que terá de conviver com a preservação da marca Diário de Notícias. Afinal, o edifício foi o primeiro em Portugal construído de raiz para alojar um jornal. Com oito pisos (dois deles no subsolo), o prédio tinha na origem uma área útil de oito mil metros quadrados, o que se explica por a oficina gráfica nele estar então instalada..A inauguração foi a 24 de abril de 1940, com a presença do presidente da República, Óscar Carmona. Na edição do dia seguinte é mostrada a fotografia do chefe do Estado a cortar a fita, tendo ao lado Pardal Monteiro e o diretor do DN, Augusto de Castro, diplomata e escritor que por três vezes liderou o jornal..Sempre em busca do futuro.A transferência do mais antigo diário português para a Avenida da Liberdade resultou da necessidade de modernizar as instalações, de forma a adaptar o jornal a um mundo bem diferente daquele que conheceu Eduardo Coelho, o fundador do título a 29 de dezembro de 1864 na Rua dos Calafates, depois rebatizada de Diário de Notícias..Emblemáticos das ambições do jornal ao construir a nova sede são os painéis de Almada Negreiros, na galeria situada no piso 0. Um mapa--múndi pejado de alegorias relembrava que se tratava do mais influente jornal de um país que tinha ainda um império colonial. E um friso ilustra o processo de criação de um jornal até chegar ao leitor, com os tipógrafos, os jornalistas e os ardinas, essa profissão inventada entre nós pelo genial Eduardo Coelho, o mesmo que enviou Eça de Queirós ao Suez cobrir a inauguração do canal e publicou uma carta do seu amigo Victor Hugo a elogiar Portugal pela abolição da pena de morte..Ao longo de quase oito décadas (76 anos tem o DN na Avenida da Liberdade, tantos como esteve no Bairro Alto), o edifício desenhado por Pardal Monteiro tem-se imposto como parte da paisagem lisboeta. Foi visitado por figuras como D. Juan de Borbón, pai do rei Juan Carlos de Espanha e avô do atual rei Felipe VI, Juscelino Kubitschek, presidente do Brasil, Mário Soares e Ramalho Eanes, ainda o cineasta Manoel de Oliveira (que bateu à porta para agradecer suplemento dedicado ao seu centenário) ou o escritor José Saramago, antigo subdiretor que dias depois de receber o Nobel foi convidado a visitar a redação, voltando ao fim de mais de 20 anos a esta casa. E ainda em janeiro, vésperas da campanha eleitoral, foi a vez de Marcelo Rebelo de Sousa, que hoje toma posse como Presidente, visitar o edifício, cumprimentando jornalistas e gráficos, antes de ser entrevistado..Como escreveu Ferreira Fernandes, numa das revistas que comemoraram os 150 anos do DN, o edifício é "imponente e com marca apregoada na fachada. Mas o essencial, como assinalavam os murais de Almada Negreiros, estava lá dentro", leia-se na redação, a alma de qualquer jornal. E essa alma do DN continuará nas Torres de Lisboa, diz o diretor André Macedo.