Encontramos Dame Judi Dench, a dama mais amada do teatro e cinema inglês com um sorriso expansivo. A senhora acabou de receber um prémio carreira, está tranquila num hotel à beira do lago em Zurique, para dar início à primeira conversa dessa manhã com a imprensa. Judi Dench diz-nos logo que está feliz com o prémio, apenas se queixa do peso do troféu. A atriz oscarizada por A Paixão de Shakespeare (Óscar de atriz secundária que ficou lendário por apenas aparecer em breves momentos) é agora Melita Norwood, a famosa espia britânica que nos anos 1930 terá dado informação ao KGB. O filme em que participa é contado em duas linhas temporais diferentes: a juventude desta funcionária pública e o momento em que na terceira idade é detida pelos serviços secretos britânicos. Judi Dench representa esta última, sendo uma outra atriz, Sophie Cookson, que faz o seu tempo de estudante universitária e assistente dos físicos britânicos que tentam desenvolver a bomba atómica.Red Joan é o título original, em português intitula-se UmaTraição Necessária, uma adaptação livre de um romance de Jenny Rooney que, precisamente, romanceou este caso. Trevor Nunn, o realizador, quis essencialmente fazer uma história capaz de ilustrar um romance de uma jovem que por amor acabou por trair o seu país e nunca revelar essa traição aos seus filhos. Um caso que deixou a Grã-Bretanha estarrecida em pleno ano 2000. Judi Dench fala confiante sobre o filme em que tem uma participação importante: "Este negócio do cinema é terrível. Lá por ter feito bom trabalho em anos transatos não quer dizer que este filme seja bom ou que os meus próximos papéis valham alguma coisa." Surpreendentemente diz: "Uma pessoa não se pode armar..." Porquê? "Num momento está tudo bem e de repente posso estar a fazer trabalhos que não resultam e as pessoas começam a interrogar-se por que razão estive tão mal...", responde. "Um ator está sempre a correr riscos", continua a dizer quando lhe pedimos para explicar as fundações da sua graciosa modéstia. Ao fim ao cabo, a M. dos filmes de 007 e a atriz de papelões como Diário de Um Escândalo e Iris não precisava de ser tão modesta. Está-lhe no sangue, tal como o seu amor por árvores, uma das suas paixões que faz gala em promover. "Não gosto é de fazer sempre o mesmo papel. Fiz agora para o Kenneth Branagh o Artemis Fowl e nunca imaginei na minha vida ser uma duende. Nunca!", diz. Sobre Uma Traição Necessária, revela que investigou o mundo da espionagem e que chegou a visitar a sede do MI5: "Fiquei fascinada. Não tinha ideia de como todo aquele mundo funciona..." Acrescenta:"Sendo que tenho a convicção de que Uma Traição Necessária não é um filme de espionagem. Para mim, esta mulher que componho é uma pessoa igual a tantas outras. A diferença é que tem um dilema moral." Dame Dench expressa também uma admiração grande por Trevor Nunn, o realizador e encenador que adaptou esta história verídica: "Como já trabalhei muitas vezes com ele nem percebo se o que ele traz para o cinema não é a sua veia de encenador. Talvez alguém de fora possa falar melhor sobre isso. Certo é que a energia do Trevor Nunn é única.".Contra o Brexit.Durante a sua presença no Festival de Zurique, a atriz foi sempre muito explícita quanto à questão do Brexit. Judi Dench sente-se envergonhada com todo este caso: "Estou mortificada com a possibilidade de sairmos da União Europeia." Aproveita para recordar: "Sabe, fiz parte de uma enorme celebração em Londres quando começámos a fazer parte da União Europeia. Lembro-me de estar lá a celebrar com o Laurence Olivier e de todo aquele significado. É tão triste! E é nestes momentos como o do Brexit que não sou nada patriota... Amo imenso o meu país mas não desejo um isolamento." Em seguida, a conversa ruma a Hollywood e comenta-se as questões de igualdade de pagamento entre os atores e as atrizes. É um momento em que há um certo otimismo: "As coisas estão a mudar nos Estados Unidos da América, mesmo se pensarmos que tudo vai demorar. É muito bom todo este debate sobre igualdade, pena ter chegado tão tarde. Ao menos, o público percebe que havia uma injustiça. Creio que é um absurdo alguém ganhar mais só porque é homem. Em Inglaterra era um tema-tabu, as pessoas pura e simplesmente não falavam." Quando se aproxima o fim da conversa e a hora da despedida, olhamos para esta mulher de 84 anos e sentimos uma aura intemporal. Talvez sejam os seus olhos a brilhar. Ou então o cabelo curto que lhe dá uma modernidade tão bonita. Judi Dench é um tesouro do cinema britânico. Um tesouro que nos conta que depois do problema de visão que a impede de ler encontrou uma nova paixão: "Todas as quintas-feiras vou pintar e juro que é uma felicidade. São sessões de pintura em grupo e todos temos muito prazer. Podemos pintar o que nos apetece e há ali uma tranquilidade notável, quase que não é preciso conversa nenhuma... Trata-se do meu pedaço de céu.". Uma biografia.Judith Olivia "Judi" Dench nasce em North Yorkshire em 1934. Em 1971, casou-se com o ator britânico Michael Williams, com quem representou numa sitcom inglesa, A Fine Romance. Judi Dench recebeu bastantes indicações e prémios pelas suas atuações em teatro, cinema e televisão: seis BAFTA, seis Olivier Awards, dois Screen Actors Guild Awards, dois Globos de Ouro, um Óscar e um Tony. Foi feita Dame of the British Empire em 1998 pela rainha Isabel II devido aos serviços prestados às artes do espetáculo.. Um filme em crescendo.Quando o espectador entra na sala de cinema não espera que a sinopse anunciada sobre Uma Traição Necessária se transforme em 101 minutos de um suspense inesperado. A história revelada pela sinopse é simples: "Corre o ano 2000 e Joan Stanley vive tranquilamente a sua reforma numa zona residencial, mas a sua vida pacata é subitamente perturbada quando o MI5 a prende, acusando-a de fornecer informações à Rússia comunista. A sua aventura começa em 1938, quando Joan, uma estudante de Física, em Cambridge, se apaixona pelo jovem comunista Leo Galich e através dele começa a perceber o ténue equilíbrio de forças que governa o mundo. Mais tarde, durante a II Guerra Mundial, enquanto funcionária de um centro de investigação nuclear altamente secreto, Joan apercebe-se de que esse equilíbrio pode estar em risco e pende para a autodestruição do mundo. Confrontada com uma questão impossível - qual o preço a pagar pela paz? -, Joan tem de escolher entre trair o seu país e todos aqueles que ama ou salvá-los."
Encontramos Dame Judi Dench, a dama mais amada do teatro e cinema inglês com um sorriso expansivo. A senhora acabou de receber um prémio carreira, está tranquila num hotel à beira do lago em Zurique, para dar início à primeira conversa dessa manhã com a imprensa. Judi Dench diz-nos logo que está feliz com o prémio, apenas se queixa do peso do troféu. A atriz oscarizada por A Paixão de Shakespeare (Óscar de atriz secundária que ficou lendário por apenas aparecer em breves momentos) é agora Melita Norwood, a famosa espia britânica que nos anos 1930 terá dado informação ao KGB. O filme em que participa é contado em duas linhas temporais diferentes: a juventude desta funcionária pública e o momento em que na terceira idade é detida pelos serviços secretos britânicos. Judi Dench representa esta última, sendo uma outra atriz, Sophie Cookson, que faz o seu tempo de estudante universitária e assistente dos físicos britânicos que tentam desenvolver a bomba atómica.Red Joan é o título original, em português intitula-se UmaTraição Necessária, uma adaptação livre de um romance de Jenny Rooney que, precisamente, romanceou este caso. Trevor Nunn, o realizador, quis essencialmente fazer uma história capaz de ilustrar um romance de uma jovem que por amor acabou por trair o seu país e nunca revelar essa traição aos seus filhos. Um caso que deixou a Grã-Bretanha estarrecida em pleno ano 2000. Judi Dench fala confiante sobre o filme em que tem uma participação importante: "Este negócio do cinema é terrível. Lá por ter feito bom trabalho em anos transatos não quer dizer que este filme seja bom ou que os meus próximos papéis valham alguma coisa." Surpreendentemente diz: "Uma pessoa não se pode armar..." Porquê? "Num momento está tudo bem e de repente posso estar a fazer trabalhos que não resultam e as pessoas começam a interrogar-se por que razão estive tão mal...", responde. "Um ator está sempre a correr riscos", continua a dizer quando lhe pedimos para explicar as fundações da sua graciosa modéstia. Ao fim ao cabo, a M. dos filmes de 007 e a atriz de papelões como Diário de Um Escândalo e Iris não precisava de ser tão modesta. Está-lhe no sangue, tal como o seu amor por árvores, uma das suas paixões que faz gala em promover. "Não gosto é de fazer sempre o mesmo papel. Fiz agora para o Kenneth Branagh o Artemis Fowl e nunca imaginei na minha vida ser uma duende. Nunca!", diz. Sobre Uma Traição Necessária, revela que investigou o mundo da espionagem e que chegou a visitar a sede do MI5: "Fiquei fascinada. Não tinha ideia de como todo aquele mundo funciona..." Acrescenta:"Sendo que tenho a convicção de que Uma Traição Necessária não é um filme de espionagem. Para mim, esta mulher que componho é uma pessoa igual a tantas outras. A diferença é que tem um dilema moral." Dame Dench expressa também uma admiração grande por Trevor Nunn, o realizador e encenador que adaptou esta história verídica: "Como já trabalhei muitas vezes com ele nem percebo se o que ele traz para o cinema não é a sua veia de encenador. Talvez alguém de fora possa falar melhor sobre isso. Certo é que a energia do Trevor Nunn é única.".Contra o Brexit.Durante a sua presença no Festival de Zurique, a atriz foi sempre muito explícita quanto à questão do Brexit. Judi Dench sente-se envergonhada com todo este caso: "Estou mortificada com a possibilidade de sairmos da União Europeia." Aproveita para recordar: "Sabe, fiz parte de uma enorme celebração em Londres quando começámos a fazer parte da União Europeia. Lembro-me de estar lá a celebrar com o Laurence Olivier e de todo aquele significado. É tão triste! E é nestes momentos como o do Brexit que não sou nada patriota... Amo imenso o meu país mas não desejo um isolamento." Em seguida, a conversa ruma a Hollywood e comenta-se as questões de igualdade de pagamento entre os atores e as atrizes. É um momento em que há um certo otimismo: "As coisas estão a mudar nos Estados Unidos da América, mesmo se pensarmos que tudo vai demorar. É muito bom todo este debate sobre igualdade, pena ter chegado tão tarde. Ao menos, o público percebe que havia uma injustiça. Creio que é um absurdo alguém ganhar mais só porque é homem. Em Inglaterra era um tema-tabu, as pessoas pura e simplesmente não falavam." Quando se aproxima o fim da conversa e a hora da despedida, olhamos para esta mulher de 84 anos e sentimos uma aura intemporal. Talvez sejam os seus olhos a brilhar. Ou então o cabelo curto que lhe dá uma modernidade tão bonita. Judi Dench é um tesouro do cinema britânico. Um tesouro que nos conta que depois do problema de visão que a impede de ler encontrou uma nova paixão: "Todas as quintas-feiras vou pintar e juro que é uma felicidade. São sessões de pintura em grupo e todos temos muito prazer. Podemos pintar o que nos apetece e há ali uma tranquilidade notável, quase que não é preciso conversa nenhuma... Trata-se do meu pedaço de céu.". Uma biografia.Judith Olivia "Judi" Dench nasce em North Yorkshire em 1934. Em 1971, casou-se com o ator britânico Michael Williams, com quem representou numa sitcom inglesa, A Fine Romance. Judi Dench recebeu bastantes indicações e prémios pelas suas atuações em teatro, cinema e televisão: seis BAFTA, seis Olivier Awards, dois Screen Actors Guild Awards, dois Globos de Ouro, um Óscar e um Tony. Foi feita Dame of the British Empire em 1998 pela rainha Isabel II devido aos serviços prestados às artes do espetáculo.. Um filme em crescendo.Quando o espectador entra na sala de cinema não espera que a sinopse anunciada sobre Uma Traição Necessária se transforme em 101 minutos de um suspense inesperado. A história revelada pela sinopse é simples: "Corre o ano 2000 e Joan Stanley vive tranquilamente a sua reforma numa zona residencial, mas a sua vida pacata é subitamente perturbada quando o MI5 a prende, acusando-a de fornecer informações à Rússia comunista. A sua aventura começa em 1938, quando Joan, uma estudante de Física, em Cambridge, se apaixona pelo jovem comunista Leo Galich e através dele começa a perceber o ténue equilíbrio de forças que governa o mundo. Mais tarde, durante a II Guerra Mundial, enquanto funcionária de um centro de investigação nuclear altamente secreto, Joan apercebe-se de que esse equilíbrio pode estar em risco e pende para a autodestruição do mundo. Confrontada com uma questão impossível - qual o preço a pagar pela paz? -, Joan tem de escolher entre trair o seu país e todos aqueles que ama ou salvá-los."